Título: Cunha Lima renuncia para adiar julgamento
Autor: Felipe Recondo, Felipe; Madueño, Denise
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/11/2007, Nacional, p. A8

Joaquim Barbosa, do STF, acusa deputado de manobra para fugir de condenação por tentativa de assassinato

Depois de se valer por 12 anos da prerrogativa de ser julgado apenas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e às vésperas de uma eventual condenação, o deputado Ronaldo Cunha Lima (PSDB-PB) renunciou ao mandato. Com isso, provocou o adiamento de uma decisão - a sentença deveria sair segunda-feira, mas agora o caso vai voltar para a primeira instância da Justiça. A manobra foi considerada um ¿escárnio¿ pelo ministro do STF Joaquim Barbosa, relator do processo contra o deputado.

Em 1993, quando era governador da Paraíba, Cunha Lima atirou em seu adversário político Tarcísio Burity em João Pessoa. Burity sobreviveu ao atentado.

Desde 1995, o ex-governador tinha mandatos no Congresso - elegeu-se senador e, em seguida, deputado por duas vezes. Isso lhe garantia o privilégio de só ser julgado pelo Supremo. O foro privilegiado é criticado por retardar os julgamentos, pois o STF não tem estrutura para julgar os casos com rapidez. Ontem, com a renúncia, Cunha Lima decidiu ser julgado por júri popular.

¿Renuncio ao mandato de deputado federal, representando o povo da Paraíba, a fim de possibilitar que esse mesmo povo me julgue, sem prerrogativa de foro, como um igual que sempre fui¿, disse na carta em que formalizou a decisão. No texto, ele pediu que a Câmara informasse a presidente do Supremo, ministra Ellen Gracie.

Às 15h08, o ofício da Câmara foi protocolado no STF. ¿Um gesto aparentemente nobre é na realidade um artifício para ganhar tempo e protelar um julgamento¿, criticou o líder do PSOL, deputado Chico Alencar (RJ). O suplente Walter Correia de Brito Neto (DEM-PB) deve assumir a vaga.

`FORO PERVERSO¿

O ministro Barbosa, que desde 2003 relata a ação contra Cunha Lima, acusou-o de usar de todas as manobras para fugir do julgamento. ¿O ato dele é um escárnio com a Justiça brasileira em geral e o Supremo em particular. O gesto dele mostra como é perverso o foro privilegiado¿, afirmou. ¿Ele tem o direito de renunciar, mas o que ele quis foi impedir que a Justiça se pronunciasse.¿

O que mais o irritou foi que Cunha Lima esperou o Supremo incluir a ação na pauta de julgamento de segunda-feira, 14 anos após a tentativa de assassinato e 5 depois de começar o processo, para renunciar. Dessa forma, todo o trabalho feito por Barbosa e pelos outros ministros que analisaram o caso desde 1994 será jogado fora. Além disso, como o deputado já tem 71 anos, o prazo para prescrição do crime é reduzido. Ou seja, antes de 2013, disseram assessores de Barbosa, o processo será arquivado.

O ministro acha que a lei deve mudar, para que casos como esse não se repitam. ¿O que tem de fazer é acabar com o foro. Só isso.¿ Com a renúncia, o processo contra Cunha Lima irá para a Justiça da Paraíba e recomeçará do zero. ¿Agora o processo vai lá para a primeira instância e vai durar 10, 12 anos¿, reclamou Barbosa. ¿Espero que haja ministros corajosos e independentes na Paraíba.¿

Cunha Lima é réu confesso e provavelmente seria condenado segunda-feira. Com a sentença, também seria cassado, pois a Constituição prevê que perde o mandato o parlamentar ¿que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado¿. Além disso, ele teria os direitos políticos suspensos por 8 anos a partir do fim de seu atual mandato, em 2011.

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