Título: Doações de medula crescem 553%
Autor: Cimieri, Fabiana
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/11/2007, Vida&, p. A18

Número de voluntários salta em 3 anos e faz banco de transplantes brasileiro tornar-se o 5º maior do mundo

As cartas de gratidão que a equipe do Registro de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome) do Instituto Nacional do Câncer (Inca) recebe de pacientes que passaram por transplante e de doadores anônimos humaniza a estatística: em pouco mais de três anos cresceu quase 9 vezes o número de doações, pulando de 60 mil doadores cadastrados em junho de 2004 para 525 mil em outubro de 2007. Considerando o total de doadores registrados em 2004 (80,3 mil), a alta até agora é de 553%.

Com mais de meio milhão de amostras , o Brasil já tem o quinto maior banco de células-tronco para uso em transplantes de medula óssea do mundo e está sendo assediado por países da Europa e pelos Estados Unidos para uniformizar o seu cadastro de voluntários. ¿Todos estão de olho no nosso banco, porque a população brasileira tem uma diversidade (genética) incrível, mas ainda não há uma regulamentação que permita isso¿, diz a coordenadora do Redome, Izabela Salomão.

O sargento do Exército Edvaldo Gama, de 52 anos, apresentou-se como doador há cerca de dez anos, quando o cadastro começou a ser formado e ainda não era informatizado. ¿Sempre fui doador de sangue e soube que uma amiga de trabalho tinha um sobrinho com leucemia. Nessa época, me informei sobre a doença e me cadastrei, inicialmente pensando na possibilidade de salvá-lo¿, conta.

No início de 2005, Gama foi avisado de que era compatível com um paciente. Fez mais uma bateria de exames e, em dezembro do mesmo ano, fez a doação. ¿Eu me senti `o escolhido¿ por poder salvar a vida de uma pessoa. É o meu irmão de sangue e tenho muita vontade de conhecê-lo, dividir a felicidade, saber se deu certo. Vai ver que é por isso que não podemos saber para quem doamos, porque eu ficaria muito frustrado se soubesse que não deu¿, diz.

Segundo Izabela, o Inca estuda permitir que, depois de dois anos do transplante, o doador e o receptor possam se encontrar. ¿A gente sente que há essa necessidade de ambas as partes, seria uma experiência nova no mundo¿, afirma.

Na opinião da coordenadora do Redome, o aumento do número de doadores deve-se às campanhas promovidas pelo instituto, mas, principalmente, à mobilização do círculo familiar e de amigos de algum paciente com indicação de transplante. ¿Hoje em dia, com a internet, a difusão de informações é muito rápida e adquire proporções enormes em pouco tempo¿, explica.

Além de alguns tipos de leucemia, o transplante também é indicado em certos casos de anemia congênita e linfomas. O procedimento é simples, embora seja realizado, na maior parte das vezes, com anestesia geral. São feitas duas pequenas incisões em cada um dos lados da bacia, por onde são feitas pequenas punções de células-tronco. ¿Fica um pouco dolorido, mas no dia seguinte já pude ir para casa e em menos de uma semana estava levando a vida normalmente¿, diz a estudante de medicina Mariana Gonçalves, 23, que há seis anos doou células da medula para a irmã gêmea Flavia, que tinha linfoma.

COMO FUNCIONA

Inicialmente, o cadastro no Redome é feito por meio de uma amostra de sangue de 5 ml, que é colhida nos hemocentros estaduais. Esse sangue passa pelos exames tradicionais e por uma análise de DNA, que vai determinar qual é o HLA (Antígenos Leucocitários Humanos, na sigla em inglês). O HLA localiza-se no braço curto do cromossomo 6, que é a região responsável pela rejeição em transplantes. O ideal é ter compatibilidade de 100%, mas nem sempre há doador disponível e o médico pode optar por transplantar com um porcentual menor, com HLAs 90% compatível. A primeira opção é procurar um irmão compatível, já que a chance de terem HLAs idêntico é de 25%. Depois, busca-se um doador na família, e só então parte-se para a busca no Redome.

Um programa de computador desenvolvido no Inca cruza os dados de receptores e doadores. Quando é encontrado um HLA compatível, a assistente social Ítala Martins Ferreira entra em contato com o doador em potencial. O transplante pode ser feito depois de uma bateria de exames que dura cerca de seis meses para o doador e de um ciclo intenso de quimioterapia que mata todas as células da medula do receptor - para diminuir o risco de rejeição.