Título: Para EUA, 'há limpeza étnica no Quênia'
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Fonte: O Estado de São Paulo, 31/01/2008, Internacional, p. A14

Enviada americana critica dirigentes e ameaça cortar ajuda ao país

Nairóbi - A expulsão de quenianos que está ocorrendo no Vale Rift, no oeste do país, é uma ¿limpeza étnica¿, denunciou ontem Jendayi Frazer, a principal diplomata americana para assuntos africanos. Ela também criticou os políticos locais, afirmando que eles não estão fazendo o suficiente para controlar a violência, e ameaçou cortar parte da ajuda humanitária que os EUA fornecem ao Quênia. Para este ano, a estimativa é de US$ 540 milhões.

A violência teve início após as eleições de 27 de dezembro, nas quais o presidente Mwai Kibaki (da etnia kikuyu) foi reeleito, derrotando Raila Odinga (membro da tribo luo), do partido Movimento Democrático Laranja. A acusação afirma que a votação foi fraudada e desde então vem protestando contra os resultados.

Mais de 800 quenianos foram mortos e 300 mil, obrigados a abandonar suas casas. Se o conflito começou por motivos políticos, os confrontos agora tomaram um caráter étnico, basicamente entre kikuyus - que controlam a política e os negócios desde a independência, em 1963 - contra luos e kalenjins.

Frazer, que visitou o Quênia no início do mês, afirmou que há um intenso ciclo de retaliação. ¿A primeira onda de violência estava fundamentalmente na região do Vale Rift, com os kalenjins expulsando os kikuyus, mas agora está se espalhando e kikuyus estão desalojando os kalenjins e os luos¿, disse. ¿Há um esforço organizado e direcionado para expulsar as pessoas do Vale Rift¿, afirmou a diplomata dos EUA durante uma reunião da União Africana em Adis Abeba, capital da Etiópia.

O Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV) no Quênia fez um alerta ontem afirmando que há um imenso risco de que a situação se deteriore ainda mais. ¿Está ocorrendo uma sucessão de ataques, represálias, e contra-represálias. Pessoas estão sendo mortas em circunstâncias terríveis. Muitos perderam tudo e centenas de milhares estão vivendo em acampamentos precários¿, afirmou Pascal Cuttat, chefe da delegação do CICV em Nairóbi.

O necrotério de Nairóbi recebeu ontem seis corpos - todos carbonizados e com sinais de tortura -, vítimas dos confrontos do dia anterior, quando membros da oposição protestaram contra a morte de Mugabe Ware, um importante senador partido. Eles moravam em favelas da capital e eram das etnias kikuyu e luo.

Na cidade de Kisumu, no Vale Rift, testemunhas contaram que outras duas pessoas - ambos kikuyus - foram morreram queimadas.

A polícia queniana negou que tenha instruído seus agentes para atirar para matar, como havia sido noticiado na manhã de ontem. Na véspera, soldados dispararam de helicópteros militares para controlar os confrontos, mas segundo o Exército foram usadas balas de borracha

DRAMA AFRICANO

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30/12/2007: Número de mortos por violência passa de 100

1/1/2008: Incêndio em igreja lotada de Eldoret, a 300 quilômetros de Nairóbi, deixa cerca de 50 mortos, entre mulheres e crianças. Número de mortos sobe para 250

10/1/2008: Ex-secretário-geral da ONU Kofi Annan aceita mediar negociações entre governo e oposição para acabar com crise política no país

27/1/2008: Violência étnica deixa mais de 60 mortos em Nakuru, centro do país

29/1/2008: Assassinato de senador da oposição desencadeia nova onda de violência. Mortos já passam de 800. Onda de ataques desde o início da crise fez com que cerca de 300 mil quenianos deixassem o país

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