Título: PF desmonta quadrilha que adulterava leite v
Autor: Kattah, Eduardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/10/2007, Vida&, p. A14

Cooperativas de MG, que produziam 400 mil litros/dia, adicionavam ao produto soda cáustica e água oxigenada

Belo Horizonte - A Polícia Federal (PF) prendeu ontem 27 pessoas e desarticulou um esquema de crimes contra a saúde pública por meio da adição de substâncias químicas não permitidas ao leite longa-vida, o que o tornava impróprio para consumo. Conforme as investigações do Ministério Público Federal (MPF), a Cooperativa dos Produtores de Leite do Vale do Rio Grande (Coopervale), em Uberaba, e a Cooperativa Agropecuária do Sudoeste Mineiro (Casmil), em Passos, são suspeitas de acrescentar ao leite soda cáustica (hidróxido de sódio) e água oxigenada (peróxido de hidrogênio).

As substâncias, de acordo com a PF, eram diluídas em água - junto com outras, como citrato de sódio e ácido cítrico -, numa proporção de 10% do total, e usadas para aumentar a longevidade do produto, reduzindo sua acidez. O MPF alertou que as substâncias, se utilizadas em desacordo com os parâmetros químicos indicados, ¿podem se transformar em poderosos agentes cancerígenos¿ (leia mais sobre riscos ao lado).

Como parte da Operação Ouro Branco, foi determinado o recolhimento de amostras de leite longa-vida em todo o País. Segundo a PF, o produto adulterado era revendido pelas cooperativas para empresas como Parmalat e Calu, entre outras, que comercializavam o produto em embalagens próprias em todo o território brasileiro. Procuradas pelo Estado, a Parmalat e a Calu negaram em nota adquirir leite dessas cooperativas.

¿Não há como, hoje, recolher todo produto que está no mercado porque as empresas recebem leite de várias cooperativas. Não há como saber, sem antes fazer uma análise, se o leite que está sendo vendido é impróprio para o consumo humano¿, observou o procurador Carlos Henrique Dumont.

A produção diária das cooperativas chegava a 400 mil litros (250 mil da Casmil e 150 mil da Coopervale). As Promotorias de Defesa do Consumidor em Uberaba e Passos determinaram a suspensão da produção e a apreensão dos estoques de leite de ambas. ¿Dependendo das novas análises, a decisão pode ser mais abrangente¿, disse o promotor Cristiano Cassiolato, referindo-se a uma eventual medida que leve à retirada de produtos das prateleiras.

PRISÕES

A PF informou no início da noite de ontem que cumpriu todos os 27 mandados de prisão temporária e realizou buscas e apreensões em diversos endereços nas cidades do Triângulo Mineiro e no sul do Estado.

Entre os presos estão dirigentes da Coopervale e da Casmil - apontados como possíveis chefes do esquema - e funcionários das cooperativas. Em Passos, a PF vasculhou fábrica, escritório e a residência do presidente da Casmil, Dácio Francisco Delfraro, que foi preso. Um químico responsável pela fórmula da substância também foi preso. Os nomes dos outros presos não foram divulgados.

Os agentes federais prenderam também dois funcionários do Serviço de Inspeção Federal responsáveis pela fiscalização das cooperativas em Passos e Uberaba. ¿Obrigatoriamente ele (o fiscal) está dentro da empresa, acompanhando essa produção. Esse fiscal não tem como alegar que não sabia que o leite estava sendo adulterado¿, disse o delegado Willian Nascimento.

A estimativa do chefe da PF em Passos, Davidson Chagas, é de que os crimes eram praticados havia pelo menos dois anos. Os esquemas de adulteração do leite começaram a ser investigados há cerca de quatro meses, com base em denúncias de outras cooperativas e de ex-funcionários das empresas. No dia 16 de agosto, o MPF interceptou duas carretas em Passos com leite cru da Casmil.

O boletim de análise de leite do Serviço de Inspeção Federal que acompanhava a carga atestava ausência de conservantes, mas a análise dos produtos feita pelo Laboratório Nacional Agropecuário (Lanagro) confirmou a fraude e a presença, em todas as amostras, de água oxigenada. Segundo a avaliação técnica, o procedimento criminoso teria por objetivo a ¿recuperação¿ do leite estragado ou impróprio para o consumo que chegava dos produtores rurais.

O Estado não conseguiu contato com representantes da Coopervale e da Casmil. O advogado do presidente da cooperativa de Passos também não foi encontrado.