Título: Balanço e perspectivas do setor externo
Autor: Rubens Barbosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/12/2007, Espaço Aberto, p. A2

O setor externo brasileiro continuou a apresentar um desempenho muito positivo em 2007, mas alguns indicadores já sinalizam uma situação mais difícil para os próximos anos.

O comércio exterior, em seis anos, mais que dobrou em valor. Em 2007, as exportações subiram a US$ 160 bilhões e as importações, a US$ 120 bilhões. Quando colocadas em perspectiva e comparadas com outros países do Bric, contudo, as exportações brasileiras ficaram muito abaixo das da Rússia, da Índia e da China.

A taxa de crescimento das exportações vem caindo desde 2004, quando aumentou 32%. Em 2007, o crescimento deve ser de pouco mais de 10% e as projeções para 2008 indicam um incremento de 8% a 10%. A forte desaceleração da expansão das exportações reflete as dificuldades internas enfrentadas pelo setor. Não somente as exportações estão muito concentradas em commodities e manufaturados de comércio não dinâmico, mas a apreciação do câmbio faz diminuir a competitividade dos produtos brasileiros. Por outro lado, em 2007 as importações subiram a uma taxa de cerca de 30%. Em conseqüência disso, o superávit na balança vem sendo reduzido, devendo fechar 2007 ao redor de US$ 40 bilhões.

O comércio exterior brasileiro se beneficiou significativamente da forte expansão da economia e do comércio internacionais, resultante do crescimento da China e dos EUA e do preço das commodities, que alcançou níveis recordes históricos, impulsionando os valores em dólares das exportações.

O superávit da balança comercial ainda persistirá por algum tempo, apesar da desaceleração do crescimento das exportações, dados o dinamismo do setor exportador brasileiro, a diversificação de mercados e, sobretudo, a demanda por produtos primários (agrícolas e minerais, em especial da China). A desaceleração do crescimento do mercado dos EUA não deverá afetar significativamente as exportações brasileiras, constituídas em sua maioria de produtos industrializados. A demanda por produtos brasileiros na América do Sul, em especial no Mercosul, deverá manter-se elevada e permitirá a manutenção do saldo positivo. Se levarmos em conta esse quadro mais amplo, o superávit comercial continuará a reduzir-se, como ocorreu em 2007 (cerca de US$ 5 bilhões abaixo do resultado de 2006). Em 2008 veremos o superávit reduzir-se ainda mais, podendo situar-se abaixo de US$ 35 bilhões.

A forte crise financeira do setor imobiliário, que está afetando a economia dos EUA, deverá ter um impacto negativo no crescimento global. Os EUA crescerão cerca de 2%. Europa e Japão também sofrerão as conseqüências da desaceleração da economia norte-americana. Caso os EUA entrem em recessão, o impacto na economia global será muito forte e o Brasil não será uma exceção. A China, contudo, deverá manter suas altas taxas de crescimento e sua posição de um dos principais mercados importadores mundiais.

A redução do saldo na balança comercial terá efeito sobre o saldo das transações correntes, que, de superavitário, provavelmente será negativo, em razão da ampliação das remessas de lucros, dividendos e maiores importações.

A política cambial deverá ser mantida e o real, que se valorizou quase 20% em 2007 (e 55% em relação ao pico de 3,99 em 10/10/2002), continuará volátil, mas tenderá a se estabilizar em torno de 1,80/1,90.

O Banco Central vai continuar a comprar dólares, mas a acumulação das reservas internacionais, que fecham o ano com cerca de US$ 180 bilhões, deverá continuar em ritmo mais lento, podendo alcançar um montante acima de US$ 200 bilhões. O Brasil, em 2007, voltou a ter necessidade de captar recursos externos, pela primeira vez desde 2001.

A remessa de brasileiros no exterior, que representou US$ 7,7 bilhões em 2006, deverá reduzir-se em 2007 e nos anos seguintes, como reflexo da desaceleração da economia dos EUA.

Refletindo o bom momento da economia brasileira, o investimento externo deverá manter-se em nível elevado, abaixo, contudo, dos US$ 33 bilhões alcançados em 2007, o que colocou o Brasil no segundo lugar entre os emergentes.

A internacionalização das empresas brasileiras continuará seu curso, com crescente participação no mercado internacional, sobretudo no dos EUA e da América do Sul. O nível recorde de investimento brasileiro no exterior, que atingiu US$ 28 bilhões, deverá reduzir-se significativamente, ficando, porém, acima dos montantes históricos.

O risco país continuará a oscilar, devendo situar-se em 2008 abaixo dos cerca de 215 pontos no final de 2007, dependendo da situação internacional.

Caso continue o círculo virtuoso da economia interna, 2008, para muitos, será o ano em que o Brasil conseguirá o investment grade, o que significará captação de recursos externos sobretudo de fundos internacionais e de financiamentos mais baratos.

Enquanto isso, na negociação comercial externa, como resultado de uma política equivocada, o Brasil continuará, em 2008, sem perspectivas de juntar-se, por acordos bilaterais de livre-comércio, aos países que aproveitam esses instrumentos para expandir seu intercâmbio comercial e abrir mercados para seus produtos. Com o fracasso da Rodada Doha e sem possibilidade de sua retomada antes de 2009, depois das eleições nos EUA haverá pressão para que a atual estratégia de negociação comercial seja revista.

Em resumo, a exemplo do ocorrido em 2007, no próximo ano a inserção externa brasileira continuará a aprofundar-se. A percepção externa sobre o comportamento da economia e do setor externo permanecerá positiva, na medida em que a desaceleração da economia americana não afete significativamente o cenário global. O aspecto mais controvertido seguirá sendo a política comercial externa conduzida pelo Itamaraty.

Rubens Barbosa, consultor de negócios, é presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp

Links Patrocinados