Título: Simples Nacional multiplica empresas
Autor: Fernandes, Adriana
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/09/2007, Economia, p. B21
Companhias usam laranjas para se dividirem e pagarem menos impostos
O Simples Nacional - ou Super-Simples - está provocando o 'milagre' da multiplicação das empresas no País. Muitos empresários estão abrindo novas empresas para encaixarem seus negócios no novo regime de tributação simplificada, que permite o pagamento dos impostos federais, estaduais e municipais com redução da carga tributária e de forma mais simplificada.
O fenômeno já era conhecido no antigo Simples Federal, mas a prática ganhou ainda mais espaço com a entrada em vigor, em julho passado, do Super-Simples, que alcança as empresas com receita bruta de até R$ 2,4 milhões por ano.
A legislação proíbe que as empresas resultantes de cisão (desmembramento e divisão) ocorrida nos últimos cinco anos ingressem no Simples Nacional. A restrição foi incluída na lei para evitar que as empresas com faturamento acima de R$ 2,4 milhões se subdividem para se 'encaixarem' nos limites de receita bruta e, com isso, pagarem menos impostos. Mas é comum o empresário abrir uma segunda empresa em nome de um laranja, geralmente um parente próximo, fazendo um contrato de gaveta.
A Receita Federal afirma que está atenta ao problema e que tem condições de descobrir a fraude com o uso de laranjas por meio de cruzamentos de dados. 'Essa prática não é novidade. A Receita já descobria essas situações e autuava, e continuará atenta', avisa o secretário-adjunto da Receita, Carlos Alberto Barreto.
Segundo Barreto, se na operação de divisão da companhia o empresário vende uma das unidades para uma terceira pessoa, não há problemas. 'Mas, se o empresário coloca um laranja e faz um contrato de gaveta, esse negócio não tem propósito real, negocial. A finalidade é simplesmente burlar o fisco. Nesse caso, se for detectada a fraude, a empresa será autuada', adverte o secretário-adjunto. A multa prevista para esses casos é de 150% do imposto devido. Além disso, o fraudador terá de responder pelo crime de sonegação na Justiça. Barreto lembra que uma grande rede de pizzarias foi autuada pela Receita Federal por ter dividido a empresa em várias outras em nome de laranjas. O mesmo aconteceu também com uma fábrica de sapatos, lembra.
Para o secretário-executivo substituto do Comitê Gestor do Simples Nacional, Paulo Alexandre Ribeiro, a fiscalização no novo sistema tende a aumentar para a identificação das fraudes. Isso porque, no antigo Simples Federal, somente a Receita Federal tinha competência para efetuar a fiscalização das micro e pequenas empresas.
Já no Super-Simples, a competência, além da Receita, também passou a ser das secretarias de Fazenda dos Estados e municípios. 'Na hipótese, de uma empresa efetuar um desmembramento visando à opção pelo Simples Nacional, a chance de ela ser apanhada numa fiscalização aumenta consideravelmente. E, se isso acontecer, ela será excluída do regime de forma retroativa', diz Ribeiro.
CRÉDITO DE ICMS
O gerente da Unidade de Políticas Públicas do Sebrae, Bruno Quick, acredita que a falta da transferência do crédito do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no Super-Simples deve estar levando muitos empresários do setor industrial a abrirem uma outra empresa com declaração do Imposto de Renda pelo lucro presumido.
Essa prática é feita, segundo ele, porque muitas empresas fornecedoras não podem transferir o crédito do ICMS para os seus grandes clientes, que estão fora do Super-Simples. Como conseqüência, esses clientes estão cobrando um deságio (redução do preço) pela falta do crédito ou exigindo que elas saiam do Simples.
Segundo Quick, para resolver o problema, o empresário abre uma segunda empresa pelo lucro presumido para poder repassar o crédito do ICMS. 'O empresário fica entre a cruz e caldeirinha', diz ele. Ele ressalta que, apesar de a operação ser legal, a situação é grave justamente por essa exigência, em alguns casos, de que as empresas saiam do Simples.
Responsável pela implementação do antigo Simples Federal, o ex-secretário da Receita Federal, Everardo Maciel, classifica o fenômeno de multiplicação de empresas como 'nanismo tributário'. 'O empresário quer ser anão. Não quer crescer', diz. Para Maciel, essa prática fraudulenta é de natureza equivalente à omissão de receitas.
Segundo Maciel, que é hoje consultor tributário, a parte do texto da Lei Complementar 123 - que criou o Simples Nacional - que trata das restrições às divisões de empresas não é boa, porque tem algumas 'desinformações'.