Título: País promete pragmatismo nas relações com Chávez e Evo
Autor: Pamplona, Nicola
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/11/2007, Economia, p. B4

Objetivo é evitar parcerias indesejáveis da Venezuela e instabilidade na Bolívia

O Itamaraty e o Palácio do Planalto adotaram um modelo de relacionamento com Bolívia e Venezuela que pode ser chamado de ¿diplomacia de resultados¿. Considerada pragmática, essa ação tem o objetivo de impedir que a Venezuela de Hugo Chávez busque parcerias indesejáveis mundo afora, além de evitar a desestabilização econômica e, conseqüentemente, política da Bolívia. Concentrado nesses alvos, o governo brasileiro passou por cima de análises de risco e de recentes experiências.

Na semana passada, o Planalto mandou a Petrobrás atender ao apelo do governo boliviano por investimentos na produção de gás natural. Em paralelo, calou-se diante do agendamento, para dezembro, de um plebiscito que poderá converter a Venezuela numa ditadura consentida. Desse jeito, a diplomacia do governo Lula tenta desencorajar a percepção de que segue em curso uma corrida entre Brasília e Caracas pelo espaço político sul-americano.

Para a cúpula do Itamaraty, o interesse do Brasil nas relações bilaterais com os dois vizinhos está centrado na área energética e na estabilidade política. A possível restrição da influência de Chávez sobre a administração do boliviano Evo Morales, a partir da retomada de investimentos da Petrobrás na Bolívia, pode ser um subproduto geopolítico da ação de Brasília. Mas não o seu objetivo.

Passados 18 meses da nacionalização dos setores de gás e de petróleo da Bolívia, o Planalto e a Petrobrás receberam em outubro um previsível apelo do governo Evo Morales e responderam com dose dupla de generosidade. Na semana passada, em La Paz, a Petrobrás não só concordou com a ampliação dos investimentos na produção de gás, como também decidiu comportar-se como mera produtora, e não como a maior cliente da Bolívia.

Essa movimentação, segundo analistas do governo, deveu-se a um raciocínio político. Ciente de que a atual crise no fornecimento de gás a indústrias e taxistas brasileiros não seria resolvida a curto prazo, o Planalto concentrou-se em impedir que a Bolívia mergulhe numa nova crise política e econômica.

Os prenúncios desse cenário foram disparados pelo desabastecimento interno de combustíveis e pela redução do ritmo de ingresso das receitas da exportação de gás nos cofres públicos bolivianos. Esses sinais motivaram o ministro de Hidrocarbonetos, Carlos Villegas, a tourear o discurso do presidente da Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB), Guillermo Arequipa, e a pedir a retomada dos investimentos da Petrobrás. As declarações de Evo nesta semana, de que a estatal brasileira terá de submeter-se às normas do país caíram, em Brasília, em generoso vazio, classificadas como o típico discurso para as massas.

CÚPULAS

No caso da Venezuela, o Planalto e o Itamaraty estão decididos a abraçar o vizinho o mais apertado possível, como meio de influenciar as decisões de Hugo Chávez, de impedir o isolamento do país na América Latina e de evitar a busca por aliados indesejáveis, como o Irã e a Belarus. Por essa lógica, quanto mais integrada ao Mercosul estiver a Venezuela, menores os riscos de uma ação inesperada de Chávez no campo externo e sobre os investimentos brasileiros e o comércio bilateral.

Na busca por resultados, o governo brasileiro propôs a Caracas reuniões de cúpula bilaterais a cada quatro meses. Em outubro, em Manaus, o ¿tempo fechou¿ durante as discussões entre Lula e Chávez sobre os investimentos da Petrobrás e da Petróleos de Venezuela (PDVSA) em ambos os países. Mesmo assim, uma segunda reunião foi marcada para dezembro, em Caracas.

¿Chávez é imprevisível. Mas, quanto mais amigo do Brasil ele for, mais tranqüilo será para nós. Devemos nos lembrar de que há uma forte mão de Chávez sobre a atuação das empresas brasileiras na Venezuela¿, afirmou uma fonte do Itamaraty, que reconhece o estilo autoritário e centralizador do líder venezuelano. ¿Qualquer alternativa à linha de ação que seguimos hoje nas relações do Brasil com a Venezuela só jogaria Chávez nos braços de países que nada têm a ver com a nossa região.¿

Essa atitude cuidadosa, entretanto, estaria longe de significar tolerância completa com as iniciativas de Chávez nos planos interno e externo. As recentes declarações do presidente Lula e do chanceler Celso Amorim de que a reeleição ilimitada não seria uma fórmula aceitável no Brasil se traduziram em claro recado da insatisfação de Brasília com o caminho escolhido por Chávez na reforma constitucional - a mesma que será submetida a plebiscito em dezembro. Da forma como essa posição foi estampada, o venezuelano não poderá reclamar da ingerência brasileira nos assuntos internos de seu país.

A decisão do Executivo brasileiro de não cobrar urgência do Congresso nem de mobilizar suas bases parlamentares em favor da aprovação do protocolo de adesão da Venezuela ao Mercosul também é um claro sinal a Caracas de que é preciso completar as etapas pendentes, como a definição do calendário de liberalização do seu comércio com o Brasil.

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