Título: Instituto no Rio tem cemitério de próteses de baixa qualidade
Autor: Sant¿Anna, Emilio
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/10/2007, Vida&, p. A18
Referência na área de traumatologia, Into fez 31% mais substituições de implantes em 2006
Em 2005, o Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia (Into), no Rio, realizou 71 cirurgias para substituir próteses ortopédicas danificadas. No ano passado, as reintervenções subiram para 93. Em grande parte, os números são um reflexo da falta de qualidade do material ortopédico implantado nos brasileiros.
Na semana passada, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Polícia Federal desarticularam uma quadrilha de falsificadores de próteses fabricadas sem higiene e segurança. Batizada de operação Metalose - reação de rejeição do corpo humano ao metal -, a operação resultou na prisão de cinco pessoas, quatro em São Paulo e uma em Pernambuco.
O delegado responsável pelas investigações, José Navas Jr, não descarta a possibilidade de as próteses terem sido feitas com material inadequado, como sucata de ferro. O resultado: infecções e amputação de membros. (leia ao lado)
De acordo com Francisco Matheus, diretor do Into, não é possível saber quantos desses casos foram parar no instituto, que tem um ¿acervo¿ de próteses de de baixa qualidade retiradas dos pacientes. ¿O Into é um hospital de alta complexidade, tudo o que não se resolve fora acaba aqui¿, diz.
No cemitério de próteses, implantes de fêmures, vértebras e quadris testemunham a qualidade de materiais que nunca deveriam ter sido usados. ¿São próteses de má qualidade, mas o importante é que o Ministério da Saúde está atento a essa situação¿, diz.
A aposentada Nelina Francisco de Castro, de 63 anos, demorou 15 anos para resolver seu problema. Em 1987, passou por uma cirurgia de implante de prótese de quadril por conta de uma de osteoporose.
Não deu certo. Em 1989, uma nova cirurgia e o mesmo resultado: outra prótese rachada. Depois das duas intervenções, Nelina não podia mais andar. ¿Não consegui fazer mais nada¿, lembra. ¿Eu só andava se fosse de carro.¿
A agonia da aposentada não parou por aí. Somente em 2002 submeteu-se a um novo implante. Dessa vez, teve de fazer um enxerto na bacia, pois a prótese danificada também corroeu seus ossos. Até o próximo ano, ela ainda deve ser acompanhada pelos ortopedistas para evitar outros problemas.
Para o diretor do instituto, os ortopedistas devem ficar atentos na hora de fazer o implante e certificar-se da procedência da peça. ¿É difícil perceber a olho nu a qualidade da prótese¿, diz. ¿Muitas vezes, só se percebe depois que o estrago foi feito.¿
Desde 2004, a Anvisa recebeu 34 notificações por problemas decorrentes do uso de próteses, 11 neste ano.
ESTRAGO
As conseqüências a que Matheus se refere podem ser basicamente três: a metalose, o desgaste precoce e a quebra do implante. A metalose, que deu nome a operação da PF, talvez seja a pior delas.
Em contato com fluidos corporais, o metal de baixa qualidade do implante passa a liberar uma substância negra e pastosa. ¿Uma espécie de graxa¿, explica o coordenador hospitalar do Into, Eduardo Rinaldi Regado. Essa substância pode penetrar na circulação sanguínea e casuar sérias infecções. Em caos extremos, pode levar a amputação do membro e a morte do paciente.
Além das dores e do incômodo que a condição pode causar, os pacientes ainda enfrentam outro problema. ¿Quando se faz a retirada de uma prótese, sempre existe alguma perda óssea¿, diz Regado.
No Into, um banco de ossos tenta suprir a instituição de tecidos para os implantes. As doações, no entanto, são ainda muito baixas por conta da desinformação e recusa familiar.
Ainda neste ano, o hospital, em parceria com o Ministério da Saúde, prepara-se para lançar uma campanha de incentivo às doações.