Título: O silêncio dos empresários
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/10/2007, Notas e Informaçoes, p. A3

Não foi por falta de assunto que empresários e dirigentes das maiores companhias instaladas no País permaneceram praticamente em silêncio ao longo das três horas do encontro que mantiveram com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os ministros da área econômica, além da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. São muitos os problemas que enfrentam e que precisam ser resolvidos para assegurar a continuidade do crescimento, mas nada ou quase nada falaram sobre isso ao presidente. E, ainda assim, saíram satisfeitos - pelo menos se disseram satisfeitos - os participantes ouvidos pela imprensa ao deixarem o salão do Palácio do Planalto.

Quase uma centena de empresários acompanhou, praticamente sem nenhuma contestação, a exposição do ministro da Fazenda, Guido Mantega, que tentou demonstrar a correção da política fiscal e apresentou dados sobre o desempenho da economia, para concluir que a economia vai bem. Não houve sequer um aparte, nem nesse nem muito menos no outro discurso de uma hora que os convidados do governo tiveram de ouvir do presidente da República, que, na essência, repetiu lições que todo empresário conhece por dever de ofício. Terminado o encontro, ouviram-se elogios ao entusiasmo do presidente, à qualidade de sua exposição, ao seu poder de convencimento e até a sua franqueza, no que, aliás, foram honestos, considerando-se que o presidente deixou claro que não atenderá às reivindicações que eles deixaram de fazer.

Era um clima muito diferente daquele observado antes do início da reunião. Não diante do presidente, mas sim na chegada ao Planalto, onde muitos empresários falaram da necessidade de se reduzir desde já a alíquota da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), para a extinção desse tributo num prazo determinado.

Por achar desnecessário - já conta com os votos necessários no Senado -, Lula não tratou do tema diretamente, mas deixou claro que não aceitará nenhuma das sugestões dos empresários para compensar a aprovação da CPMF.

Se se examinar a questão da CPMF apenas pelo ângulo da disputa que o governo trava no Senado para sua renovação, talvez essa possa ser uma questão de interesse limitado do empresariado. Mas o que o caso da CPMF envolve não é apenas sua renovação. O que está em debate e os empresários pretendiam discutir com Lula é a política fiscal, marcada pela voracidade com que o governo absorve a riqueza produzida pelo setor privado para financiar gastos que não param de crescer, como mostram números conhecidos do empresariado - e que certamente diferem daqueles apresentados pelo ministro da Fazenda.

Se não quisessem tratar especificamente da CPMF, os empresários tinham à disposição um roteiro de temas de muito boa qualidade para apresentar ao presidente. Trata-se da ¿Carta da Indústria¿, documento discutido e aprovado no 2º Encontro Nacional da Indústria (Enai), que se encerrou um dia antes da reunião com Lula.

A carta afirma que, para assegurar a continuidade do crescimento, o País depende não do empresariado e sim do próprio governo. Se os empresários não tivessem recuado, iriam fazer um resumo da carta que diz que é preciso reduzir os gastos públicos, de modo que a carga tributária seja paulatinamente cortada, sem expandir o déficit público, e acelerar os investimentos em infra-estrutura, aumentando a capacidade do setor público e oferecendo segurança ao investidor privado.

Diriam que não adianta, como tentou fazer o ministro da Fazenda em sua exposição, separar despesas por áreas para justificar seu crescimento. Diriam, como disse em voz baixa um empresário que ouvia a exposição, ¿despesa é despesa, e qualquer um de nós sabe disso¿. Acrescentariam que despesa precisa ser coberta com alguma receita, para não gerar prejuízo. Queixariam-se de que as despesas do governo estão crescendo e, para cobri-las, cresce também a carga tributária, o que reduz a capacidade do setor privado de investir e do consumidor de gastar naquilo que precisa. E terminariam mostrando que, apesar do aumento da arrecadação, os investimentos públicos não crescem na mesma proporção, o que leva à deterioração da infra-estrutura já precária. Mas os empresários preferiram ficar calados para não ter de dizer que tudo isso exige respostas e atitudes imediatas e claras do governo Lula.

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