Título: Professores Pardais improvisam inventos
Autor: Nunomura, Eduardo; Menocchi, Simone
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/10/2007, Vida&, p. A15

De um tomógrafo a um lustre, tudo serve para inovar.

A efervescência científica tem ajudado na criação de outros institutos de pesquisa e empresas de base tecnológica. Conseqüência natural da demanda que surge com o crescente número de pesquisadores formados nas universidades do interior. Um bom exemplo é a Embrapa Instrumentação, de São Carlos. Além de Sérgio Mascarenhas, outros físicos, como Paulo Cruvinel, Paulo Henrique Valim e Silvio Crestana, atual presidente da Embrapa nacional, se juntaram em 1982 para desenvolver pesquisas para o setor agropecuário. Sem laboratórios, os primeiros estudos ocorreram na própria USP.

A Embrapa Instrumentação já produziu 75 patentes, marcas e softwares, um terço do que foi feito pelo órgão nacional, que possui outras 35 unidades em todo o País. Dos seus 25 pesquisadores, 24 têm doutorado e 1 está no doutoramento. De seus 200 estagiários, os universitários são maioria. Hoje, são 55 projetos em andamento, que contam com R$ 6 milhões de verbas da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).

Um projeto interessante é o desenvolvido pelo pesquisador Luiz Alberto Colnago, que criou um método de análise em escala de oleaginosas como soja, algodão, girassol e dendê. O Brasil vive a febre do biodiesel, mas faltam estudos que digam quais as melhores cultivares para sua produção. O País só vai alcançar os esperados 100 bilhões de litros de biodiesel, em 2035, se conseguir responder à questão. Colnago acredita que seu aparelho, montado a partir de um espectômetro e um tomógrafo, vai ajudar. O princípio é simples: uma esteira giratória que passa pelos dois equipamentos detecta e separa as melhores dentro das milhões de sementes analisadas.

Washington Luiz de Barros Mello, há 8 anos na Embrapa Instrumentação, é outro pesquisador da linha ¿professor Pardal¿. Um dia viu um globo de vidro sendo retirado de um poste. Imaginou a peça não como sucata, mas uma redoma que, se embrulhada em papel-alumínio, seria capaz de simular o sol. Foi algumas vezes à oficina para concluir a construção de seu aparelho fototérmico. Com ele, criou um método para livrar as frutas de fungos e, ao mesmo tempo, um analisador de líquidos. Futuramente, acredita Mello, este será o princípio da análise do biodiesel, que ele já testa com sucesso em laboratório. ¿Se houver recursos, no próximo semestre já podemos entregar um produto¿, garante.

Óbvio que há um abismo entre o desejo e a realidade no mundo científico. Tecnologia inovadora e premiada, a língua eletrônica, sensor ultrafino para análise de bebidas, foi patenteada em 2001 a partir de uma pesquisa que envolveu Embrapa, USP e Unesp. Até hoje está na fase de testes com uma empresa, a BR Sensor, desenvolvendo um aparelho para uso comercial.

A maturação de uma invenção é demorada, mas rende frutos duradouros, como a espécie de gado Canchim. Criada pela Embrapa Pecuária Sudeste, a raça mestiça é hoje uma das mais adaptadas às condições brasileiras e rentáveis para quem as cria. As pesquisas começaram na década de 1940, com o pesquisador Antônio Teixeira Vianna. O sucesso de seu trabalho ajudou a consolidar o interior paulista como celeiro de novas tecnologias nos campos veterinário e agropecuário.