Título: O crédito de carbono
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Fonte: O Estado de São Paulo, 04/10/2007, Notas & Informações, p. A3

A Prefeitura de São Paulo conseguiu bom resultado no primeiro leilão público de créditos de carbono no mercado à vista ocorrido no mundo, organizado por uma bolsa de commodities e realizado nos termos do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, estabelecido no Protocolo de Kyoto. Por meio desse instrumento, países desenvolvidos, signatários do protocolo, que se comprometeram a reduzir determinada porcentagem das suas emissões de dióxido de carbono e outros gases que provocam o efeito estufa, podem, em vez disso, comprar créditos de carbono gerados por países que tenham abatido suas emissões domésticas.

Através da Bolsa de Mercadorias e Futuros, a Prefeitura colocou à venda 808.450 Reduções Certificadas de Emissões (RCEs), que correspondem a 1,6 milhão de toneladas de gás metano, produzidas pelo Aterro Sanitário Bandeirantes, em Perus, que deixaram de ser lançadas na atmosfera. O banco holandês Fortis Bank NV/SA pagou 16,20 a tonelada de carbono equivalente, com ágio de 27,5% sobre o preço inicial fixado pela Prefeitura. Os créditos podem ser usados pelo banco ou para cumprir metas de redução de emissão de gases de efeito estufa ou para venda no mercado internacional, onde o preço dos certificados já ultrapassa os 20,00.

Os R$ 34 milhões arrecadados pela Prefeitura serão aplicados em oito projetos de melhorias urbanas e ambientais no entorno do Aterro Bandeirantes. Entre eles estão a instalação de três parques lineares, ciclovias, viveiro, hospital veterinário, novas praças, programas de coleta seletiva de lixo e educação ambiental. Conforme as autoridades municipais, essa será a compensação para a comunidade que, entre 1979 e 2006, suportou os transtornos da poluição provocada pelo depósito de lixo.

O orçamento estimado para o conjunto de obras é de R$ 48,1 milhões, dos quais R$ 34 milhões já foram garantidos nesse primeiro leilão. O restante deverá vir de novas ofertas de créditos de carbono que a Prefeitura pretende realizar até o ano que vem. O aterro já produziu, no primeiro semestre deste ano, 300 toneladas de dióxido de carbono, que estão em fase de certificação pela ONU, e poderão ser leiloadas até dezembro.

O material orgânico presente no lixo se decompõe lentamente, formando biogás rico em metano, um dos mais nocivos ao meio ambiente por contribuir intensamente para a formação do efeito estufa. No Aterro Bandeirantes, foi instalada, no ano passado, a Usina Termoelétrica Bandeirantes, uma parceria entre a Prefeitura e a Biogás Energia Ambiental. (É o segundo maior projeto em volume de carbono do País, atrás apenas de um empreendimento da Rhodia.) Lá, 80% do biogás é usado como combustível para gerar 22 megawatts, energia elétrica suficiente para atender às necessidades de 300 mil famílias.

O Aterro Bandeirantes atingiu a sua capacidade máxima em março. Desde então, parte das 15 mil toneladas diárias de lixo produzidas na capital passou a ser depositada num aterro particular, em Caieiras, e o restante, no Aterro São João, no bairro de São Mateus, onde também se iniciou, em junho, operação de queima de metano similar à do Bandeirantes. As usinas termoelétricas instaladas nos dois depósitos sanitários permitirão que São Paulo reduza em 20% a emissão de carbono equivalente na atmosfera. A Prefeitura espera que, em 2008, 10% da energia elétrica consumida nas casas paulistanas seja suprida pela energia gerada a partir do lixo urbano.

Até 2012, o Bandeirantes produzirá 8 milhões de toneladas de carbono e o Aterro São João, 6 milhões de toneladas. Os créditos de carbono são divididos igualmente entre a Prefeitura e a Biogás. Ao realizar leilões no mercado internacional, São Paulo dá o exemplo a outras cidades brasileiras de como transformar os aterros, de fontes de poluição e de encargos onerosos para as finanças municipais, em fontes de receitas, inofensivas ao meio ambiente. A capital dá exemplo também às empresas privadas controladoras de pequenas centrais elétricas e de projetos de biomassa, que poderiam se enquadrar nesse sistema, fortalecendo a presença do Brasil no mercado de créditos de carbono.