Título: PAC não anda, mas já causa gargalos
Autor: Rehder, Marcelo
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/10/2007, Economia, p. B4
Setor enfrenta filas de até 2 anos para máquinas e equipamentos, além da falta de mão-de-obra especializada
As obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) mal saíram do papel e o setor de infra-estrutura já enfrenta filas de até dois anos para entrega de máquinas e equipamentos pesados, além da falta de mão-de-obra especializada.
Sob o efeito da valorização do mercado internacional de commodities minerais e do aumento dos investimentos públicos e privados na construção civil, mineração, siderurgia e petróleo, entre outros, a demanda chega a superar em até 40% a oferta de equipamentos como guindastes, caminhões pesados rodoviários e fora-de-estrada, retroescavadeiras e tratores de roda pesados.
Neste ano, o crescimento estimado da venda de 14 tipos de equipamentos da chamada linha amarela no País é de 46% em relação a 2006 (ver tabela), segundo levantamento da Associação Brasileira de Tecnologia para Equipamentos e Manutenção (Sobratema). A entidade projeta para o ano investimentos de R$ 19,2 bilhões na compra de novas máquinas.
'O número poderia ser maior não fosse o ciclo tão longo para entrega dos pedidos', diz Afonso Celso Mamede, presidente da Sobratema.
A escassez de equipamentos pesados é mundial e não apenas localizada no Brasil, o que dificulta o recurso da importação. O crescimento do consumo global superou as previsões mais otimistas tanto de fornecedores de matérias-primas e insumos quanto de fabricantes, que agora não conseguem atender a todos os pedidos. Além dos atrasos, a procura maior que a oferta já abre espaço para aumento de preços.
A Liebherr Brasil, subsidiária da maior fabricante global de guindastes sobre pneus com lança telescópica do tipo AT (sigla da denominação americana All Terrain, que significa todo o terreno), não tem espaço para novos pedidos na sua carteira nos próximos dois anos. Com sede na Suíça, a multinacional detém 48% do mercado mundial desse tipo de máquina. No Brasil, responde por 70% das vendas de guindastes com capacidade para içamento de até 1.200 toneladas, que são importados e chegam a custar 6 milhões.
'Estamos tentando conter a ansiedade do mercado em demandar máquinas para 2010, porque ainda não temos segurança do custo de produção', afirma Cesar Schimidt, gerente comercial da Liebherr Brasil. 'A demanda aquecida despertou o apetite de todos e os preços de matérias-primas e componentes têm aumentado.'
No Brasil , a Liebherr produz outros equipamentos pesados, como escavadeira hidráulica, pá carregadeira e betoneira sobre caminhão, cuja demanda também está bastante aquecida. Nesses segmentos, a fila de espera é de seis meses a um ano.
'A demora na entrega é terrível, porque a indústria da construção só compra equipamentos quando recebe a obra, cujo início pode ser atrasado por falta de máquinas', afirma Mamed, que também é diretor da Odebrecht.
Para contornar o problema, a empresa passou a reformar equipamentos usados que antes eram vendidos , além de recorrer a empresas de locação.
'Trabalho há 45 anos no setor e nunca vi uma demanda tão grande por equipamentos para terraplenagem como a que estamos vivendo hoje', afirma Eurimilson João Daniel, diretor de gestão da Escad Rental. A empresa dispõe de 312 equipamentos, dos quais 78% estão alugados. 'É um índice elevado que representa riscos, pois começo a falar não para o mercado,especialmente em relação a máquinas de grande porte.'
A Construtora Andrade Gutierrez teve de contratar no exterior 45 máquinas em regime de admissão temporária para a construção de 670 quilômetros do gasoduto Urucu-Manaus, em plena floresta amazônica. Mas a empresa tem aumentado os investimentos em máquinas, apesar do prazo dilatado para entregas.'Nos últimos 12 meses, investimos cerca de R$ 100 milhões em equipamentos em obras no Brasil e no exterior, e vamos investir outros tantos no ano que vem', diz Mário Humberto Marques, diretor de suprimentos e equipamentos da Andrade Gutierrez.
Pressionados pela forte demanda, os fabricantes têm de suar a camisa para tentar atender ao maior número possível de pedidos. Muitos abriram um terceiro turno de trabalho e passaram a operar até mesmo nos sábados e domingos. Também estão investindo no aumento da capacidade de produção. Mas ainda é insuficiente para fazer frente à demanda.
'A partir do próximo ano, vamos trazer escavadeiras e outros equipamentos fabricados pelo grupo no exterior', conta Roque Elias, diretor comercial da Case Construction. A empresa está investindo US$ 15 milhões no setor de usinagem, um dos gargalos da produção, e de soldas.
Além disso, a Case pretende direcionar para o mercado doméstico parte das motoniveladoras que hoje são exportadas para Estados Unidos, Europa e América Latina, que representam 15% da produção.
Os fabricantes enfrentam ainda a escassez de matérias-primas e componentes no mundo todo. Um dos maiores problemas tem sido a falta de pneus, o que levou a Liebherr a entregar guindastes sem o estepe nos últimos três anos. A coreana Hyundai, cujas exportações para o Brasil já dominaram 20% do mercado de escavadeiras, teve problemas com a falta de componentes como comandos. 'Sofremos muito com o prazo de entrega este ano todo', diz Sergio Camargo, da Trop Comércio Exterior, representante da marca no País.
Além dos problemas na entrega de máquinas e equipamentos, as construtoras enfrentam a falta de mão-de-obra especializada no mercado.
'Estamos buscando técnicos nas escolas e engenheiros nas faculdades e treinando o pessoal', conta Afonso Mamede. Segundo ele, a construtora tem formado mão-de-obra nos canteiros de obras. 'Contratamos mais gente que o necessário, para formar mão-de-obra para os próximos contratos.'