Título: Chávez leva sete horas para admitir a derrota
Autor: Sant¿Anna, Lourival
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/12/2007, Internacional, p. A15

O CNE já sabia desde as 18 horas de domingo que o `não¿ tinha vencido

Caracas - Desde as 18 horas de domingo, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) sabia que a oposição havia vencido o referendo sobre a reforma constitucional. Controlado por chavistas, o órgão, que havia prometido divulgar o primeiro boletim por volta de 19 horas, deixou o país em suspense até a 1h15 (3h15 em Brasília) da madrugada de ontem, quando finalmente anunciou a vitória do ¿não¿. Imediatamente depois, em cadeia nacional de televisão, o presidente Hugo Chávez reconheceu a primeira derrota desde a sua primeira eleição, em 1998.

¿Tentaram atrasar a divulgação, na esperança de que os números mudassem¿, disse ao Estado o observador internacional português José Albino Silva Peneda, deputado do Parlamento Europeu. ¿Há quem diga que estavam convencendo Chávez a aceitar a derrota¿, continuou Peneda, que chefiou a missão de observadores internacionais na tumultuada eleição parlamentar de 2005. ¿Mas a pressão para divulgar o resultado estava muito forte. Os partidos de oposição tinham os números.¿

A demora do CNE em divulgar o boletim causou enorme tensão. Nas portas do CNE, dirigentes oposicionistas exigiam uma satisfação. ¿Bravo povo da Venezuela, não durma¿, exortou Antonio Ledezma, do Comando Nacional de Resistência, que liderou a campanha contra a reforma. ¿A madrugada é perigosa.¿

O gráfico da contagem, obtido pelo Estado, mostra que em nenhum momento o ¿sim¿ ficou acima do ¿não¿, ao contrário das pesquisas de boca-de-urna realizadas pelos três principais institutos do país, que previam a aprovação da reforma por uma margem de 6 a 8 pontos porcentuais. E ao contrário, também, do que deu a entender o vice-presidente Jorge Rodríguez, que comandou a campanha em favor da reforma e afirmou, no fim da noite, que ¿a disputa estava apertada¿, sugerindo que o ¿sim¿ e o ¿não¿ oscilavam de posição na contagem. Não oscilavam.

No início da contagem, o ¿não¿ vencia por margem expressiva, de mais de 8 pontos porcentuais. No horário em que o CNE tinha se comprometido a divulgar o primeiro boletim, essa margem tinha caído para 4 pontos, mas seguia consistente (ver gráfico).

Ao reconhecer a derrota, Chávez deixou claro que tinha acompanhado passo a passo a contagem do CNE, dirigido por cinco ¿reitores¿, dos quais quatro são vinculados ao governo.

¿A situação veio se complicando, por distintas razões, durante a tarde, com diferenças microscópicas, mas sempre com o `não¿ por cima¿, reconheceu o presidente, num pronunciamento excepcionalmente sóbrio, no Palácio Miraflores, à 1h30 (3h30 em Brasília) de ontem. ¿O dilema em que me debatia, se não era irreversível, vamos submeter o país, a Venezuela não merece uma tensão como essa¿, balbuciou Chávez sem fazer sentido, aparentemente ainda um pouco perturbado.

Recuperando o seu estilo ferino, o presidente encontrou ânimo para esnobar: ¿Essa vitória `pírrica¿ (de alto preço) eu não teria querido.¿ E para fazer uma recomendação à oposição: ¿Saibam administrar essa vitória.¿

Na platéia encontravam-se seus principais ministros e assessores, vários deles com os olhos vermelhos. Também estavam a senadora colombiana Piedad Córdoba, devidamente vestida de vermelho, a cor oficial dos chavistas, e a mãe e a irmã da ex-candidata a presidente da Colômbia Ingrid Betancourt, refém do grupo guerrilheiro Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). ¿Sigo às ordens¿, disse ele às três mulheres, referindo-se a seu papel de mediador, do qual foi excluído pelo presidente colombiano, Álvaro Uribe.