Título: CPMF não passa incólume
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Fonte: O Estado de São Paulo, 18/10/2007, Notas & Informações, p. A3

Se o Senado aprovar a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), não será do jeito que o governo quer. A pressão feita, nesta quarta-feira, pela tropa de choque do governo liderada pelo presidente em exercício, José Alencar, sobre os senadores, em seguida às declarações do presidente Lula - que se encontra na África -, de que exige lealdade de sua base de apoio, mostra que o Palácio do Planalto tem consciência dos riscos que está correndo. Para superar as resistências, o governo terá de ceder em algum ponto.

Pesquisas feitas nos últimos dias mostraram que não se repetirá no Senado o que ocorreu na Câmara, que manteve a essência da proposta original do governo, ou seja, a prorrogação da vigência da CPMF até 2011, com alíquota de 0,38%. A Folha de S.Paulo ouviu 71 dos 81 senadores e constatou que 44 votarão contra a proposta da forma como foi aprovada na Câmara. Desses 44, 24 disseram que podem mudar de opinião caso o governo aceite mudar o texto. O Correio Braziliense ouviu 29 senadores dispostos a votar a favor do texto proposto pelo governo e localizou outros 28 que podem votar a favor desde que o governo apresente alguma contrapartida.

A intenção do governo, avalizada pela Câmara, era manter inalteradas as regras atuais até o fim do mandato de Lula. Ou seja, até 2011, o contribuinte brasileiro continuaria a abastecer os cofres da União com um tributo arrecadado automaticamente, sem nenhuma dificuldade para a Receita, mas que produz uma receita enorme. Neste ano, por exemplo, a receita da CPMF deverá alcançar R$ 40 bilhões. Mudanças que justifiquem o Provisória da denominação só seriam negociadas para vigorar depois de terminada a gestão petista.

A resistência dos senadores ao rolo compressor do governo deverá resultar em benefícios para os contribuintes que até há pouco pareciam impossíveis. A bancada da oposição já vinha alinhando as mudanças que considera essenciais para aceitar a prorrogação da CPMF. Uma delas é a redução do imposto até uma alíquota mínima que o mantenha apenas como instrumento de combate à sonegação. A redução de outros impostos, para compensar a preservação da CPMF, também está na lista da oposição. Ela quer, ainda, criar um redutor para os gastos do governo.

Enquanto não puder ser extinta, como seria desejável, a CPMF precisa mudar. É, reconhecidamente, um tributo ruim, pois, embora tenha alíquota baixa, onera excessivamente o setor produtivo por incidir em cascata em diversas fases da produção. O presidente em exercício, José Alencar, que tentou convencer as lideranças das bancadas no Senado a votar a favor da prorrogação, admitiu isso: ¿Nós todos somos contra, mas não podemos cortá-la agora.¿

Para não sofrer corte imediato na arrecadação da CPMF, risco que ficou evidente com a resistência dos senadores, o governo agora admite aliviar o impacto desse tributo sobre a vida dos contribuintes e a atividade econômica. ¿Está aberta uma negociação que até então não estava tão explícita¿, admitiu o ministro das Relações Institucionais, Walfrido dos Mares Guia, depois do encontro do presidente em exercício com os líderes no Senado.

Na verdade, o que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, admite é negociar o corte de outros impostos, em troca da aprovação integral do projeto da CPMF, o que é inaceitável para a oposição. Já o ministro Mares Guia afirma que o governo aceita discutir a redução gradual da alíquota já a partir do próximo ano, dependendo da atividade econômica. A isenção da CPMF para quem ganha até R$ 1,2 mil por mês também poderá ser negociada. Trata-se de medida de pequeno efeito sobre o total arrecadado (uma quebra de 2,5%, segundo Mares Guia), mas de grande impacto político.

Mesmo assim, a relatora do projeto na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Kátia Abreu (DEM-TO), diz que não abrirá mão do prazo de 30 dias de que dispõe para preparar o relatório. Isso dificultará a aprovação da prorrogação até o dia 20 de dezembro, data-limite para que não haja interrupção na cobrança da CPMF. Se não quiser perder parte da arrecadação de 2008, o governo talvez tenha de fazer mais concessões. Melhor para o contribuinte.