Título: Comando da GM usa a experiência brasileira para tirar a empresa da crise
Autor: Silva, Cleide
Fonte: O Estado de São Paulo, 09/02/2008, Negócios, p. B10

Ray Young, Fritz Henderson e Rick Wagoner, ex-presidentes da GM no País, preparam o plano para os próximos anos

Cleide Silva

No bunker da companhia, em um suntuoso prédio na esvaziada cidade industrial de Detroit, Ray Young tem passado os dias debruçado sobre os números que vão revelar a atual situação da General Motors. O balanço financeiro será divulgado na terça-feira e mostrará uma empresa ainda ferida por elevados prejuízos, mas em reabilitação após rigoroso programa de reestruturação.

Mais do que o resultado de 2007, o chinês/canadense Young, empossado em novembro como vice-presidente de finanças global da ainda maior montadora do mundo em vendas, tem o desafio de preparar o plano de negócios para o período 2008-2012. Ele assumiu o cargo após presidir a filial brasileira por quatro anos.

Ciente das dificuldades da marca nos EUA, aprofundadas pela ameaça de recessão no país, o foco da GM é continuar crescendo fora de casa. Hoje, só 41% dos carros da marca são vendidos na América do Norte.

¿Temos planos agressivos para investimentos nos países emergentes, incluindo o Brasil. Ao mesmo tempo, precisamos continuar a reduzir nosso custo estrutural, principalmente na América do Norte, para níveis mais competitivos¿, diz Young.

No programa destinado ao Brasil, Young terá de decidir sobre um aporte extra de US$ 500 milhões, que ele mesmo havia solicitado à matriz em sua gestão à frente da filial.

Young é o segundo executivo mais importante na hierarquia do grupo na área financeira. O primeiro é Fritz Henderson, que presidiu a filial brasileira de 1997 a 2000. Acima deles está o presidente mundial Rick Wagoner, que dirigiu a GM do Brasil entre 1991 e 1992. Nos anos 80, ele já havia trabalhado no País como tesoureiro e vice-presidente de finanças.

Os três garantem que a experiência no País tem ajudado a lidar com a crise na matriz. Em 2005 e 2006, a empresa teve um prejuízo acumulado de US$ 12,6 bilhões. Entre janeiro e setembro de 2007, as perdas chegavam a US$ 38 bilhões, mas o valor inclui uma grande baixa contábil assumida no terceiro trimestre. Segundo a GM, sem esse item o resultado é melhor que nos dois anos anteriores.

¿Quando cheguei ao Brasil, em 1982, a situação da empresa e do País era muito difícil. Aprendi que, se você faz o trabalho certo, focando nos temas mais importantes, é possível mudar uma situação. Essa foi uma aula muito importante que levei em toda minha carreira e que serve bem para os momentos atuais¿, diz Wagoner.

Nos anos 80 o País abrigava quatro montadoras de automóveis, mas Wagoner lembra que a competição era forte. O governo sempre mudava as regras do jogo e a inflação era alta, ambiente que exigia muito dos executivos. Ele diz que isso o ajudou a reagir com rapidez às mudanças bruscas.

O executivo saiu do Brasil em 1987 e voltou em 1991 como presidente. ¿Era um período de inflação alta e política monetária restritiva¿, lembra o economista da LCA Consultores, Francisco Pessoa Faria. Em 1992, enquanto lidava com a abertura às importações e o fracasso do Plano Collor, Wagoner foi chamado para a diretoria-financeira na matriz, que estava à beira da falência.

Ele ajudou a criar um plano de recuperação que estancou as perdas naquele período. O sucesso das medidas o levou à presidência-executiva em 2000. Em 2003, assumiu também a presidência do conselho. Logo depois, a companhia voltou a ser assombrada por mais uma grave crise.

MAIOR DESAFIO

Fritz Henderson, que chegou ao País em 1997, também enfrentou um período conturbado, embora por outros motivos. Naquele ano, o mercado bateu recorde de vendas, com 1,94 milhão de veículos, mas depois seguiram-se anos de quedas acentuadas, junto com as crises na Ásia, Rússia e a desvalorização do real.

Quando perguntado sobre qual a principal experiência brasileira que o ajuda no plano que tenta salvar a GM americana, Henderson responde rápido: ¿A crise.¿ Segundo ele, os anos de 98 e 99 foram muito difíceis. ¿Aprendemos que, em momentos como esses, é preciso ouvir o mercado e tomar decisões rápidas.¿

A passagem pelo Brasil ¿foi o maior desafio da minha carreira¿, diz Henderson. Depois ele comandou as operações da América Latina, África e Oriente Médio, Ásia e Europa, até ser chamado para a área de finanças nos EUA.

Já Young encontrou boa fase na economia brasileira. No seu primeiro ano no País, a GM foi líder de vendas pela primeira e única vez. A companhia, porém, amargava oito anos de prejuízos, quadro revertido em 2006.

¿Executamos plano de otimização que permitiu à GM do Brasil reduzir custos operacionais de forma significativa¿, diz Young. Quando o mercado ficou mais forte, a GM se beneficiou por já ter estrutura mais competitiva.

¿Esperamos fazer o mesmo na América do Norte, trazendo a estrutura de custos a um nível mais competitivo.¿ Outra colaboração que Young quer dar, também levada do Brasil, é a motivação dos trabalhadores. ¿Tenho a impressão de que aqui as pessoas perderam a paixão.¿

Quando os três executivos se reúnem, principalmente em encontros sociais, costumam falar em português. O trio gosta de manter essa afinidade com o Brasil e aproveita para treinar o idioma.

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