Título: Professores e qualidade na educação
Autor: Costin, Claudia
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/12/2007, Espao Aberto, p. A2

Aumento do salário, melhores condições de trabalho, redução do número de alunos na sala de aula. Os resultados de uma pesquisa realizada recentemente pela Fundação Victor Civita e pelo Ibope, com professores da rede pública de ensino, reforçam que essas reivindicações não atendidas são alguns dos motivos que levam à insatisfação da classe. Mas será que a melhora desses aspectos, isoladamente, traria maior qualidade ao ensino?

A resposta é não. Os fatores objetos de crítica dos docentes são algumas das conseqüências da histórica má gestão da educação brasileira. E esse problema não está restrito ao perímetro das escolas ou das salas de aula, mas permeia todo o sistema educacional: começa com a inadequada formação dos professores e diretores, falta de objetivos claros no ensino e de adoção de ações corretivas quando falhas de aprendizagem são detectadas em avaliações nacionais e estaduais.

A educação tem reassumido papel de destaque no panorama das políticas governamentais brasileiras, principalmente a partir da década de 1990, quando se iniciou o processo de universalização do acesso à escola. Desde então a política educacional tem sido objeto de análise constante para permitir que o influxo de novos estudantes possa ser acompanhado de qualidade no ensino-aprendizagem, a fim de adequar o sistema educacional às demandas do sistema produtivo e aos imperativos éticos de construção de um país mais justo.

Não se pode falar em desenvolvimento sem um sério investimento em educação, pois uma força de trabalho sem as qualificações necessárias não põe o Brasil em condições de participar numa economia globalizada. Da mesma maneira, fala-se muito em inclusão social, mas aulas que não agregam conhecimentos e competências pouco farão pelos jovens incluídos na escola. A verdadeira inclusão significa que os vastos contingentes agora com acesso à educação não se transformem, ao concluir a escola, em analfabetos funcionais com diplomas.

O Plano de Desenvolvimento da Educação, lançado recentemente pelo Ministério da Educação (MEC), procura enfrentar alguns destes problemas, como fazer avaliações sistemáticas da aprendizagem, na trilha das avaliações introduzidas na década de 90 pela agora secretária de Educação de São Paulo, Maria Helena Castro, corrigir erros por meio de um inteligente sistema de incentivos, capacitar os professores, melhorar a gestão da escola pública. Vários Estados e municípios vêm adotando testagens, inclusive para verificar se, como preconiza o compromisso Todos pela Educação, que envolve empresários, educadores, técnicos de governos e organizações da sociedade civil, as crianças estão completamente alfabetizadas aos 8 anos. É o caso de São Paulo, onde tanto o Estado como a Prefeitura estão avaliando o aprendizado para utilizar essas informações no aperfeiçoamento do ensino.

Dentre as várias avaliações, uma se mostra particularmente interessante, por facilitar o controle social e, mais particularmente, por possibilitar aos pais o monitoramento da qualidade da escola freqüentada por seus filhos: o Prova Brasil, que integra o Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Básico (Saeb), criado para produzir informações sobre o ensino oferecido por município e escola.

Segundo resultados apontados na pesquisa feita pela fundação, somente 31% dos professores conhecem o Saeb. O Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo também é pouco conhecido (lembrado por somente 24% dos professores do Estado). Parece curioso que um instrumento voltado para dar informações aos professores sobre em que seus alunos falham seja tão pouco conhecido. É verdade que a pesquisa precede as mudanças em curso no Estado de São Paulo, mas o fato, em si, revela que os resultados dos testes pouco foram utilizados no Brasil para melhorar o ensino de porcentagens (desconhecidas por 60% dos alunos da oitava série) ou o desenvolvimento de competências de leitura (inadequado para 65% das crianças da quarta série).

Na mesma pesquisa, os docentes consideram-se os principais protagonistas da educação. Parecem não dar muito valor às Secretarias de Educação e ao MEC, vistos como instâncias de cobrança burocrática, e não como coordenadores da política educacional ou provedores da infra-estrutura ou de condições gerais para que a aprendizagem ocorra.

Os professores afirmam também que a ausência dos pais é um dos maiores problemas enfrentados. De fato, estudos evidenciam que a participação dos pais na educação é fator de enorme relevância. Mas é também um caminho para se pensar num maior envolvimento da sociedade, que poderia influenciar em decisões de aportes de recursos para a escola de seu município e zelar por sua boa utilização para garantir melhor aprendizagem. É o que se viu no Rio de Janeiro quando o governador Sérgio Cabral, no último dia 22, assinou um termo de adesão ao compromisso Todos pela Educação, no sentido de atingir metas como garantir não só o acesso de todas as crianças e jovens às escolas, mas a obtenção por eles de notas elevadas nas avaliações, evidenciando melhorias progressivas em Português e Matemática.

Com esforços assemelhados, poderíamos em poucos anos vencer o déficit educacional. Isso passa, certamente, por melhorar condições de trabalho dos professores, mas inclui também dar-lhes desafios mais ousados, capacitá-los para uma prática educacional mais conducente a bons resultados na aprendizagem de seus alunos e possibilitar-lhes parecerias com pais e membros da comunidade. O que se espera é simples: uma educação de qualidade - que seja concebida não como simples acesso às cadeiras escolares, e sim como uma fonte segura de conhecimento.

Claudia Costin, professora do Ibmec-SP e da Universidade de Quebec, foi ministra da Administração Federal e Reforma do Estado e secretária de Cultura do Estado de São Paulo