Título: Cultura do 'provisório' afeta bolso do brasileiro
Autor: Scarance, Guilherme
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/12/2007, Nacional, p. A6

Para especialista, prorrogações não valem quando se referem a benefícios

Na última década, o brasileiro passou a sentir no bolso os efeitos da cultura do ¿provisório¿. Viu nascer a CPMF, em 1996, como alternativa para a crise na saúde, enquanto não se vislumbrava solução definitiva. Um ano depois, em 2 de dezembro de 1997, viu o Congresso aprovar a medida provisória 1.602, elevando a alíquota máxima do Imposto de Renda de 25% para 27,5% - parte de um pacote fiscal para enfrentar um momento difícil. Hoje, com novo governo e momento da economia, o cidadão ainda paga o imposto do cheque, com alíquota maior, e assistiu à efetivação da mordida maior do IR (em 2005).

A advogada Elizabeth Libertuci, especialista na área tributária, alerta que a cultura do provisório que se eterniza não vale quando se tratam de benefícios. Cita, por exemplo, decretos do governo de 2004 e 2005 que reduziram alíquotas de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e estão prestes a perder validade. ¿A tendência é não haver prorrogação. Os prazos estão se esgotando e não ouvi comentários de que serão revigoradas¿, diz Elizabeth, que integra o Conselho de Estudos Jurídicos e Legislativos da Fiesp.

O gérmen da CPMF foi o Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF), que depois foi remodelado e transformado em CPMF - a mudança agradou tanto aos governos, pela facilidade de arrecadação, que não acabou mais. Subiu também a alíquota. A do IPMF era de 0,25%. A da CPMF começou em 0,20% e terminou em 0,38%. Cálculos realizados com base em dados do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal, do escritório Libertuci Advogados e da própria Receita, atualizados pelo IPCA, indicam que, se alíquota da CPMF tivesse sido mantida em 0,20%, os contribuintes teriam economizado ao menos R$ 117,8 bilhões.

ARRECADAÇÃO

Paga mais quem ganha mais. O argumento usado para prorrogar a CPMF já aparecia em 1997 para justificar a elevação em 10% do IR. ¿Cobrar mais Imposto de Renda é mais justo porque o IR é um imposto direto, que atinge apenas quem ganha mais¿, disse o então governador de São Paulo, Mário Covas. A MP com a mudança passou em dezembro daquele ano, valendo por dois anos. A nova alíquota foi prorrogada em 1999 e, de novo, em 2002.

Lula deu um basta no caráter transitório e efetivou a alíquota de 27,5% do IR com a Lei 11.119, de 25 de maio de 2005. ¿No governo FHC havia legislação mais transparente, havia previsão de volta da alíquota anterior¿, opina Elizabeth. ¿Há uma tendência do governo Lula de transformar o provisório em permanente¿, diz. ¿Quanto à CPMF, se há elogio é o fato de ser provisória. Se fosse permanente, não ocorreria o debate que há hoje.¿ Para a tributarista, se a contribuição for mantida, a reforma tributária ¿voltará para a gaveta¿.

Para o economista Roberto Macedo, professor titular da USP e pesquisador da Fipe, quem está no poder usa ¿qualquer pretexto para manter a arrecadação¿. Macedo diz que todas as empresas e lares precisam cortar gastos e economizar, ¿senão não vão para a frente¿. ¿Mas quem está no governo não tem nenhum respeito pelo cidadão¿, afirma. ¿No fundo, querem mais dinheiro para gastar.¿ Segundo o economista, o PAC da Saúde foi um ¿apelo emocional¿ para sensibilizar a população e aprovar a CPMF, mas ¿está na hora de dar um basta¿.

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