Título: 'Governo não tem como sustentar Renan, que está abandonado'
Autor: Fontes, Cida
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/11/2007, Nacional, p. A6

Para professor da FGV, afastamento da presidência e licença médica criaram cenário favorável à cassação

A aprovação, por 11 votos a 3, do relatório do senador Jefferson Péres (PDT-AM) pedindo a cassação do senador Renan Calheiros (PMDB-AL) ajuda a indicar o cenário que poderá se delinear em plenário e confirma um enfraquecimento cada vez mais acentuado do presidente licenciado do Senado. A avaliação é do cientista político Marco Antônio Carvalho Teixeira, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Em entrevista ao Estado, ele avalia que o afastamento do cargo e a licença médica tirada pelo parlamentar foram prejudiciais a ele, criando um cenário favorável à sua cassação.

Como o sr. recebeu a notícia da votação no Conselho de Ética?

Me surpreende, primeiro, o resultado. Isso mostra que o Renan Calheiros está, pelo menos em princípio, abandonado. Provavelmente, quem votou nele foram aqueles de sempre. Wellington Salgado, o Almeida (Lima) e algum outro. Isso decididamente projeta uma situação muito ruim para ele.

É possível esperar que isso se repita no plenário?

É possível, pois o Conselho de Ética, de certa forma, reflete a correlação de forças na Casa. É possível que tenhamos uma variação um pouco para mais ou um pouco para menos no plenário. Pode ser que lá o placar seja um pouco diferente, mas não acredito que haverá uma distância muito grande em relação ao que se apresentou, já que a representação no Conselho de Ética é proporcional às bancadas partidárias.

Uma mudança nas regras para que o voto fosse aberto, no plenário, intensificaria esse cenário?

Sem dúvida. Até hoje a população ainda não sabe quem é que votou favoravelmente à manutenção do mandato dele. Poucas são as pessoas que assumiram isso publicamente.

O sr. acredita que o afastamento da presidência da Casa e a licença jogaram contra ele?

Sem dúvida. A licença e o afastamento tiraram dele grande parte do poder simbólico que acumulava. Aquele poder de constranger, manipular, pressionar. Na medida em que ele perde isso, ele perde capacidade também, de certa forma, de manter aliados. Afinal, o caso dele está na agenda da opinião pública. Este é o momento de o Senado mostrar uma postura diferente da que teve no passado, aquela coisa espetacularizada, com briga, proibição, recursos à Justiça. O senador Tião Viana tem demonstrado que quer votar logo, para evitar suspeitas de que haveria manipulação e, assim, prestar contas à sociedade.

Essa intenção de prestar contas à sociedade é real?

Acredito que sim. Se você pega os depoimentos dos senadores de oposição, como o Tasso Jereissati e o Marconi Perillo, eles dizem que o Senado é outra Casa desde que o Renan se afastou. Provavelmente, há uma preocupação dos senadores em passar uma outra imagem para a opinião pública, já que a imagem do Senado foi completamente alvejada, de um ponto de vista negativo.

O resultado no Conselho de Ética abre que tipo de expectativa quanto à possibilidade de uma volta de Renan à presidência?

Que ele não volta à presidência não tenho a menor dúvida. Não é apenas uma votação em plenário que demonstra isso. É o conjunto de todas as situações em que ele se envolveu. É inviável, até mesmo do ponto de vista da governabilidade e dos trabalhos da Casa, pensar em uma volta do Renan Calheiros à presidência do Senado. Agora, eu acho que, diante do quadro atual e do que o Conselho de Ética desenhou hoje, acho provável que ele venha inclusive a perder o mandato.

O senador Tião Viana tem dito que pretende fazer a votação no plenário no dia 22. É possível?

É um pouco difícil, pois temos um feriado bastante longo agora. Não afeta a capital federal, que não comemora o Dia da Consciência Negra, mas São Paulo e Rio estão parados. Se votar, será um grande feito.

Quais são as chances de sobrevivência política de Renan?

Ele pode voltar a ser uma liderança de peso regional, como ocorreu com o ACM (Antonio Carlos Magalhães), quando ele se envolveu naquela confusão da quebra de decoro. O Renan perdeu aquela capacidade simbólica de liderança nacional, de pessoa de respeitabilidade, de alguém que negociava pelo PMDB. E é óbvio que, se ele for cassado, fica sem direitos políticos por um bom tempo. Mas, se vier a se preservar, não o vejo como liderança nacional.

O sr. acredita que esse quadro interfere na coalizão?

Acho que isso pode interferir internamente no PMDB, um rearranjo de forças. Mas o governo não tem mais como sustentar o Renan Calheiros. Isso é prejudicial para o próprio governo.

No PMDB, quem ganha?

Aquelas pessoas que, de certa forma, foram alijadas do poder ou do comando da sigla pelo próprio Renan. Talvez o PMDB pernambucano, com Jarbas Vasconcelos. O próprio Michel Temer talvez ganhe um vôo mais autônomo, já que ele estava muito vinculado à movimentação interna do partido.

Quem é: Marco Antônio Teixeira

É cientista social e político, com mestrado e doutorado obtidos pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

É professor da Fundação Getúlio Vargas em São Paulo (FGV-SP) e atua como pesquisador em áreas como administração pública, cidadania, inovação na administração pública, política local, política brasileira e eleições.