Título: Algo foi salvo em Bali
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/12/2007, Notas e Informações, p. A3

Tudo levava a crer que a reunião internacional que pretendia chegar a algum consenso sobre a necessidade de regras mais rígidas de controle de gases do efeito estufa a partir de 2013 - a 13ª Conferência do Clima (COP-13) que se encerrou em Bali nesse fim de semana - redundasse num retumbante fracasso. No último momento, no entanto, algo pôde ser salvo na reunião, especialmente porque se encontrou uma maneira de atrair, para algum compromisso, o país que mais emite CO2 no planeta, os Estados Unidos da América, que desde os tempos do Protocolo de Kyoto já resistia a qualquer forma de controle de suas emissões.

Um grupo de países, liderados pela União Européia, queria estabelecer o compromisso, para ser cumprido até 2020, de corte de 25% a 40% das emissões de gases estufa, na comparação com os níveis de 1990. Para obter a adesão dos Estados Unidos, aventou-se a possibilidade de falar de um corte mais profundo, de 50%, mas em muito mais tempo - até 2050. No entanto, o que mais agradou aos norte-americanos foi a não fixação da data de referência. Considerando-se que as emissões crescem a cada ano, buscar no futuro índices menores do que os de 1990 significaria reduzir muito mais as emissões de carbono do que se a referência fosse em período bem posterior - 2007, por exemplo. Para ser aprovado, o texto final ficou cheio de lacunas mas, pelo menos, mostrou um roteiro para chegar-se a 2009, ocasião em que (espera-se) se estabelecerão as metas a partir de 2013, quando se esgotam as definidas no Protocolo de Kyoto.

Foi assim, com muitas concessões, que representantes de 190 países assinaram, no sábado, o chamado ¿Roteiro de Bali¿, um documento que poderá ser um marco histórico, por estabelecer diretrizes para um novo acordo político para a luta contra o aquecimento global - aquilo que, de maneira unânime entre as instituições científicas mais respeitáveis, que produziram documentos como o último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, é considerado um risco real e efetivo não só para a sobrevivência de um terço das espécies que existe no globo terrestre, mas, a longo prazo, para a sobrevivência da própria humanidade. Mas, como era de esperar, nem o interesse comum de toda a humanidade conseguiu eliminar as divergências existentes entre as nações - muitas delas de forte fundamento histórico. Se de um lado os grandes poluidores desenvolvidos resistem em ser controlados, de outro lado os países em desenvolvimento assumiram discursos como o de Munir Akram, embaixador do Paquistão na ONU e presidente do G-77, grupo de nações em desenvolvimento: ¿Os países industrializados tiveram 200 anos para trilhar um caminho de desenvolvimento econômico com o uso intensivo do carbono e, quando é nossa vez, nos dizem que não podemos fazê-lo.¿

Realmente, esse ¿direito à nossa vez¿, que parece ¿justo¿, mais justo seria se houvesse muitos globos terrestres disponíveis e muito mais tempo para degradá-los. Mas, quando houve a Revolução Industrial, a humanidade ainda não conhecia os efeitos do aquecimento global. Quanto ao Brasil, embora sejamos um país de grande relevância nesse tema - pelo lado negativo do desmatamento, mas também pelo lado positivo do potencial de energia renovável -, não logramos nenhum êxito propositivo na reunião, com a idéia ingênua de receber auxílio internacional para a preservação da floresta tropical que nos cabe proteger.

De qualquer forma, embora haja um certo ceticismo quanto aos avanços concretos que a COP-13 possa ter representado, no combate ao aquecimento global, algum passo à frente foi dado. O que muito se comenta, no momento, é a dependência que as novas diretrizes terão das próximas eleições presidenciais norte-americanas. Sabendo-se que o presidente George W. Bush deixou de cumprir os compromissos assumidos por Bill Clinton - não enviando para ratificação o acordo de Kyoto que seu antecessor havia assinado -, e conhecendo-se a mentalidade que tem presidido a política norte-americana de meio ambiente, justifica-se a expectativa em torno da eleição.

Afinal, será o eleitor do país que emite os maiores volumes de poluentes que, em última análise, decidirá as condições de sobrevivência das futuras gerações.

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