Título: Dois rádios digitais: um ótimo e outro ruim
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/02/2008, Economia, p. B8

Vivi duas experiências interessantes sobre rádio digital, em viagem recente aos Estados Unidos: uma ótima e outra ruim. Comecemos pela boa experiência. É provável que o leitor tenha conhecimento dos serviços de rádio digital por assinatura via satélite. Há duas empresas que exploram esses serviços e operam nos Estados Unidos, desde 2003. A primeira é XM, com 170 canais, programação totalmente diversificada, com música pop, jazz, clássico, ópera, notícias, esportes, serviços e outros. A segunda é a Sirius, com 193 canais.

Meu primeiro contato com o rádio digital via satélite ocorreu há dois anos, numa viagem de carro, na Califórnia. Há duas semanas repeti a experiência, comprovando a evolução dos serviços, com canais regionais exclusivos para orientação dos viajantes, informações sobre a situação das estradas, sobre eventuais acidentes, localização de postos de gasolina, restaurantes e hotéis.

Os serviços da XM e Sirius passaram a ser rentáveis no ano passado, especialmente depois que a indústria automobilística decidiu apoiar o projeto, incorporando o receptor de rádio via satélite aos carros novos de melhor padrão. Ambas operadoras cobram uma mensalidade de US$ 12,95, sem qualquer limitação de uso.

No pequeno receptor acoplado ao rádio do carro, são mostradas informações sobre a música, autor e intérprete. A qualidade de som equivale à dos melhores CDs. Nenhuma interferência, tudo límpido, para satisfazer até o ouvinte mais exigente de música clássica.

Para alcançar massa crítica e reduzir custos, XM e Sirius decidiram fundir-se e aguardam a aprovação do negócio pela Comissão Federal de Comunicações (FCC, na sigla em inglês).

O RÁDIO ABERTO

Muito menos positiva foi minha experiência com o rádio digital das emissoras abertas, em AM e FM, com o uso do padrão In Band on Channel (Iboc) ou HD Radio, criado pela empresa Ibiquity. Nesse padrão, o mesmo programa é transmitido simultaneamente, no mesmo canal, tanto no modo analógico quanto no digital.

O maior problema do padrão Iboc é a sua falta de estabilidade ou homogeneidade. Ironicamente, alguns radiodifusores dizem que ¿ele é ótimo, quando funciona¿. Ouvindo algumas emissoras americanas, pude comprovar que o melhor resultado ocorre nas cidades pequenas, em regiões planas e sem grandes obstáculos. No entanto, várias emissoras de AM desligam o sistema digital à noite para evitar interferências.

Em FM, ocorre, entre outros, o problema do atraso (delay) de 8 segundos do sinal digital, em relação ao analógico. Como o alcance do sinal digital é menor do que o analógico, nos limites de sua propagação, a sintonia oscila entre um e outro, com grande desconforto para o ouvinte.

É bom lembrar que, das quase 15 mil emissoras de rádio dos Estados Unidos, apenas 10% aderiram ao sistema híbrido Iboc, quase 6 anos após sua introdução naquele país. Muito menor ainda é a proporção de usuários que decidiram adquirir um receptor digital, cujo menor preço oscila entre US$ 130 e US$ 150.

NO MUNDO

A introdução do rádio digital tem sido um desafio em todo o mundo. Para que a tecnologia pudesse produzir o melhor resultado seria necessário criar uma faixa de freqüência exclusiva para as transmissões digitais. Essa estratégia exigiria a troca de todos os receptores analógicos por digitais.

A idéia de usar o mesmo canal para transmissões analógicas e digitais, adotada pela empresa Ibiquity, parecia ser, em princípio, a grande saída. Mas essa tecnologia ainda não está madura e apresenta os problemas descritos aqui. Na Europa, são propostas novas faixas de freqüência exclusivas para o rádio digital, o que, no entanto, obriga à troca geral dos receptores. Conclusão: ainda temos de esperar uma solução melhor que as disponíveis no mundo atual.

JUSTIÇA

Para finalizar, uma notícia que diz respeito a esta coluna. A Justiça Federal rejeitou pelo mérito a ação movida pelo ministro das Comunicações, Hélio Costa, contra este colunista. Por sentir-se ofendido com as críticas feitas em artigo aqui publicado, na edição de 4 de fevereiro do ano passado, especialmente quanto ao processo de escolha do padrão de TV digital, o ministro ingressou com queixa-crime na Justiça Federal. E o fez mesmo depois de utilizar espaço equivalente, de meia página, cedido pelo Estado, para sua resposta, na edição do domingo seguinte (11/2/2007). Ao julgar o mérito da ação, a juíza Janaína Rodrigues Valle Gomes, da 5ª Vara Federal Criminal de São Paulo, acaba de rejeitá-la por falta de justa causa.

Em sua sentença, a juíza recorda que, conforme a lei, ¿não constituem abusos de liberdade de expressão a crítica a atos do Poder Executivo e seus agentes, bem como a crítica inspirada pelo interesse público¿, e que, na referida coluna, ¿não se intentou ofender a dignidade¿ ou o decoro da autoridade, ¿mas desqualificar sua gestão e atuação como ministro de Estado, tendo o artigo ressaltado expressamente que a vida pessoal do cidadão Hélio Costa não interessava¿. Da sentença ainda cabe recurso.

Links Patrocinados