Título: Escárnio à Justiça
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/10/2007, Notas & Informações, p. A3
Há quinze dias militantes do Movimento dos Sem-Terra (MST) já haviam tentado paralisar o tráfico de trens da Estrada de Ferro Carajás, que liga a unidade de produção da Companhia Vale do Rio Doce, na região, a São Luis do Maranhão. Tendo por alegado pretexto o fato de a empresa ter sido subavaliada, há 10 anos, e ¿vendida a preço de banana¿, o objetivo era interromper a operação da ferrovia que conduz diariamente 1.300 pessoas, transporta a produção da Vale até o Porto de Itaqui, em São Luis, e traz, da capital maranhense, o combustível usado no abastecimento do Sul do Pará. Na ocasião, frustrou-se a tentativa de 30 militantes sem-terra de se sentarem nos trilhos da ferrovia para impedir a passagem dos trens. Uma decisão da Justiça Federal determinara que forças policiais protegessem os trens contra ¿atos atentatórios¿ do MST.
De que valeu aquela medida judicial? Rigorosamente, de nada. A Ferrovia de Carajás voltou a ser ocupada, na quarta-feira, por agricultores ligados ao MST, dentro de sua ¿jornada de luta pela reforma agrária¿ - nos distritos Vila dos Palmares I e II, em Parauapebas (PA). Mas o que a Vale tem que ver com a reforma agrária? Rigorosamente, nada. A não ser que, em lugar de movimento dos sem-terra, se tratasse de um movimento dos sem-mina... Mesmo assim, os militantes emessetistas, que iniciaram a invasão ao amanhecer, levaram mulheres, crianças e idosos e montaram um acampamento em cima dos trilhos, na Fazenda Palmares, garantindo que só deixariam o local quando ¿suas reivindicações¿ fossem atendidas pelo governo e pela Vale. Eles pedem a legalização de cinco áreas invadidas na região, a construção de estradas, postos de saúde, creches, além do fornecimento de energia elétrica e água potável em assentamentos regularizados.
Qual a responsabilidade da Companhia Vale do Rio Doce por todas essas reivindicações? Rigorosamente, nenhuma. Não cabe à empresa responder às palavras da coordenadora estadual do MST, Ayala Ferreira, segundo a qual ¿nunca foi de interesse nem desse governo nem dos passados solucionar problemas do campo¿. Só cabe à empresa fazer o que lhe é do alcance, o que fez: comunicou a invasão à Justiça Federal e pediu a mobilização de força policial para a retirada dos manifestantes. Em nota, a empresa declarou esperar providências rápidas das autoridades e externou sua ¿perplexidade¿, por ser alvo de ativistas cujas reivindicações não têm vínculo algum com ela, ¿como a defesa da reforma agrária e protesto contra o imperialismo¿.
Aí existe até uma certa ingenuidade, por parte dessa empresa, por supor que o MST e seus assemelhados necessitam de qualquer ¿vínculo¿ para justificar suas predatórias invasões e ocupações. Suas bandeiras agora são outras bem mais ¿modernas¿, tais como: reestatização, luta contra os transgênicos, ambientalismo e outros temas bem em moda. O que o MST não modernizou foi seu método de operação, que continua predatório e praticante dos mais diversos vandalismos como sempre. Pois as pedras que agora joga nos trens em Carajás têm tudo que ver com os saques de caminhões, as invasões de fazendas produtivas - com depredação de suas sedes, matança de seus animais, colocação de seus funcionários em cárcere privado, etc. -, os saques e destruição de cabines de pedágio, a invasão e depredação de imóveis públicos, o cerceamento do livre direito de ir-e-vir dos cidadãos nas estradas e outros abusos semelhantes. E por sobre tudo isso o que menos mudou, no MST e assemelhados, é o grande escárnio que fazem às decisões da Justiça.
Apesar de liberada no fim da manhã de quinta-feira, pelos 3 mil emessetistas que a ocupavam - depois de a Justiça ter dado 5 dias de prazo para a governadora acionar a força policial -, a ferrovia da Vale no Pará continua sofrendo a mesma ameaça e o mesmo risco, porque tudo depende do que for acertado na reunião que o governo, cedendo à pressão, marcou com os sem-terra, para o dia 25. Como disse a coordenadora estadual do MST: ¿As famílias não vão abandonar o local, apenas permitiremos a passagem dos trens da Vale do Rio Doce, enquanto durar a negociação com o governo.¿ Quer dizer, o escárnio à Justiça vai continuar, porque funcionou!