Título: Barão do Rio Branco definiu os limites do Brasil
Autor: Dias, Cristiano
Fonte: O Estado de São Paulo, 07/10/2007, Internacional, p. A18

Sem disparar um único tiro, ele negociou as fronteiras do País com todos os seus vizinhos.

O Brasil resolveu suas questões de fronteira ainda no início do século 20 em razão da atuação do Barão do Rio Branco, representante brasileiro em arbitragens internacionais e ministro das Relações Exteriores de 1902 a 1912. 'Em duas décadas, ele assegurou ao Brasil um território de 900 mil quilômetros quadrados e fixou os limites definitivos do País com todos os seus vizinhos. E sem disparar um único tiro', disse ao Estado o embaixador Rubens Ricupero, autor da biografia Rio Branco: o Brasil no Mundo.

Embora tenha se formado em Direito, a paixão do carioca José Maria da Silva Paranhos Júnior era a História. O pai, apesar do título de Visconde do Rio Branco e dos cargos que ocupou durante o 2º Reinado, não era latifundiário e não nadava em dinheiro, como a maioria dos políticos do Império. Como todo funcionário público, a renda era limitada. O filho, porém, era um sujeito de sorte. Aos 21 anos, faturou 12 contos de réis na loteria e usou o prêmio para viajar pela Europa. De volta ao Brasil, experimentou a carreira de deputado, elegendo-se por Mato Grosso, em 1869, sem nunca ter pisado na então província.

Na corte carioca, caiu de amores por uma atriz belga - na época, intimidade com atrizes não era exatamente o tipo de relacionamento aconselhável a um homem de bem. Logo vieram os filhos. Com eles, as privações financeiras. Paranhos decidiu então concorrer a uma vaga de cônsul em Liverpool, importante porto britânico e um dos cargos mais bem remunerados da diplomacia brasileira.

Serviu na Grã-Bretanha, mas morou em Paris. Sempre que algum conhecido lhe surpreendia nos cafés da cidade, repetia a frase: 'Cheguei ontem, mas já estou voltando para a Inglaterra.' Em 1888, a monarquia decadente fez dele barão. Nos primeiros anos da República ainda não haviam inventado o futebol, mas o então presidente Floriano Peixoto (1891-1894) convocou o Barão para defender o Brasil contra a Argentina na Questão de Palmas, disputa pela região que corresponde hoje ao oeste do Estado de Santa Catarina. Rio Branco venceu e virou herói nacional.

Depois de derrotar a França em outra questão de fronteiras, dessa vez no Amapá, em 1900, foi levado ao posto de ministro das Relações Exteriores, dois anos depois, pelo então presidente Francisco de Paula Rodrigues Alves (1902-1906). O cargo lhe foi praticamente imposto, já que se dependesse dele continuaria vivendo na Belle Époque francesa. 'Tão logo assumiu o ministério, teve de descascar um abacaxi, que foi a Questão do Acre. Mas Rio Branco era fulminante. Quanto mais complicado o problema, mais rápido ele resolvia', disse Ricupero.

O Acre entrou no mapa do Brasil depois do Tratado de Petrópolis, assinado com a Bolívia, em 1903 - que segundo Ricupero foi 'sua obra-prima'. Nos anos seguintes, o Barão selou acordos de limites com Peru, Colômbia, Venezuela, Suriname e Uruguai.

Álvaro Teixeira Soares, embaixador do Brasil em vários países latino-americanos, dos anos 50 aos 70, descreveu o legado de Rio Branco como 'a maior realização da diplomacia de qualquer país em qualquer tempo'. 'Não há nenhum caso de nação com tantos vizinhos que não tenha recorrido à guerra para resolver seus problemas de fronteira', afirmou Ricupero.

O Barão morreu como semideus em pleno carnaval de 1912. Foi um choque. O Rio de Janeiro consagrou o chanceler dando seu nome à principal avenida da cidade. A comoção fez o governo do marechal Hermes da Fonseca (1910-1914) baixar decreto adiando os festejos para o mês seguinte.

Não deu certo. Por causa do Barão, o carioca teve dois carnavais - em fevereiro e em abril. A homenagem dos foliões foi eternizada numa marchinha, sucesso daquele ano, que debochava do presidente: 'Com a morte do Barão, tivemos dois 'carnavá'; ai que bom, ai que gostoso, se morresse o 'marechá'.