Título: Desacato à Comissão de Ética
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/01/2008, Notas e Informações, p. A3
Ao se recusar a obedecer a decisão da Comissão de Ética Pública, que há um mês condenou a acumulação do cargo no primeiro escalão do governo com a presidência do PDT, o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, deixou o presidente Lula diante de um impasse. Se fizer vista grossa às pretensões do ministro, aceitando que continue ocupando um cargo partidário, Lula desmoralizará a Comissão. E, se quiser preservá-la, a fim de que possa continuar exercendo seu papel, Lula terá de demitir Lupi.
O ministro justifica a pretensão de permanecer nos dois cargos com um parecer do advogado-geral da União, José Antonio Tofolli, no qual ele afirma que, ¿sem adentrar no campo deontológico¿, não vê irregularidade no acúmulo de funções por Lupi. Para os integrantes da Comissão de Ética Pública, contudo, a questão é moral e não jurídica, envolvendo um servidor que teima em desrespeitar o Código de Conduta da Alta Administração Federal, cujo artigo 3º classifica como ¿conflito de interesse¿ o exercício simultâneo de cargo público e de direção de partido. Entendimento partilhado por membros da própria AGU, como o consultor-geral substituto da União, João Francisco Drummond, que emitiu parecer contrário, dando razão à Comissão de Ética Pública.
Essa é a primeira vez, desde sua criação, em maio de 1999, que a Comissão é desrespeitada. Mesmo no governo Lula, suas decisões sempre foram acatadas sem discussão. Há alguns anos, quando foi chamado para substituir o deputado Ricardo Berzoini na presidência do PT, o assessor para assuntos internacionais da Presidência da República, Marco Aurélio Garcia, consultou a Comissão, que lhe recomendou o licenciamento do cargo no governo. Ele aceitou a recomendação e só retornou ao Palácio do Planalto após deixar a direção do partido. O mesmo ocorreu com o ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, presidente do PR. Após consultar a Comissão, ele passou o cargo para um correligionário para ficar no Ministério.
Em sua defesa, o ministro Carlos Lupi se declara ¿vítima de pressões¿ e se compara ao fundador do PDT, o ex-governador Leonel Brizola, para justificar-se. ¿Era mais fácil fingir que não estou na direção do partido, mas não sou hipócrita. Brizola dizia ser como uma plantinha no deserto que sobrevive com uma gota de orvalho. Eu sou cana de canavieira, nem queimada nem facão arrancam a minha raiz. Nasço na sombra ou no sol¿, disse ele ao jornal O Globo.
Mas o comportamento de Lupi como ministro mostra por que a Comissão de Ética não admite a acumulação. Assim que entrou para o governo, ele deixou claro que favoreceria a Força Sindical, vinculada ao PDT, em detrimento da CUT, que é ligada ao PT. Em seguida, justificou a nomeação de correligionários para cargos de confiança nas Delegacias Regionais do Trabalho alegando que essa ¿não é uma prática nova¿. E, agora, está sendo acusado por líderes dos frentistas fluminenses de violar o princípio constitucional da unicidade sindical, autorizando o registro do Sindicato dos Empregados em Postos de Serviços de Combustíveis e Derivados de Petróleo do Rio de Janeiro, com o objetivo de favorecer a expansão da Força Sindical.
Segundo recente reportagem publicada pelo Correio Braziliense, Lupi teria ignorado uma liminar concedida em agosto de 2005 pela 37ª Vara do Trabalho do Rio, que não permitiu à nova entidade negociar o dissídio da categoria em nome dos frentistas do Estado. Ao justificar sua decisão, o ministro invocou uma decisão judicial de 2004 que permitiu o desmembramento da Federação Nacional dos Trabalhadores no Comércio de Minérios e Derivados de Petróleo, controlada pela CUT. ¿Estão tentando esvaziar uma central para encher o papo da outra¿, reagiu o presidente da Federação, Raimundo Miquilino, acusando Lupi de mobilizar técnicos do Ministério do Trabalho para dar pareceres favoráveis à criação de entidades ligadas à Força Sindical.
Os membros da Comissão de Ética Pública dizem que renunciarão, caso o ministro do Trabalho não seja demitido. Cabe a Lula optar entre suas conveniências políticas e os interesses maiores do País.
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