Título: Tráfico usa fazendas de soja no Paraguai
Autor: Auler, Marcelo
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/02/2008, Metrópole, p. C4

Programa tocado por militares erradicou 1.500 hectares em 2007

Marcelo Auler

Maior produtor de maconha na América Latina, o Paraguai promete cortar o mal pela raiz. ¿Queremos atingir o bolso dos traficantes, causar prejuízo cortando a produção deles¿, diz o tenente da Marinha Oscar Chamorro, comandante do Grupamento de Operações Especiais da Secretaria Nacional Antidrogas (Senad). Em janeiro, o grupo passou oito dias derrubando plantações de marijuana na região de Pedro Juan Caballero - o Estado acompanhou uma dessas operações, no dia 31.

As estimativas são de que, no Paraguai, 6 mil hectares de terra são utilizados no plantio da maconha. Cada hectare, segundo cálculos oficiais, produz 3 toneladas por ano, o que significa um total de 12 mil toneladas. Cerca de 80% da produção tem destino certo: o Brasil.

O programa de erradicação do plantio de maconha começou em 1994, com a ajuda da Polícia Federal brasileira. Na Operação Aliança, o Brasil entrava com mão-de-obra especializada na localização dos plantios, helicópteros e combustível. Pagava até a diária dos paraguaios que cortavam arbustos, muitas vezes com verbas dos Estados Unidos. O convênio durou até 2004, quando um helicóptero brasileiro caiu, causando a morte de um agente federal.

Desde então, a Senad está à frente do trabalho. Não é algo fácil. As plantações são feitas em lugares ermos, normalmente no meio de fazendas de soja, em áreas consideradas imprestáveis para a cultura e mantidas como reservas florestais, atendendo às exigências legais. Os traficantes muitas vezes infiltram trabalhadores rurais em fazendas alheias, para plantar maconha sem o conhecimento do proprietário no meio de enormes áreas cultivadas, nem sempre visíveis. Por isso, a primeira dificuldade é localizar essas plantações. Quando não há denúncia, o trabalho é feito por meio de sobrevôos.

Depois, há a dificuldade de se identificar o caminho por terra até as áreas de cultivo, tarefa facilitada pelo GPS. Mas não há aparelho eletrônico que ajude na hora de achar a picada na floresta que leva à plantação. O que vale é a experiência dos homens encarregados da missão.

Raramente os militares da Senad encontram resistência. Tampouco interessa a eles prender os camponeses que passam até seis meses acampados no mato cuidando do cultivo e evitando que outros traficantes roubem a droga. Por isso, ao entrar numa área de reserva, os militares dão tiros, anunciando a presença. Na operação acompanhada pelo Estado, a equipe achou 20 hectares de maconha plantada - os militares conseguiram destruir um terço disso no dia 31. O acampamento abandonado foi queimado.

¿Quem entra no mato para cuidar da plantação ganha 50 mil guaranis por dia (o equivalente a R$ 20)¿, diz o ex-governador da Província de Amambay Roberto Acevedo. Isso corresponde a 1,5 milhão de guaranis ao mês, mais do que o salário mínimo - 1,3 milhão de guaranis. A maior parte dos agricultores não recebe salário mínimo. Ganha 800 mil guaranis.¿

Para Acevedo, não será com operações de erradicação de cultivo que se resolverá a questão. ¿O problema é social, de pouco apoio à agricultura, corrupção, envolvimento de políticos e de falta de funcionamento da Justiça. O Paraguai tem a maior produção de marijuana do mundo. Se marijuana fosse boa, Capitán Bado (cidade que mais produz maconha) seria a Nova York do Paraguai.¿

Chamorro discorda. ¿Em 2007 tivemos mais de 1.500 hectares destruídos. Dez hectares, que correspondem a 30 toneladas de maconha, podem ser exterminados num dia por uma equipe. Com o corte do plantio e as apreensões nas cidades, atingimos mais de 50% da produção.¿

Quem também aplaude o programa é o juiz federal Odilon Rodrigues, que, quando estava em Ponta Porã (MS), condenou diversos traficantes foragidos no Paraguai. Acabou sendo jurado de morte e hoje está lotado em Campo Grande. ¿Não sei se houve redução de 50%, mas a Aliança não afetou só a produção. Fez com que os traficantes se associassem para dividir prejuízos.¿

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