Título: Mesmo com renúncia, STF deve julgar Cunha Lima
Autor: Recondo, Felipe
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/11/2007, Nacional, p. A10

Ministros consideram manobra uma tentativa de ¿fraude¿ e ¿abuso de poder¿

Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) reagiram ontem à manobra do ex-deputado tucano Ronaldo Cunha Lima (PB), que renunciou ao mandato na semana passada para escapar de ser condenado por tentativa de homicídio, e devem manter seu julgamento na Corte. A renúncia foi classificada pelos membros do Supremo como uma tentativa de ¿fraude¿ e um ¿abuso de poder¿ para evitar a condenação.

Para os ministros, Cunha Lima tinha o direito de renunciar, mas não poderia fazer isso somente para impedir o julgamento do processo pelo STF, que estava marcado para ontem. ¿Se fosse um ato praticado no início do processo, no meio do processo, eu não teria dúvida em dizer que seria absolutamente conforme a ordem jurídica¿, argumentou o ministro Cezar Peluso. ¿Só às vésperas do julgamento ele veio a exercer esse direito (de renunciar), que eu entendo como uma tentativa de fraude¿, reforçou o ministro Joaquim Barbosa, relator do processo contra Cunha Lima, que classificara a renúncia como um ¿escárnio¿.

O argumento que servirá para o STF manter o julgamento está na Constituição. Os ministros ponderaram que, depois de aberto um processo por quebra de decoro no Congresso, o parlamentar que renunciar ao mandato para tentar fugir da punição ainda pode ter os direitos políticos cassados. Por analogia, afirmou Barbosa, o caso se aplicaria também para o julgamento de Cunha Lima: mesmo com a renúncia, o processo prosseguiria.

Ontem, dos seis ministros presentes no plenário, quatro - Barbosa, Peluso, Carlos Ayres Britto e Eros Grau - votaram em favor da continuidade do julgamento. A ministra Cármen Lúcia pediu vista do processo, que deve voltar à pauta do Supremo amanhã. Apesar do pedido de adiamento, a ministra indicou que concordará com a tese dos colegas.

Os ministros Carlos Alberto Direito, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e Marco Aurélio Mello não estavam presentes no julgamento de ontem e ainda precisam analisar o caso. Se ao menos um deles concordar com a tese, Cunha Lima será julgado em definitivo pelo STF por tentativa de homicídio contra o ex-governador da Paraíba Tarcísio Burity. E mesmo que o crime - ocorrido há 14 anos - esteja prescrito, o ex-parlamentar poderá ter os direitos políticos cassados por oito anos a partir de 2011.

Além disso, estará aberto um precedente no STF para que sejam barradas as manobras de políticos que tentam evitar processos judiciais. Os ministros ressalvam, no entanto, que a eventual condenação valerá apenas para este caso específico. Não seria aplicável, por exemplo, ao deputado que renuncia ao mandato para evitar abertura de processo por quebra de decoro.