Título: O recorde da arrecadação
Autor: Oliveira, Ribamar
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/01/2008, Economia, p. B3
O crescimento da arrecadação tributária do Tesouro Nacional em 2007 foi recorde. As receitas subiram R$ 45,28 bilhões em relação a 2006, em termos reais (descontada a inflação, medida pelo IPCA). Esse valor é bruto, ou seja, antes das transferências constitucionais a Estados e municípios e antes das restituições. Ele não inclui também a arrecadação do INSS. O montante é superior à arrecadação obtida com a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), que ficou em R$ 37,23 bilhões. Dito de outra forma: as receitas do Tesouro com contribuições, taxas e impostos subiram em 2007 mais do que uma CPMF.
O mais impressionante é que esse crescimento ocorreu sem aumento das alíquotas ou da base de cálculo dos tributos. Apenas a alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) que incide sobre fumo subiu 30%. A Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRFB) diz que a elevação foi feita para ¿restabelecer a relação do imposto sobre o preço do produto¿. As alíquotas de todos os demais tributos não foram majoradas.
A expansão das receitas resultou do crescimento econômico - que pode ter ficado em 5,3% em 2007 - e do aperto do ¿leão¿, feito na forma de combate à sonegação e à evasão fiscal, da intensificação dos controles sobre declarações e da recuperação de débitos - o que reduziu a diferença entre a carga tributária nominal e a carga efetiva.
Em outras palavras: mais pessoas e empresas passaram a cumprir com suas obrigações tributárias. Todos sabem que o nível de sonegação fiscal no Brasil é elevado. Alguns especialistas acreditam que ele é superior a 20% do total arrecadado. Assim, a receita do Tesouro pode crescer apenas com o aumento do número de contribuintes que pagam os seus impostos, da forma como manda a lei. Essa foi uma das razões para o aumento da arrecadação em 2007.
A SRFB informa que essa ¿maior presença fiscal por parte da administração tributária¿ ocorreu, em parte, pelo aumento da fiscalização. O número de pessoas físicas e jurídicas fiscalizadas cresceu 80% no ano passado, em relação ao ano anterior. O crédito tributário lançado aumentou 42%. Houve um acréscimo de 21% na apreensão de mercadorias e de 50% nas ações fiscais ligadas à área aduaneira. A arrecadação proveniente de multa e juros subiu 30,7%. E registrou-se um crescimento de 46% na arrecadação relativa aos depósitos judiciais e administrativos.
A maior ¿eficiência¿ da máquina tributária também decorreu, não há dúvida, da unificação entre a Secretaria da Receita Federal e a Secretaria da Receita Previdenciária. A arrecadação do INSS bateu recorde em 2007. Ela atingiu R$ 153,8 bilhões, em termos nominais, contra R$ 133,1 bilhões. Em termos reais (descontada a inflação, medida pelo IPCA), o aumento foi de R$ 16,1 bilhões. Em um único ano.
Esse excelente resultado do INSS resultou do crescimento da massa salarial - acima de 10% no ano passado - e da maior formalização da mão de obra. Segundo o Ministério do Trabalho, a economia criou, no ano passado, mais de 1,6 milhão de empregos com carteira assinada. Esse foi o número de trabalhadores que passou a contribuir para a Previdência Social. A elevação da receita previdenciária é uma boa notícia, pois ajuda a reduzir o déficit da Previdência. Quanto menor é o déficit, menor é a despesa do Tesouro, ou seja, da sociedade como um todo, com a Previdência.
O impacto da expansão da atividade econômica em 2007 e do aumento do lucro das empresas na arrecadação do Tesouro também foi considerável. A economia pode ter crescido mais de 5% no ano passado, com uma grande ampliação do crédito e do mercado de capitais. O valor captado pela abertura de capital de empresas no mercado de ações, mais conhecida pela sigla em inglês IPO ou oferta pública inicial, situou-se em torno de R$ 56 bilhões contra R$ 15 bilhões em 2006 - um crescimento de 273%.
Segundo a SRFB, a tributação sobre essas operações - tanto pelo ingresso de receitas, como pela valorização das ações - foi um dos fatores importantes para o crescimento da arrecadação em 2007. A SRFB informou que houve um ganho adicional de R$ 5,25 bilhões na arrecadação do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) relativo à abertura de capital, em comparação com 2006.
O governo utilizou o excepcional aumento da arrecadação para ampliar os seus gastos. Este foi o problema. A Secretaria do Tesouro Nacional (STN) vai anunciar esta semana o resultado das contas do Tesouro Nacional em 2007. Com certeza, as despesas aumentaram em ritmo superior ao crescimento da economia. É muito provável que a expansão dos gastos tenha superado 10%, em termos reais. O mais grave é que o aumento ocorreu em despesas chamadas ¿obrigatórias¿, ou seja, elas serão permanentes.
O governo teria feito melhor se tivesse usado o aumento da arrecadação para reduzir a carga tributária, com a desoneração dos setores produtivos. O Brasil é um dos poucos países que ainda tributa o investimento. Como não houve essa iniciativa por parte do governo, o Congresso terminou derrubando a CPMF, demonstrando que a sociedade não aceita mais essa excessiva carga tributária. Uma boa alternativa teria sido usar a maior arrecadação para promover a reforma tributária. O governo poderia ter utilizado o espaço fiscal para compensar os Estados e municípios por eventuais perdas de arrecadação