Título: Freio no juro expõe gasto do governo
Autor: Aiko Otta, Lu
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/10/2007, Economia, p. B8
Para economistas, decisão do Copom reforça discussão sobre influência das despesas públicas na alta da inflação
A ¿pausa¿ no processo de redução dos juros decidida este mês pelo Comitê de Política Monetária (Copom) vai reforçar a discussão sobre o crescimento dos gastos do governo, avaliam economistas. ¿É uma questão de escolha¿, disse o economista-chefe da corretora Convenção, Fernando Montero. ¿Se o governo decide que vai continuar aumentando o crédito, estimulando o consumo e o investimento e também seguir elevando os gastos, é preciso saber que os juros terão de ficar mais altos.¿
¿Não é do estilo do Banco Central ficar no morde-e-assopra¿, disse o coordenador do Núcleo de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, ao comentar a possibilidade de os juros ficarem estacionados em 11,25% ao ano por algum tempo. Nesse período, acredita ele, ganhará peso a discussão sobre a influência dos gastos públicos na inflação e, por conseqüência, nos juros.
Ele comentou que, embora as atas das reuniões do Copom não sejam muito enfáticas na questão do gasto público, a estrutura de despesas do governo é a verdadeira razão pela qual as taxas de juros caíram tão lentamente a partir de setembro de 2005. ¿Levaram dois anos para reduzi-la em 8 pontos porcentuais¿, observou. Se houvesse mais comedimento nas despesas, acredita, a taxa poderia ter caído mais rápido.
A ata da reunião de outubro menciona a influência dos ¿impulsos fiscais¿ como um dos fatores que levaram à decisão de parar com a queda dos juros. O tom é mais moderado do que no passado, acredita o economista da CNI, porque o governo já optou por ampliar suas despesas.
Essa foi uma das conclusões do 2º Encontro Nacional da Indústria, realizado na semana passada em Brasília. Ficou no empresariado um entendimento de que o governo dificilmente atenderá aos alertas quanto à trajetória insustentável das despesas públicas, classificada como ¿insustentável¿ no documento divulgado no fim do evento. O remédio, acreditam os industriais, é fixar um limite máximo para a carga tributária. Enquanto a arrecadação continuar batendo recordes, não haverá freio para os gastos.
¿O Brasil tem um problema estrutural¿, disse o presidente da CNI, Armando Monteiro Neto. ¿O gasto público cresce mais do que a taxa de crescimento da economia.¿ Segundo Monteiro Neto, esse fator põe em risco a expansão do Produto Interno Bruto (PIB). A mesma avaliação foi feita no encontro do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com representantes de 100 grandes empresas brasileiras, na quarta-feira. Os empresários cobraram do governo medidas de contenção nos gastos.
O setor produtivo se preocupa com o aumento do gasto público porque sabe que a maior parte dessas despesas não pode ser reduzida facilmente. São gastos com a folha, aposentadorias e os programas de transferência de renda. Significa que, independentemente do cenário econômico, será necessário manter certo nível de arrecadação para sustentar as despesas.
Por essa lógica, a perspectiva para a carga tributária, que segundo a CNI é a mais elevada entre países de renda média, é ficar como está ou subir. ¿E é uma bobagem essa história que há um limite político para a carga tributária¿, disse Fernando Montero. ¿Se isso fosse verdade, Lula não teria sido reeleito.¿
DESPESAS
¿O Banco Central não tem a tarefa de controlar os gastos do governo, não está nas atribuições dele¿, reagiu o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. ¿A tarefa deles é controlar a inflação.¿ Ele avalia que a parada nos juros ocorreu porque houve repique da inflação nos últimos meses.
Bernardo também rebateu o temor de que a carga tributária vá subir ou continuar elevada. Ele frisou que, na reunião com os empresários, Lula acenou com a possibilidade de reduzir a tributação para setores específicos, como automobilístico, siderúrgico e de papel e celulose. Além disso, o presidente deixou claro seu interesse em avançar com a reforma tributária.
O ministro refutou ainda a avaliação de que as despesas estão muito elevadas. ¿Elas estão compatíveis com as condições da economia.¿ Na reunião de Lula com os empresários, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, mostrou gráficos indicando que as despesas com pessoal, por exemplo, estão menores do que a média do período entre 1995 e 2002. Pelos números do ministro, naquele período as despesas equivaleram a 5,22% do PIB. Já em 2003, o gasto estava em 4,93% do PIB, caindo para 4,74% do PIB este ano e para 4,76% do PIB em 2008.
Como a economia está crescendo, a despesa parece contida, embora tenha subido em reais. Por isso, ao ver os gráficos, a empresária Luiza Trajano, do Magazine Luiza, reclamou: ¿Não é a conta que nós empresários fazemos¿. O professor Rogério Mori, da Fundação Getúlio Vargas, tampouco está satisfeito. ¿Nos últimos meses, observamos uma aceleração grande nos gastos.¿ Ele avalia, também, que o governo tem se esforçado pouco para modificar sua estrutura de gastos.