Título: Futuro do mercado livre é incógnita
Autor: Goy, Leonardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/12/2007, Economia, p. B10

Após leilão de usina hidrelétrica do Rio Madeira, grandes consumidores querem debater tema com o governo

Os grandes consumidores de energia querem discutir com o governo o futuro do mercado livre (onde os clientes negociam a compra de energia diretamente com as usinas), após o leilão da Hidrelétrica de Santo Antônio, no Rio Madeira. O deságio de 35% na energia destinada ao mercado cativo (que são os que compram energia das distribuidoras, como é o caso das residências) sinalizou que a diferença poderá ser compensada no preço da eletricidade vendida aos consumidores livres, que são as grandes indústrias ou shoppings que negociam sua energia diretamente com geradores ou comercializadores. Ou seja, para garantir o preço de R$ 78,90 para o cativo, o livre pagaria acima de R$ 130.

¿Já pedimos uma audiência para discutir com o ministro se essa é a nova tendência do modelo¿, afirmou o presidente da Associação Brasileira dos Investidores em Autoprodução de Energia Elétrica (Abiape), Mário Menel. Segundo ele, se as suspeitas do mercado se confirmarem e a energia do Madeira (e de outras usinas) for vendida mais cara para os grandes consumidores, haverá a volta em massa para o mercado cativo.

¿Não existe mercado livre mais caro que o mercado cativo. Se for assim, voltamos a ser atendidos pelas distribuidoras.¿ Hoje, esses clientes representam 30% da capacidade instalada do País. Se parte deles resolvesse voltar para o mercado cativo, as concessionárias não teriam energia para atendê-los. Mas, segundo as regras, quando uma empresa decide retornar ao mercado cativo, as distribuidoras pedem um tempo, que pode ser de três anos.

O vice-presidente da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), Eduardo Spalding, também está preocupado com o preço da energia que a usina de Santo Antônio venderá para o mercado livre. Por essa razão, a Abrace vai propor ao governo que, no leilão da hidrelétrica de Jirau - que, com Santo Antônio, formará o Complexo Hidrelétrico do Madeira - o porcentual da energia destinada a esse mercado suba para 50%.

No leilão de Santo Antônio, realizado na segunda-feira, o governo estabeleceu que, no máximo, 30% da energia poderia ser destinada a esse segmento. O leilão de Jirau (3.300 megawatts) deve ser realizado no início de maio do ano que vem. ¿Essa seria uma forma de atenuar o problema e evitar a redução do mercado livre. Se isso acontecer, estaríamos na contramão do mundo¿, disse Spalding.

¿Vamos propor que, em Jirau, 50% da energia possa ser vendida ao mercado livre. Seria uma maneira de evitar que se repetisse o que aconteceu no leilão de Santo Antônio, no qual os consumidores livres acabaram subsidiando os cativos.¿ Para Spalding, se em Jirau o governo destinar metade da energia aos grandes consumidores, o consórcio vencedor poderá cobrar uma tarifa menor desses clientes, já que teria mais energia para oferecer ao segmento livre.

O presidente da Associação Brasileira dos Agentes Comercializadores de Energia Elétrica (Abraceel), Paulo Pedrosa, também defendeu o aumento da cota do mercado livre para 50% e, ainda, que o governo autorize a participação das empresas comercializadoras de energia como compradoras no leilão da usina hidrelétrica de Jirau.

O presidente da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), Luiz Carlos Guimarães, criticou a proposta de elevar para até 50% a cota da energia da usina hidrelétrica de Jirau que poderá ser vendida no mercado livre. ¿Essa proposta não faz sentido. Em primeiro lugar, porque não é essa a proporção do consumo brasileiro. Hoje, as distribuidoras respondem por 75% do mercado, e os consumidores livres, por 25%. Além disso, quem garante a expansão do sistema são as distribuidoras, que fecham contratos de longo prazo com as usinas.¿

No setor, há rumores de que o consórcio vencedor formado por Odebrecht (18,6%), Furnas (39%), Andrade Gutierrez (12,4%), Cemig Geração (10%) e os bancos Banif e Santander (20%) estaria negociando a energia para o mercado livre entre R$ 140 e R$ 160 o MWh. Os valores, porém, são considerados estratégicos e não foram confirmados. ¿Apesar do custo elevado, acredito que tem gente para comprar essa eletricidade. Tá cheio de empresa descoberta (sem contratos)¿, destacou uma fonte ligada ao leilão.

SÓCIOS

O consórcio afirmou que negocia a parceria de grandes grupos, como Vale e Votorantim, para o empreendimento. As duas empresas confirmam o interesse pela energia, mas afirmam que tudo vai depender da oferta feita pelos vencedores.

¿Ao se tornarem sócias do projeto, as empresas passam a ter uma série de incentivos fiscais, como a isenção de alguns encargos setoriais¿, destacou o diretor da consultoria PSR, Jorge Trinkenreich, que auxiliou a Odebrecht no processo.

Segundo ele, é difícil explicar o que houve para o preço de Santo Antônio sair tão baixo. Mas arrisca alguns palpites. ¿Um deles pode ser algum desconto conseguido em equipamentos, além do elevado conhecimento sobre o projeto. Mas algum risco eles aceitaram correr.¿

O resultado surpreendente do leilão provocou vários rumores sobre o que teria derrubado o preço da energia. Entre eles, circulou a informação de que a Petrobrás teria comprado uma parcela da produção para o mercado livre. Outra era que a Cemig ficaria com boa parte dessa eletricidade. Nada foi confirmado. O processo está sob sigilo.

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