Título: BC mantém juro, mas avisa: pode retomar alta
Autor: Pereira, Renée
Fonte: O Estado de São Paulo, 24/01/2008, Economia, p. B8

Decisão do Copom deixa a Selic em 11,25% ao ano pela 3ª vez seguida

Em meio à turbulência internacional, o Comitê de Política Monetária (Copom) optou por manter a taxa básica de juros (Selic) em 11,25% ao ano, pela terceira vez consecutiva. A decisão, unânime e sem viés, veio de acordo com a expectativa geral do mercado financeiro. Desta vez, a novidade ficou por conta da mudança na redação da nota divulgada tradicionalmente após a reunião, interpretada pelos analistas como um alerta de possível elevação dos juros.

No comunicado, os diretores do Banco Central mantiveram a frase da última reunião onde explicam que optaram pela manutenção dos juros ¿avaliando a conjuntura macroeconômica e o cenário prospectivo para a inflação¿. Eles acrescentaram uma nova sentença: ¿O comitê irá acompanhar o cenário macroeconômico até a próxima reunião para então definir os próximos passos na sua estratégia de política monetária.¿

Rapidamente o texto foi lido como um prenúncio de que o Copom poderá inverter a trajetória de juros a qualquer momento. Essa foi a interpretação do economista-chefe do Banco WestLB do Brasil, Roberto Padovani. Para ele, com a modificação no teor do comunicado, o BC quis dar um recado ao mercado financeiro e aos demais economistas de que está bastante atento às atuais condições macroeconômicas.

¿Todos estavam esperando mais o conteúdo do comunicado do que a própria decisão do Copom. Faz sentido que o comitê dê esse recado, de que está acompanhando o cenário para definir os próximos passos, pois estamos vivendo um momento bastante peculiar no cenário econômico¿, destacou. Para o economista, os diretores do BC quiseram dizer que não estão totalmente convencidos sobre o cenário atual e, eventualmente, podem subir os juros no Brasil. ¿Na verdade, ele não pode se amarrar a uma decisão, mas também não quer subir os juros sem avisar antes que isso pode ocorrer.¿

O ex-ministro da Fazenda, Mailson da Nóbrega, sócio da Tendências Consultoria Integrada, também defende a decisão do comitê porque acredita que o cenário doméstico de inflação está se deteriorando. ¿Ninguém mais aposta em inflação de 4% neste ano. As últimas expectativas das instituições apontavam para 4,4% e devem subir para 4,6% nas próximas sondagens. O pior é que a deterioração também está afetando as expectativas para 2009.¿

Para o economista da consultoria LCA Luís Suzigan, o que tem chateado o BC é a combinação entre inflação e uso da capacidade instalada em níveis elevados. Segundo dados da Confederação Nacional da Indústria (CNI), em novembro, o índice estava em 82,9%. Por causa disso, ele aposta que o BC vai explicitar na ata do Copom, que será divulgada na quinta-feira da próxima semana, a possibilidade de aumentar a taxa de juros, dependendo da evolução dos cenários interno e externo. ¿A decisão e o comunicado de ontem vieram conforme nossas expectativas. Acredito que o BC vai apresentar um tom mais cauteloso na ata.¿

Apesar disso, ele avalia os três fatores (inflação, aquecimento da demanda e cenário externo) que estão incomodando a autoridade monetária devem começar a se diluir a partir de março. ¿E isso pode desarmar um possível avanço da taxa Selic¿, diz Suzigan. Ele não acredita na inversão da trajetória da taxa de juros neste ano. ¿As iniciativas do Fed (Federal Reserve, o banco central americano) devem surtir efeito no mercado e os preços das commodities (alimentos e petróleo) vão começar a aliviar a pressão sobre a inflação corrente.¿ Outro fator, completa o economista, é a maturação dos investimentos, que vai diminuir o uso da capacidade instalada do País.

Para o economista da Modal Asset Management Alexandre Póvoa, a partir de agora, além da definição de direção do cenário externo nos próximos 45 dias, os dados de inflação e atividade no Brasil ganham grande relevância na análise até a próxima reunião do Copom, em março.

Segundo ele, os mais otimistas poderiam interpretar a mudança no comunicado de ontem como uma indicação de uma retomada da queda de juros, sobretudo pelo fato de o mundo desenvolvido estar nessa direção, o que aumenta o nosso diferencial de juros. Ou então, de que o cenário externo complicado deixa, ao menos, todas as opções em aberto.¿Mas acredito que, no atual contexto, se houver mudança, parece claro que será na direção de aperto monetário.¿