Título: Governo diz que aceitaria novas eleições no Quênia
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Fonte: O Estado de São Paulo, 05/01/2008, Internacional, p. A14

Mas presidente Kibaki afirma que elas teriam de ser ordenadas pelo Supremo, composto por seus aliados

Ap e Reuters

O presidente do Quênia, Mwai Kibaki, disse ontem que aceitará o pedido da oposição para a realização de uma nova eleição presidencial somente se ela for ordenada por um tribunal. ¿Aceitaremos uma outra eleição desde que a Constituição seja seguida. Se um tribunal decidir, nós aceitaremos¿, disse o porta-voz presidencial, Alfred Mutua.

A Suprema Corte do Quênia pode anular a eleição se considerá-la irregular, levando a uma nova votação. Mas a maioria de seus membros foi apontada por Kibaki. O Quênia enfrenta uma crise política e distúrbios étnicos desde sábado, após o anúncio de que o presidente Kibaki foi reeleito. A oposição acusou Kibaki de fraudar as eleições do dia 27, desatando uma onda de violência que deixou mais de 300 mortos e levou cerca de 100 mil pessoas a deixar suas casas.

Uma agência da ONU alertou ontem que esses 100 mil quenianos deslocados estão ameaçados pela fome e o Comitê Internacional da Cruz Vermelha pediu US$ 13,5 milhões para comprar comida e gêneros de primeira necessidade suficientes para um mês de ajuda aos desabrigados.

O arcebispo sul-africano e Prêmio Nobel da Paz de 1984, Desmond Tutu, que está no Quênia tentando mediar uma solução para a crise, disse ontem que o presidente Kibaki mostrou-se aberto à idéia de formar uma coalizão para acabar com o conflito, mas somente quando a oposição aceitar a autoridade de seu governo. Segundo Tutu, há esperança de pôr fim à crise, pois os dois lados estão agora abertos a negociações, apesar de imporem condições.

Enviada por Washington, a subsecretária de Estado para Assuntos Africanos, Jendayi Frazer, chegou ontem a Nairóbi para reunir-se com Kibaki e o líder opositor Raila Odinga - do Partido Democrático Laranja (ODM) - e convencê-los a dialogar.

A polícia cercou ontem o Parque Uhuru, em Nairóbi, onde deveria ocorrer uma grande manifestação convocada pela oposição. Mas os líderes opositores acabaram cancelarando, pelo segundo dia seguido, o protesto que pretendiam fazer contra os resultados eleitorais.

As ruas da capital amanheceram calmas ontem, uma mudança em relação à tensão vivida nos últimos dias. Mesmo se o protesto não tivesse sido cancelado, estima-se que teria baixa participação. Os manifestantes, exaustos após horas de confrontos com a polícia na quinta-feira, não foram ontem ao centro da capital. ¿Estamos cansados, não iremos à manifestação¿, disse Samuel Muhati, morador da favela de Mathare. ¿Vamos parar os confrontos.¿

Fred Nguli, de 24 anos, disse que estava muito fraco e faminto para marchar. ¿Se essas manifestações continuarem vamos sofrer, pois somos todos trabalhadores temporários¿, disse Nguli. ¿Precisamos comer para ter energia para trabalhar ou mesmo protestar.¿

Na cidade portuária de Mombasa, a polícia lançou bombas de gás lacrimogêneo contra cerca de mil muçulmanos que protestavam contra o governo. A escassez de alimentos em Mombasa fez os preços dispararem e os moradores reclamam que também não há querosene para os lampiões.

O Banco Mundial alertou que a violência pode prejudicar os grandes avanços econômicos do Quênia e afetar também os países vizinhos. Os distúrbios provocaram o atraso na entrega de combustível para Uganda, Burundi e Ruanda. O governo ruandês já iniciou um racionamento.