Título: 'O Ipea é, e continuará sendo, plural e autônomo'
Autor: Graner, Fábio
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/11/2007, Economia, p. B3

Marcio Pochmann: presidente do Ipea Economista nega que saída de pesquisadores esteja relacionada a posições ideológicas e diz que seria `absurdo¿ censurar alguém

No centro da polêmica provocada pela saída de quatro pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o presidente da entidade, Marcio Pochmann, disse ontem ao Estado que não assumiu o cargo, em agosto passado, para ¿ceifar¿ a autonomia da instituição. Pochmann afirma que o Ipea será o que sempre foi: uma instituição ¿plural¿. Para ele, a idéia de ¿expurgo¿ atenta contra a sua própria trajetória acadêmica.

Por que o Ipea decidiu afastar os quatro profissionais?

O Ipea, como toda instituição de pesquisa, mantém uma série de acordos de cooperação que envolvem a liberação de pesquisadores do Ipea e a atração de pesquisadores de outras instituições. Há um instrumento jurídico que regula esse intercâmbio. Todo dia a gente renova ou atualiza, recebe de volta ou libera pesquisadores que estão aqui e vão para outras instituições, em razão de terem cumprido o objeto do intercâmbio. O convênio que normatizava a presença dos dois colegas do BNDES (Giambiagi e Tourinho) no Ipea se encerra agora em dezembro. Avaliando os resultados, não há por que continuar, porque já se cumpriu o objeto do convênio estabelecido.

Qual era o objetivo do convênio?

O Ipea é uma instituição com quase mil funcionários, todo dia eu assino liberações, acordos. Não fico analisando caso a caso. Na verdade, é uma regra de administração de pessoal que a instituição tem, como qualquer instituição de pesquisa. Nós estamos conversando com o BNDES, e outras instituições, para estabelecer novos termos de convênio e objetivos. Completando um novo convênio, novas pessoas do Ipea e do BNDES, ou as mesmas, farão parte da nova pesquisa.

E nos outros dois casos (Rezende e Bonelli), em que os pesquisadores eram aposentados?

Não estamos autorizados a abrigar aposentados. Em qualquer repartição, pública ou privada, cumpridos os requisitos de aposentadoria, e solicitando-se a aposentadoria, (a pessoa) é aposentada. Nós temos 500 funcionários aposentados. Imagina se todos eles quiserem ficar! Não há nada, portanto, que possa evidenciar algo como censura. É um absurdo se usar o termo ¿expurgo¿. Isso depõe contra a minha carreira profissional. Sou acadêmico com mais de duas décadas de experiência, 30 livros publicados, seria absurdo alguém na minha posição censurar ou expurgar alguém. O Ipea é, e continuará sendo, uma instituição plural e autônoma para tomar decisões.

Mas não é bom para o Ipea manter pessoas com vozes dissonantes do governo, como Fabio Giambiagi, que quer uma reforma radical na Previdência?

Nós temos dentro do quadro do Ipea pesquisadores que têm uma visão equivalente ou até mais radical do que a do colega Giambiagi. Se, porventura, o Ipea e o BNDES fizerem um convênio cujo objeto seja discutir a previdência, não há por que o Ipea não recebê-lo. Mas isso significa que o próprio BNDES deveria indicá-lo, porque essa é uma decisão das instituições.

Não vai haver uma visão monolítica do grupo do sr., que é chamado de ¿desenvolvimentista¿?

Gostaria que vocês acompanhassem o período que eu estiver à frente do Ipea para atestar isso. Evidentemente que a direção do Ipea e o presidente têm uma visão sobre o mundo, assim como, nos últimos 44 anos, aqueles que foram presidentes e diretores também tiveram uma visão de mundo. Mas os pesquisadores são autônomos, concursados, qualquer tentativa de imposição (de idéias) sofrerá forte reação. Sugiro que você procure os pesquisadores.

E quem está dizendo que está sendo censurado?

Se houver alguma coisa comprovada, tomarei a decisão necessária. A razão de ser do Ipea é sua pluralidade, a sua autonomia. É ridículo imaginar que uma diretoria, o presidente, possam ceifar essa situação. Agora, você tem gente que gosta de determinada visão, e gente que gosta de outra visão. Essa é a riqueza da instituição.

O afastamento desses economistas não pode criar o receio de que o debate está sendo cerceado?

O Ipea não pode organizar um consenso em torno de um tema, do objeto principal. Deve fazer com que ao menos o dissenso aflore, que todas as visões possam ser oferecidas. Até para que os que tomam decisões no País tenham visão mais ampla. O papel do Ipea é justamente abrir essa perspectiva, criar várias visões.

Mas há setores que dizem que o Ipea está se livrando de economistas ¿independentes¿?

Todos os pesquisadores do Ipea são independentes. Ninguém é aprovado por ter visão ¿y¿ ou pertencer a partido ¿x¿.

Quem é: Marcio Pochmann

Possui graduação em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Fez doutorado em Ciência Econômica na Universidade Estadual de Campinas

Professor da Universidade Estadual de Campinas

Foi Secretário Municipal do Desenvolvimento e Trabalho de São Paulo de 2001 a 2004