Título: Especialistas levantam dúvidas
Autor: Nossa, Leonencio
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/10/2007, Nacional, p. A14

Acordo com China falhou, lembra professor da USP

Um acordo de livre comércio entre três economias emergentes, a princípio, parece garantia de bons negócios com parceiros que se completam, mas, para especialistas, sua viabilidade e eficiência não estão claras.

O professor do Departamento de Economia da FEA/USP Simão Davi Silber não crê que um acordo de livre-comércio entre Brasil, Índia e África do Sul passe do campo da retórica e se converta em algo benéfico para os três países.

Ele lembra que, desde o começo do primeiro governo Lula, a vontade de intensificar as redes de comércio com países do sul faz parte do discurso da diplomacia brasileira, mas até hoje não se avançou muito. ¿Não deu em nada com a China, não creio que vá para a frente. É papo para animar a torcida.¿

Por se tratar de três economias em desenvolvimento, na avaliação do professor, nenhuma delas poderia entrar em negociações para perder. Ele não encontra grandes vantagens para os países, e vê em acordos bilaterais oportunidades mais promissoras. ¿A África do Sul tem bons acordos com a União Européia, e a Índia é concorrente direta do Brasil no mercado internacional em setores como o têxtil, siderúrgico e químico¿, analisa.

O diretor do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Estratégicas (Icone), André Nassar, acha que o fiel da balança seria o espaço dado aos produtos agrícolas brasileiros. Para ele, é difícil que se faça um acordo amplo, pois os três países mantêm sempre posições defensivas, mas o Brasil encontraria boas oportunidades nessa área e em setores como o automobilístico e o da construção civil. ¿Nova Délhi está sendo reconstruída, os ônibus lá têm mais de 30 anos e a classe média é gigante. Seria ótimo para o Brasil.¿

Nassar acredita que, tanto com Índia como com África do Sul, o acordo funcionaria tapando buracos das economias, que ele considera complementares. ¿A África do Sul é uma prioridade para os industriais brasileiros.¿

Já Silber garante que a entrada forte de produtos agrícolas brasileiros no mercado indiano acabaria com a agricultura do país, que não suporta as dimensões do agronegócio brasileiro. ¿Não é interessante para eles.¿ Além disso, o professor não enxerga na Índia um mercado consumidor preparado para receber os produtos de consumo de massa que a indústria do Brasil tem a oferecer. ¿Eles são zen. É outro estilo de vida, incompatível com a nossa produção¿, afirma.