Título: O desperdício de água
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Fonte: O Estado de São Paulo, 23/11/2007, Notas e Informaçoes, p. A3

As capitais brasileiras perdem quase metade (45%) da água retirada dos mananciais em vazamentos de redes de abastecimento, fraudes e falhas de medição. Os 6,14 milhões de litros desperdiçados diariamente nas grandes cidades do País seriam suficientes para atender a 38 milhões de consumidores. A capital do desperdício é Porto Velho, que perde 78,8% da água encanada.

Tão desanimador quanto o quadro do abastecimento de água é o cenário do saneamento ambiental: menos de 50% dos moradores das capitais contam com serviços de esgoto. Apenas 6 das 27 capitais estaduais atendem à totalidade de seus moradores.

Os dados sobre as coberturas e desperdícios nas redes públicas de abastecimento de água e saneamento estão reunidos num estudo elaborado pelo Instituto Socioambiental (ISA). O estudo, inédito pela abrangência, ressalta a necessidade urgente de adoção de medidas para expandir as regiões de preservação ambiental e as redes de saneamento básico, assim como para conter a invasão de áreas de mananciais e recuperar aquelas que já foram degradadas em função da falta de planejamento urbano eficaz - o que acontece na maior parte das grandes cidades. O estudo recomenda, ainda, a intensificação dos esforços de educação ambiental, para que a população compreenda que também é responsável pela conservação da água.

Na região metropolitana de São Paulo, a mais rica do País, a Sabesp produz mais de 3,4 bilhões de litros de água por dia, mas pelo menos 30,8% (mais de 1 bilhão de litros) são desperdiçados. A perda se iguala a todo volume retirado da Represa de Guarapiranga para o abastecimento da população. Desse total, 65% correspondem a vazamentos nas velhas redes de distribuição. Outra parte desaparece na submedição dos hidrômetros e nos roubos de água realizados por meio de ligações clandestinas - ao desperdício, portanto, soma-se a fraude. A água perdida ou desviada em um dia seria suficiente para abastecer por pelo menos 15 dias uma cidade como Diadema, com mais de 395 mil habitantes.

Em abril, a Sabesp anunciou investimentos de R$ 100 milhões no Programa de Redução de Perdas, que inclui ações de melhoria da rede e da qualidade da manutenção de todo o sistema. A empresa também assinou convênio de cooperação técnica, no valor de US$ 2,46 milhões, com a Japan International Cooperation Agency, para troca de experiências e tecnologia entre os técnicos da Sabesp e os peritos japoneses. A expectativa é de que as perdas baixem até 15% até 2010. Com o objetivo de ter efetivo controle sobre o volume de água produzido e o volume distribuído à população, no mês passado a Sabesp instalou um macromedidor de vazão no Reservatório do Jaraguá.

No Estado de São Paulo já está em curso pelo menos um programa de redução de perdas. Em Limeira, a companhia Águas de Limeira reduziu as perdas de 45% para 18% num período de sete anos.

A perda de água na cidade de São Paulo é menor que a perda média nas demais capitais estaduais, mas está absurdamente longe do nível internacional. Em Nagoya, no Japão, o índice de perda é de 4,5%; em Tóquio, de 4,7%; e a média nipônica é de 8%. Além disso, o consumo de água dos paulistanos é excessivo. Cada morador da capital gasta, em média, 221 litros de água por dia, conforme informações da Sabesp - um volume duas vezes maior do que o recomendado pela ONU. Em alguns bairros, o desperdício é absurdo. Em Higienópolis, por exemplo, gasta-se, em média, 500 litros de água per capita por dia e um dos motivos é a falta de manutenção das velhas redes hidráulicas dos prédios. Como a conta de consumo é coletiva na quase totalidade dos condomínios, os vazamentos ficam anos sem ser percebidos.

A par da divulgação do estudo, o Instituto Socioambiental lançou, na quarta-feira, a campanha De Olho nos Mananciais, destinada a incentivar os consumidores a economizar água e os governantes a cumprir a parte que lhes cabe na preservação das áreas de mananciais - a água, afinal, não é um recurso infinito.