Título: Novas regras para balanços
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/12/2007, Notas e Informações, p. A3
Com as mudanças que o Senado acaba de aprovar no capítulo da legislação societária relativo a regras contábeis, tornando mais transparentes os balanços das empresas de capital aberto, o Brasil dá mais um importante passo no caminho da consolidação da sua posição na economia globalizada. Para atrair capitais, tecnologia e empresas e aumentar sua participação no comércio mundial, muitos países promoveram nos últimos anos as chamadas reformas microeconômicas, entre as quais se destaca a modernização da infra-estrutura jurídico-judicial. Essas reformas abriram caminho para a constituição de um ¿direito econômico global¿, mediante a progressiva convergência e harmonização, em escala mundial, dos direitos comercial e financeiro.
Tendo iniciado esse processo de modernização com atraso em relação à maioria dos países da Ásia e da Europa, o Brasil vai anulando progressivamente a distância que o separa deles. Há três anos, a Emenda Constitucional nº 45 introduziu a reforma do Judiciário, criando a súmula vinculante e abrindo caminho para uma série de mudanças nos Códigos de Processo Civil e Penal, para reduzir o excessivo número de recursos, agilizar a tramitação dos processos, descongestionar os tribunais superiores e permitir que os litígios corriqueiros sejam encerrados na primeira instância. E, há dois anos, entrou em vigor a Lei de Recuperação de Empresas, substituindo a arcaica Lei de Falências e Concordatas editada em 1945.
Estas mudanças constituíram uma pequena revolução no sistema jurídico brasileiro. As medidas que o Senado aprovou para alinhar o Brasil aos padrões globais de contabilidade são mais um avanço nessa evolução. Inspirado nas leis societárias dos países desenvolvidos, que enfatizam basicamente a lógica do valor de mercado nos balanços e demonstrações financeiras, o projeto agora depende de sanção do presidente Lula para entrar em vigor. No Brasil, a legislação societária que está em vigência, editada há 30 anos durante a ditadura militar, permite que as empresas registrem seus bens pelo valor que pagaram por eles.
Com as novas regras, os ativos e passivos das sociedades anônimas brasileiras serão registrados não mais pelos seus custos, mas pelo valor a eles atribuído pelo mercado. As regras também valem para aplicações de alto risco, como investimentos em derivativos, e para bens provenientes de fusões, aquisições e incorporação de empresas. Além dos tradicionais balanços, as empresas de capital aberto terão de divulgar com regularidade duas demonstrações - uma de fluxo de caixa e outra de valor adicionado. Com essas demonstrações será possível acompanhar o trânsito do dinheiro na empresa e registrar o quanto ela gerou de riqueza ao longo de um exercício, ou seja, a sua contribuição para a formação do PIB.
As novas regras determinam ainda a abertura de uma conta de intangíveis no balanço patrimonial das sociedades anônimas, para registrar a aquisição de bens como marcas e patentes. Elas proíbem a reavaliação espontânea de ativos, recurso muito utilizado por empresas em dificuldades com o objetivo de inflar seu patrimônio. Além disso, obrigam as empresas a incluir na conta de resultados os benefícios fiscais recebidos e a registrar como despesa a remuneração de executivos por meio de ações. Por fim, dão mais autonomia à Comissão de Valores Mobiliários, permitindo-lhe regulamentar, por meio de resoluções, a adaptação das regras brasileiras aos padrões internacionais de contabilidade.
Em sua versão original, o projeto aprovado pelo Senado era ainda mais rigoroso, impondo às companhias fechadas de grande porte as mesmas obrigações contábeis exigidas das empresas abertas. Contudo, o lobby das companhias fechadas foi mais forte e essa medida foi suprimida pela Câmara. Mesmo lamentando essa supressão, bancos de investimento, corretoras e analistas de mercado enfatizam a importância das novas regras para o bom funcionamento do mercado de capitais.
Essa é a lógica da globalização. Os países que modernizam sua infra-estrutura jurídica de acordo com os padrões globais, assegurando transparência nos balanços das empresas abertas, ampliando a segurança dos investidores e fortalecendo suas bolsas de valores, terão uma resposta rápida na forma de aumento da entrada de capitais para financiar seu crescimento.
Links Patrocinados