Título: Não quero presidir nem a Academia de Letras
Autor: Samarco, Christiane; Fontes, Cida
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/10/2007, Nacional, p. A6

Apesar de ser indicado por Raupp como o melhor nome do PMDB, Sarney já avisou que não admite assumir mandato-tampão no Senado

Nome preferido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para comandar o Congresso e dar tranqüilidade ao governo, o senador José Sarney (PMDB-AP) já tratou de alardear que não admite sequer discutir a hipótese de assumir um mandato-tampão, em caso de renúncia do presidente licenciado, Renan Calheiros (PMDB-AL). ¿Não quero mais ser presidente de nada. Nem da Academia Brasileira de Letras (ABL)¿, afirmou ontem.

Embora o líder do PMDB, Valdir Raupp (RO), insista na tese de que Sarney é hoje o melhor nome da bancada de 20 senadores, quem o conhece sabe que o senador não é político de entrar em disputa dentro do próprio partido. Sobretudo depois do veto explícito feito pelo líder do PSDB, senador Arthur Virgílio (AM), à sua eventual candidatura, a despeito da boa relação que Sarney mantém com o presidente tucano, senador Tasso Jereissati (CE).

Candidato ou não, o peso político de Sarney ninguém discute: ele é o grande eleitor do PMDB do Senado. Além do prestígio pessoal junto ao Palácio do Planalto, Sarney lidera uma fatia expressiva da bancada. Desde o início do governo Lula, ele sempre dividiu com Renan o comando político desse grupo. Com a crise que exauriu a liderança do presidente da Casa, no entanto, Sarney acabou fortalecendo o seu cacife, que vai além dos limites do PMDB. Os seus amigos avaliam que ele exerce influência sobre uma dezena de parlamentares.

Entre os seus principais aliados no PMDB e em outros partidos da base governista, que costumam ouvi-lo ou seguem a sua orientação, estão o líder Raupp e os senadores Gilvam Borges (PMDB-AP), José Maranhão (PMDB-PB), Epitácio Cafeteira (PTB-MA), Wellington Salgado (PMDB-MG), Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR), Romeu Tuma (PTB-SP) e Francisco Dornelles (PP-RJ).

Sarney tem, ainda, ascendência sobre o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), que, como Dornelles, participou do seu governo (1985-1990). Além da filha e líder do governo no Congresso, Roseana Sarney (MA), ele ampliou o poder de influência sobre a bancada do PMDB na semana passada, ao patrocinar a filiação do senador Edison Lobão (MA), que trocou o oposicionista DEM pelo PMDB.

Um dos principais interlocutores de Sarney admite que a crise acabou desgastando o senador, pessoal e politicamente, no momento em que não conseguiu convencer o colega Renan a se afastar do cargo assim que foi absolvido pelo plenário, no julgamento de 12 de setembro. Como a situação política do PMDB ficava a cada dia mais difícil e o governo não atendia aos pleitos da bancada por cargos federais em Brasília e nos Estados, Sarney teve de se explicar diante dos companheiros.

Na última reunião da bancada do Senado com Raupp, Sarney passou pelo constrangimento de tentar convencer os colegas de que não tinha a quantidade de cargos no governo que os seus adversários lhe atribuem. ¿Não é verdade que eu tenha tantos cargos. Se quiserem, transfiro para vocês, agora, tudo o que dizem que tenho¿, desafiou.

Para boa parte dos peemedebistas, no entanto, ele se aproveita da proximidade com o presidente Lula para negociar apenas interesses pessoais ou de seu grupo, ignorando o restante da bancada.

Por fim, o interlocutor de Sarney adverte que, fora do páreo, ele não fará campanha para que nenhum senador do PMDB assuma a vaga de Renan. A fonte informa ao Estado que, de forma muito discreta, ele já teria avalizado, nos bastidores, um ¿acerto¿ entre PT e PMDB para evitar briga na base e dificuldades extras para o governo na batalha em favor da prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). O acordo passaria pela eleição de Viana para comandar o Senado, como titular. A seguir, a entrevista de Sarney sobre a crise:

O senhor admite a sua candidatura à sucessão de Renan Calheiros (PMDB-AL)?

Não quero ser presidente de nada. Não aceitei nem a presidência da Academia de Letras.

Mas o líder do seu partido e outros senadores falam que o senhor é a alternativa mais forte do PMDB para suceder a Renan.

Não há hipótese de eu aceitar isto. Já fui duas vezes presidente do Senado.

Então por que eles insistem? O senhor autorizou as manifestações em defesa de seu nome?

Essa é uma especulação sem nenhuma procedência. Tudo isso é ficção. Nesta legislatura, não aceitei ser presidente de comissão. Nem ser membro de comissão no Congresso eu quis. Só aceitei ser do conselho editorial do Senado porque ele trata de livros, não de política.

O senhor defende a tese de que o eventual sucessor de Renan tem de sair do PMDB, em respeito à regra da proporcionalidade, pela qual a maior bancada aponta o nome do presidente?

Não quero me meter em mais nada. Já estou cansado.

Como o senhor avalia o gesto de Renan de se licenciar do cargo?

A licença foi positiva. Distendeu bastante o ambiente político no Senado, que estava muito tenso com a crise.

O senhor acredita em disputa entre o PMDB e o PT pela cadeira de presidente da Casa?

De sucessão eu não trato. Não quero nem saber do assunto.