Título: Dúvida em documento adia decisão no caso Cacciola
Autor: Netto, Andrei
Fonte: O Estado de São Paulo, 26/10/2007, Vida&, p. B3

Advogado questiona autenticidade de mandado que pede a prisão do ex-banqueiro e definição sobre extradição fica para 22 de novembro

Em audiência realizada ontem no Palácio da Justiça de Mônaco, o advogado de defesa do ex-banqueiro Salvatore Cacciola, Frank Michel, apresentou duas cópias do mesmo mandado de prisão supostamente emitido pela Justiça brasileira em 2000. Os documentos teriam o mesmo responsável, mas assinaturas diferentes. Sensível à suspeita apresentada pela defesa, os juízes do Tribunal de Apelações de Mônaco decidiram abrir uma investigação sobre a autenticidade dos mandados. A decisão será conhecida em 22 de novembro.

Até lá, Brasília terá de se explicar à procuradoria do principado. De acordo com Frank Michel, um mandado de prisão emitido pela Justiça brasileira em 19 de setembro de 2000 foi usado para sustentar o primeiro pedido de extradição contra Cacciola, preso na Itália em 2000. À época, os juízes negaram o pedido porque a lei do país veta extradições de cidadãos italianos - Cacciola nasceu em Milão e tem dupla cidadania. Supostamente o mesmo mandado, também datado de 19 de setembro de 2000 e assinado pelo mesmo magistrado brasileiro, teria sido entregue pelo Ministério da Justiça ao governo de Mônaco sete anos depois, no início deste mês. Os dois documentos, contudo, teriam assinaturas diferentes.

'Afirmei no Tribunal de Apelações que o documento é falso e pedi a abertura de uma investigação. Ainda não sabemos quem cometeu a falsificação nem quando o segundo documento foi realmente feito', disse Frank Michel ao Estado. 'Mas, se ficar comprovado que um mandado de prisão datado de 2000 foi feito na verdade em 2007, isso será grave aos olhos da Justiça de Mônaco.'

O advogado esclareceu que não solicitou na audiência de ontem a liberdade de seu cliente, que continua detido numa prisão à beira do Mar Mediterrâneo. 'Salvatore Cacciola quer se explicar aos olhos da Justiça. Achamos que o tribunal não pode aceitar a extradição e vamos aguardar o fim do processo.'

Em Brasília, o Ministério da Justiça considerou absurda a alegação de que o governo brasileiro utilizou documento falso para obter a extradição de Cacciola. Segundo o ministério, todos os documentos enviados - mandado de prisão, pedido de extradição e traduções do processo - são autênticos e foram aceitos, após conferidos, pelo Ministério Público de Mônaco. 'É uma aberração, uma chicana que transcende princípios éticos', criticou o secretário nacional de Justiça, Romeu Tuma Júnior, que coordena as ações do governo brasileiro para extradição do ex-banqueiro.

Tuma Júnior explicou que o mandado de prisão de 2007 teria de ter assinatura diferente porque o juiz é outro e se trata de um novo mandado, no qual se pede a extensão do pedido de extradição para que Cacciola responda por outros crimes cometidos no Brasil. Ele disse que o governo brasileiro mandou primeiramente as cópias autenticadas e depois os originais dos dois mandados, o de 2000 e o de 2007, quando a Justiça e o Ministério Público de Mônaco solicitaram.

Segundo o secretário, o Brasil mandou na frente as cópias autenticadas, ainda em setembro, porque os originais estavam em poder da Interpol do Rio, que precisava do documento para efetuar a busca e captura do fugitivo no exterior. A documentação entregue às autoridades monegascas inclui os originais da sentença da 6ª Vara Federal do Rio, que condena o ex-banqueiro a 13 anos de prisão, em 2005, e da primeira ordem de prisão provisória, expedida ainda em 2000.

As novas suspeitas em torno da autenticidade do mandado de prisão não foram a única surpresa do dia. O Ministério Público de Mônaco também admitiu ontem ter falhado ao não enviar, até às vésperas da audiência, os documentos do pedido de extradição traduzidos para o francês a nenhum dos advogados de Cacciola. A falha também pesou na decisão de adiar o caso até 22 de novembro.