Título: Terapia é desafio para a próxima geração
Autor: Amorim, Cristina
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/10/2007, Vida&, p. A16
Oliver Smithies: um dos vencedores do Prêmio Nobel de Medicina de 2007
O inglês naturalizado americano Oliver Smithies, um dos vencedores do Prêmio Nobel de Medicina deste ano, começou a desenvolver modelos científicos para aplicá-los na cura de doenças. Apesar de ter contribuído para desenvolver uma das ferramentas mais usadas hoje em dia nos laboratórios de todo o mundo, não conseguiu realizar esse objetivo: deixa o desafio para as próximas gerações. ¿Não é impossível; é apenas muito difícil¿, disse ao Estado. Criança-prodígio, construía telescópios e rádios quando pequeno e ganhou uma bolsa de estudos na Universidade de Oxford (Grã-Bretanha), onde se graduou em fisiologia em 1946. Em março, virá ao Brasil pela primeira vez, onde participa do primeiro simpósio nacional de técnicas genéticas e biotecnologia.
Essa técnica tornou-se uma das ferramentas mais básicas nos experimentos em biologia. Mas ainda não se converteu em um tratamento propriamente dito. Há ainda chance de isso acontecer?
Foi uma das primeiras coisas que tentei fazer, na verdade, com essa tecnologia. Minha idéia era tentar pegar medula óssea, por exemplo, de uma pessoa que tivesse anemia - e sabemos que há um problema no genoma dessa pessoa - e, com o genoma normal, cloná-lo e talvez introduzir esse DNA normal e corrigi-lo, possivelmente com cruzamento e recombinação homóloga. Esse era o foco, corrigir genes. Mas acontece que a freqüência com que isso acontecia era tão baixa, de 1 em 700 mil tentativas a 1 em 1 milhão de tentativas, que não era útil para aquele propósito.
Então realmente não é possível usar a ferramenta como terapia?
Acho que isso ainda vai acontecer. A próxima geração de cientistas fará isso, não eu. Minha esperança é que ainda seja possível. Não é impossível; é apenas muito difícil. Enquanto isso, é muito útil para modificar genes em modelos animais, que são bastante utilizados e produtivos. É dessa forma que tem validade terapêutica hoje em dia. Um dos meus alunos de pós-doutorado ainda persegue esse sonho e talvez consiga realizá-lo um dia.
O senhor chegou a imaginar que uma ferramenta seria premiada com o Nobel?
Todos nós, cientistas, pensamos nisso e nós três recebemos grandes outros prêmios, então sabíamos que as pessoas reconheciam nosso trabalho. Sabíamos que tínhamos sido cogitados outras vezes, mas, por alguma razão, o comitê do Nobel não nos escolheu antes. Não era totalmente certo, mas havia sempre a possibilidade.
Durante o processo de formação da técnica de nocaute de genes, houve muita competição entre os laboratórios?
Nós não competimos entre nós de forma nenhuma; na verdade, houve alguma cooperação. No meu laboratório, as pessoas nunca sentiram que participavam de uma corrida. Fomos bem-sucedidos, mostramos que era possível, então cada vez mais pessoas começaram a utilizá-lo. Esse é o desenvolvimento natural da ciência.