Título: 'Não sobrou muito espaço para a Selic cair, dado o novo cenário mundial'
Autor: Rocha Filho, Milton F. da
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/12/2007, Economia, p. B3

Marcio Cypriano: presidente do Banco Bradesco Executivo também avalia que o Brasil poderia crescer acima de 5% em 2008 se não houvesse a crise financeira global

O presidente do Bradesco, Marcio Cypriano, avalia que a economia brasileira pode crescer ao redor de 5% em 2008. Para ele, essa taxa poderia ser maior se não tivesse estourado a crise financeira global decorrente dos problemas no mercado imobiliário americano. Ainda assim, o executivo acredita que os juros no País continuarão caindo, mas com mais moderação. ¿A Selic caiu rápido em 2007 e acho que não sobrou muito espaço¿, disse ele, nesta entrevista ao Estado.

Como o sr. avalia a economia brasileira neste ano? O crescimento o surpreendeu?

Foi um ano positivo. O crescimento de 2007 tem origem na perseverança. É resultado de anos de esforço na construção de uma base consistente de política econômica, conhecida, previsível e confiável. Para pessoas ou empresas, isso dá condições de planejar e programar orçamentos e investimentos. Mantida a responsabilidade monetária e fiscal, há confiança de que o crescimento em 2007 marcou apenas o começo de um ciclo.

Em 2008 o crescimento pode ser maior?

Deve manter a tendência de 2007, ao redor dos 5%. Talvez pudesse ser mais, só que a crise financeira global iniciada com o subprime nos Estados Unidos trouxe uma série de dúvidas. É a primeira crise internacional séria, depois de muitos anos de bonança. Em resposta, os governos e bancos centrais de países desenvolvidos se articularam para criar um modelo de enfrentamento de problemas financeiros de efeito dominó. Isso criou antídotos que estão sendo novamente tentados, fornecendo liquidez aos mercados. Meu cenário razoável, no curto prazo, é de um mundo que vai resolvendo seus problemas gradualmente, enquanto nós, no Brasil, poderemos continuar tocando nossa vida com alguma tranqüilidade, mantendo o foco no que é preciso para manter esse País em crescimento e desenvolver o mercado interno. Mas é preciso estar consciente de que o mundo mudou, está mais volátil e o risco passou a ter um peso maior.

O sr. acredita que o grau de investimento venha, mesmo com a decisão do Senado em cortar a CPMF?

Acredito e a decisão sobre a CPMF deve ser encarada com normalidade. A reação do governo vem sendo madura, o que demonstra que o País tem regras democráticas estáveis. É preciso seguir em frente e aguardar as propostas que vão surgir. Mas o principal é que o governo já sinalizou que não haverá aumento de impostos.

O câmbio poderá interferir no resultado da balança comercial em 2008, para baixo?

Talvez o crescimento do mercado interno tenha influência até maior que a taxa de câmbio no resultado da balança comercial em 2008. Com o real valorizado ou desvalorizado, tivemos seguidos recordes anuais. Foi um período favorável para as empresas se ajustarem e se modernizarem com o objetivo de competir no mercado externo. Aqueles que avançaram em ganhos de produtividade serão pouco afetados.

Os juros podem continuar a cair em 2008?

Devem continuar caindo, de forma pausada e com moderação. A Selic caiu rápido em 2007 e acho que não sobrou muito espaço, dado o novo cenário. Entendo que o Copom será mais seletivo por causa da situação global e o crescimento da demanda interna.

A inflação no Brasil ainda o assusta ou o sr. acha que não voltará?

Entendo que a inflação assusta toda vez que nos lembramos dela. Isso vale para mim, para a dona de casa e os trabalhadores. Da mesma forma que essa preocupação deveria estar presente na cabeça dos economistas e políticos do governo e da oposição. Não acredito que alguém seja leniente com a inflação depois de tudo que passamos. Por isso, não vejo a inflação como ameaça imediata.

Grandes bancos estrangeiros ainda podem fazer investidas no Brasil? Isso o preocupa como líder no ranking de bancos privados?

Isso está fora da agenda de preocupação dos bancos. O Brasil é uma economia aberta, que respeita as regras de livre mercado e cada vez se globaliza mais. Não teria sentido o Bradesco, como líder do mercado bancário brasileiro, não considerar positivo que bancos de capital estrangeiro passem a disputar o mercado conosco. Com regras justas e transparentes de competição, não há o que temer. Aliás, a chegada dos bancos estrangeiros foi benéfica ao Bradesco. O principal efeito, para nós, foi crescer a rentabilidade e aperfeiçoar os modelos administrativos e de governança. Para se ter uma idéia, o lucro do Bradesco cresce há 14 trimestres consecutivos.

O crédito em 2008 poderá surpreender? A inadimplência não assusta?

O crédito seguirá em crescimento, seguindo a tendência. Entre dezembro de 2003 e outubro de 2007, a participação em relação ao PIB passou de 24% para 34%. Um desempenho formidável. Isso é fruto da redução gradual do juro, da recuperação da renda e do emprego, do ambiente de mais confiança no futuro. Outros fatores devem ser destacados, como o efeito positivo da inclusão bancária, que agregou novos clientes ao sistema e a reforma da lei de falências, além dos avanços institucionais no financiamento imobiliário.

Quem é: Márcio Cypriano

É presidente do Bradesco, o maior banco privado do Brasil, desde 1999. Entre março de 2004 e abril de 2007, ocupou a presidência da Federação Brasileira de Bancos.

É formado em Direito pela Universidade Mackenzie.

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