Título: Outro recorde do Fisco
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/02/2008, Notas e Informações, p. A3

Os resultados do trabalho de fiscalização da Receita Federal no ano passado impressionam. Por práticas de ¿evasão fiscal¿ - como sonegação de impostos, apuração indevida de impostos e contribuições a serem recolhidas, erros e omissões nas declarações do Imposto de Renda, entre outras -, a Receita autuou no ano passado 522 mil contribuintes, entre pessoas jurídicas e físicas, 42% mais do que o número de autuações emitidas em 2006. Mais notável ainda é o aumento do valor das autuações. Elas totalizaram R$ 108 bilhões, 80% mais do que o total do ano anterior.

O combate rigoroso à sonegação de qualquer tipo é dever da Receita e uma demonstração de respeito aos contribuintes que cumprem rigorosamente suas obrigações com o Fisco. O uso de mecanismos mais eficazes nesse trabalho reduz substancialmente a margem para a sonegação e outros atos considerados ilícitos pela Receita e pela Justiça, e resulta em aumentos de arrecadação que, pelo menos em tese, poderiam abrir o caminho para a redução do peso dos impostos, taxas e contribuições sobre as finanças dos contribuintes honestos.

Mas o aumento brutal dos resultados do trabalho de fiscalização, de um ano para outro, permite que se desconfie de que não se trata de mais eficiência. O valor das autuações efetuadas no ano passado corresponde a praticamente três vezes o total arrecadado com a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), tributo que o Senado extinguiu em dezembro. Se os contribuintes tivessem recolhido tudo o que o Fisco quer cobrar por meio de suas autuações, a arrecadação federal, que no ano passado alcançou o recorde de R$ 602,8 bilhões, cresceria para R$ 710,8 bilhões, ou seja, seria 18% maior. A carga tributária, que já alcançou um nível insuportável, seria 4,5% maior.

Não é líquido e certo que os contribuintes devem o valor lançado nas autuações efetuadas pela Receita. Os autuados podem recorrer, no âmbito administrativo e, se derrotados, no âmbito judicial. E a grande maioria dos autuados faz isso. O secretário da Receita Federal, Jorge Rachid, admite que só 30% deles pagam sem questionar a autuação.

Não se pode, por isso, falar em ¿evasão fiscal¿, enquanto não forem julgados os recursos administrativos e judiciais apresentados pelos autuados. No entanto, da maneira como os dados foram apresentados na imprensa - inclusive com a informação de que os bancos e demais instituições financeiras são os maiores devedores do Fisco, responsáveis por R$ 25,3 bilhões do valor total das autuações -, os autuados passaram a ser vistos como fraudadores do Fisco, antes de serem julgados os seus casos.

Com razão, por isso, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) emitiu nota na qual observa que ¿a afirmação genérica de evasão fiscal induz a erros na avaliação da conduta do setor financeiro, que se pauta pelo estrito cumprimento de suas obrigações tributárias, sem prejuízo de exercer o direito constitucional de recorrer ao Judiciário sempre que julgar indevida a cobrança¿.

A suspeita a que nos referimos no início deste editorial, justificada pelo açodamento da Receita em apresentar um ¿resultado¿ da sua luta contra a sonegação, que certamente será menor após o julgamento dos recursos, é a de que a que se visou foi ¿influenciar¿ os tribunais que irão julgar as ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) apresentadas contra a Instrução Normativa nº 802. Com o fim da CPMF, a Receita Federal editou essa Instrução Normativa, que obriga os bancos a prestarem, semestralmente, informações sobre movimentações financeiras superiores a R$ 5 mil pelas pessoas físicas e a R$ 10 mil pelas pessoas jurídicas, identificando os titulares das contas e os valores movimentados. A Instrução foi contestada no Supremo Tribunal Federal (STF) em duas ações diretas de inconstitucionalidade, impetradas pela OAB e pela Confederação Nacional das Profissões Liberais. Na semana passada, a OAB do Ceará obteve liminar impedindo a Receita de ter acesso à movimentação financeira dos advogados do Estado.

Antes de o STF se manifestar sobre essas Adins, a Receita publicou, na terça-feira passada, a Instrução Normativa nº 811, criando um documento, a Declaração de Informações sobre Movimentação Financeira, que os bancos precisam lhe entregar a partir deste ano.

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