Título: Operadoras dizem que cobrança é indevida
Autor: Filgueiras, Sonia
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/11/2007, Vida &, p. A16
Para entidade, planos não podem ser tratados como `vilões¿ no caso
O vice-presidente da Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge), Sérgio Vieira, afirma que a dívida total de R$ 473,987 milhões contabilizada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), referente ao custo dos atendimentos a pacientes que têm planos privados, mas recorreram à rede pública, inclui cobranças indevidas. ¿São muitos os casos em que o paciente buscou o SUS (Sistema Único de Saúde) porque o seu plano não previa a cobertura daquele atendimento. E as operadoras recorrem.¿
Para Vieira, as operadoras dos planos não podem ser tratadas como vilãs na discussão. ¿São R$ 473 milhões acumulados em de oito anos. O número é relevante, mas não é assim tão absurdo se comparado aos valores que o setor de saúde movimenta.¿
A União aplica na saúde pública R$ 45 bilhões por ano. Somando-se os investimentos obrigatórios de Estados e municípios, o orçamento anual é de aproximadamente R$ 90 bilhões. ¿Os planos de saúde não estão inviabilizando o SUS quando questionam o ressarcimento¿, diz.
As operadoras de plano de saúde são contrárias à cobrança do ressarcimento e aguardam o resultado do julgamento da ação direta de inconstitucionalidade contra a legislação que instituiu a exigência, hoje no Supremo Tribunal Federal (STF). Na ação, as operadoras argumentam que a Constituição classifica a saúde como direito do cidadão e dever do Estado. Por isso, os planos não seriam obrigados a pagar por atendimentos prestados a seus clientes na rede pública. O governo instituiu a cobrança por entender que, ao assumir o atendimento em um procedimento coberto por um plano, está, na prática, poupando a operadora de custos.
CONFLITO
Para o médico e deputado Rafael Guerra (PSDB-MG), que até setembro presidia a Frente Parlamentar da Saúde no Congresso, o governo demora a implantar uma solução para cobrar a dívida das operadoras de planos de saúde porque não quer entrar em conflito aberto com as empresas. ¿O governo teme que, apertando os planos, haja repasse das cobranças ao preço das mensalidades, atingindo os usuários¿, diz.
A preocupação federal não envolveria apenas cálculos econômicos. ¿A clientela dos planos de saúde é formada pela classe média, formadora de opinião. Os pobres, atendidos pelo SUS, não têm voz¿, afirma Guerra. Segundo ele, hoje 25% da população é cliente do sistema de saúde suplementar. ¿O governo tem investido menos do que deveria no sistema de saúde público. Se as mensalidades subirem, mais gente buscará o SUS, o que significará mais custos. O governo não quer isso¿, diz o deputado.
¿Não se trata de preservar um ou outro grupo, mas sim de buscar uma solução que não encareça os planos, prejudicando os usuários, o que é absolutamente legítimo¿, rebate o deputado Pepe Vargas (PT-RS), também médico e integrante da mesma frente parlamentar, que reúne 260 deputados e senadores. ¿A solução é complexa. Qualquer mudança no sistema de cobrança envolve impactos econômicos e sociais. Não tem como elaborar um projeto de lei sobre o assunto sem estudos aprofundados¿, diz o petista.
Vargas concorda que a mudança das normas para dar mais agilidade e eficiência à cobrança da dívida dos planos com o SUS é urgente. Como as despesas com planos de saúde podem ser descontadas do Imposto de Renda, o impasse em torno da cobrança da dívida penaliza duas vezes os cofres públicos. ¿O governo deixa de arrecadar em duas frentes¿, completa Rafael Guerra.
Entre os parlamentares que atuam na área de saúde, a solução preferida passa pela fixação de um porcentual padrão de recolhimento para as operadoras. Com isso, seriam eliminados os cruzamentos caso a caso e todas as dificuldades associadas a eles, como a falta de estrutura para fazer a cobrança, os erros cadastrais e os adiamentos por parte das operadoras. A ANS informa que a idéia esbarra em obstáculos jurídicos. Um sistema deste tipo poderia ser equiparado à criação de um novo tributo e contestado na Justiça.