Título: É um balcão de negócios, prostituição
Autor: Recondo, Felipe
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/09/2007, Nacional, p. A6

Parlamentar que trocou DEM pelo PR, indo da oposição para base aliada, escancara: `Nossa cultura é a troca de partido¿

Ameaçado de perder o mandato no Supremo Tribunal Federal (STF), o deputado Nelson Goetten (SC), que deixou o oposicionista DEM para aderir ao governo, pelo PR, é direto: não vê motivo para instituir a fidelidade, pois não acredita que os partidos tenham ideologia. ¿Esse mundo de partidos é um balcão de negócio, é uma prostituição¿, admite o parlamentar, em entrevista ao Estado.

Goetten, que já foi filiado ao PP, argumenta que faz parte da cultura política do Brasil o troca-troca partidário. Por isso, alega, o Judiciário não deveria punir a prática.

Ele garante que não foi para a base do governo em busca de cargos ou liberação de emendas. Os números do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) mostram, no entanto, que a infidelidade foi um ótimo negócio.

O PR recebeu, porcentualmente, o dobro do que foi pago ao seu partido antigo, o DEM, mesmo com número menor de parlamentares - o DEM contabiliza 59 deputados e o PR, 42.

Por que o sr. mudou de partido?

Hoje, com o grande número de partidos que há no Brasil, há partidos que estão decrescentes, em declínio, e você tem uma dificuldade a cada eleição. O que você faz? Você está numa sigla, analisa o resultado das urnas, vê quem se elegeu e analisa onde está sua viabilidade eleitoral. Esse acaba sendo um dos fatores pelo qual o parlamentar tem que migrar, pela falta de viabilidade eleitoral. Esse é um mal criado pelo grande número de partidos. Os partidos grandes mantêm bom espaço para os seus, a árvore é grande, tem sombra para todo mundo. Mas, com uma árvore pequena, no que vai diminuindo de tamanho, muita gente vai ficando de fora. É o meu exemplo. Eu tive de procurar uma outra legenda para viabilizar um projeto político.

O DEM estava perdendo espaço em Santa Catarina. Foi por isso que o sr. saiu?

O DEM foi diminuindo. Ele está decadente. Não por não fazer um bom trabalho, mas está decadente. Isso faz com que a gente migre. Eu tive a infelicidade já no próprio PP. O PP foi um partido que diminuiu e não tinha mais viabilidade eleitoral para mim. Eu não sou uma figura que se mantenha só pelo nome. Quem se mantém? Quem tem uma estrutura financeira, quem carrega um nome, tipo Jorge Bornhausen, Esperidião Amin, José Sarney, esses caras. Não é um problema para eles. Mas quem é um humilde trabalhador tem dificuldade.

Mas o sr. deixou a oposição para a base governista. O eleitor não entende isso como troca de lado?

Poderia até ser. O questionamento é válido. Mas o eleitor hoje vive uma realidade até diferente. O prefeito já fica preocupado porque, se você ficar na oposição, não vai conseguir nada para a prefeitura. Mas isso é uma bobagem. Como não há mais essa questão de fidelidade partidária, essa ideologia partidária - perdeu-se muito o discurso -, então, hoje, o prefeito com dificuldade financeira quer até prostituir o deputado dele. Se pudesse dizer, o prefeito diria: ¿Vai para o governo.¿ Mas não foi esse o meu caso. O PR é um novo partido, é um novo desafio. Hoje é tudo muito explícito, não tem como o governo beneficiar esse ou aquele parlamentar, porque basta ir ao Siafi e ver quem está recebendo. O próprio DEM, que é da oposição, recebeu os mesmos valores que os partidos do governo receberam. Hoje é tudo controlado. Não pedi e não estou lutando por nenhum cargo. Eu fui porque é um novo projeto. Se tem alguém que faz isso (mudar de partido para ter cargo), não há nenhum pecado. Faz parte do jogo político.

O sr. acha que não há mesmo nenhum partido com marca ideológica?

Tá confuso. Qual é a ideologia hoje dos partidos? Eu não estou vendo. Salvo o PT, que é mais disciplinado, mas também engoliu o discurso. O PMDB, o que é que fez nesta semana? Negociando (cargo) no aperto. Eu não vejo ideologia nenhuma aí. Quem era inimigo ontem é amigo hoje, essa confusão. Esse mundo de partidos é um balcão de negócio, é uma prostituição.

Se o STF disser que o sr. não tem mais mandato, a quem vai apelar?

Eu não tenho dúvida alguma e em nenhum momento perdi dez minutos de sono. Eu tenho um mandato legítimo dado pelo meu eleitor. Ele vota no Nelson Goetten, sempre votou. Eu, desde que aprendi a votar, voto no João, no Pedro, no Paulo. Eu nunca votei em partido. Eu sempre soube que o eleitor vota no seu fulano, seu sicrano. Eu carrego os votos do meu povo, não carrego votos de partido. A nossa cultura é votar na pessoa, nossa cultura é a troca de partido.