Título: Brasileiro veterano do Iraque é um dos símbolos de trauma pós-guerra
Autor: Mello, Patrícia Campos
Fonte: O Estado de São Paulo, 18/01/2008, Internacional, p. A12
Após seis meses no front, soldado Lucas Borges é preso por matar uma jovem e ferir outros 4 ao dirigir drogado
Quatro anos depois de mudar-se de Catalão (GO) para os EUA, o brasileiro Lucas Theodoro Borges, então com 18 anos, tornou-se um marine americano. Logo no início da guerra do Iraque, ele foi enviado ao país para lutar durante seis meses. Quando voltou, foi trabalhar nas oficinas de manutenção no Campo Lejeune, na Carolina do Norte, onde acabou se tornando viciado em éter. A substância é usada para auxiliar na ignição de motores durante o inverno.
Hoje, aos 25 anos, Borges está detido no presídio de Polkton, também na Carolina do Norte, onde pode ficar pelos próximos 32 anos. Ele foi condenado por homicídio em segundo grau, após, sob efeito de éter, entrar na contra-mão de uma rodovia e causar um acidente que matou Jamie Marie Lumsden, uma americana de 19 anos. Outras quatro pessoas ficaram feridas no acidente.
Os motivos que levaram o veterano de guerra brasileiro a acabar numa prisão americana foram tema de uma reportagem do New York Times publicada no domingo. O caso de Borges é um entre os 121 levantados pelo jornal, que envolvem militares que cometeram ou são acusados de assassinato, após a volta de campos de batalhas no Iraque e Afeganistão.
O jornal analisou os crimes envolvendo militares seis anos antes e seis anos depois da invasão americana ao Afeganistão, em 2001. A conclusão é que houve um aumento de 89% entre um período e outro.
Assim como Borges, muitos militares que sofrem com traumas psicológicos pós-guerra acabam somando a tais sintomas problemas como abuso de álcool e drogas.
Três quartos dos veteranos analisados pelo jornal continuavam no Exército quando cometeram os crimes. No caso do brasileiro, acredita-se que houve conivência do Corpo de Marines. Os parentes das vítimas do acidente estão processando o governo, sob alegação de que os militares ¿tinham a responsabilidade de tomar medidas para impedir que Borges ferisse outras pessoas¿.
O Estado visitou a casa da família de Borges em Gaithersburg, um cidade de 57 mil habitantes em Maryland. A mãe do militar, Dina, é proprietária de uma lavanderia no local. Em entrevista ao New York Times, Dina contou que o filho voltou diferente, ¿como se estivesse fora de si¿.
Borges já tinha um histórico de uso de maconha, como ele mesmo informou ao alistar-se. Mas inalar éter foi um vício posterior, para aliviar os traumas trazidos da guerra, de acordo com a irmã de Borges, Gabriela, de 20 anos, que estuda na Universidade George Washington.
Os marines, cientes do histórico de drogas do brasileiro, também sabiam que ele havia se tornado dependente de éter, mas nunca o retiraram função, na qual ele tinha acesso à substância. Eles também nunca propuseram a Borges que participasse de um programa para recuperação de dependentes químicos, conforme afirmou seu advogado, Bruce Cunningham, durante o julgamento.
Quatro meses após voltar do Iraque, Borges foi pego inalando éter em seu carro. Após encontrarem diversos recipientes do produto no veículo, os militares enviaram o brasileiro, que ameaçou cometer suicídio, para a ala psiquiátrica do hospital da base militar.
¿Ele finalmente estava sob os cuidados de psiquiatras, mas eles (os militares) o tiraram de lá porque era um problema que eles queriam se livrar¿, afirmou Jeffrey Weber, advogado que representou as vítimas de Borges durante o julgamento. ¿Eles o liberaram, lhe entregaram as chaves do carro e seu supervisor lhe disse: `Se você não for cuidadoso, vai acabar matando alguém¿¿, afirmou Weber.
Quando Borges recuperou o veículo, viu que os recipientes de éter continuavam lá e começou a se drogar. Os fuzileiros alegaram que não havia outro lugar para guardar o material. Em seguida, o brasileiro entrou na contra-mão de uma estrada, batendo de frente com o veículo em que Jamie estava. COM NYT
NÚMEROS
US$ 3,5 bilhões é a quantia investida no centro de atendimento aos veteranos desde 2004
50 mil é o número de soldados que precisaram de reabilitação
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