Título: Simplificar a burocracia no comércio
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 06/02/2008, Economia, p. B2
Em dezembro passado, o Conselho de Ministros da Câmara de Comércio Exterior baixou a Resolução nº 70, reafirmando a competência, de fato e de direito, da Câmara de Comércio Exterior (Camex) sobre matérias relevantes relacionadas ao comércio exterior, ainda que consistam em atos de outros órgãos federais, em especial propostas de projetos de lei de iniciativa do Poder Executivo, de decreto ou de portaria ministerial.
Dessa forma, cabe à Camex coordenar e orientar as ações dos órgãos que possuem competências na área de comércio exterior e, assim, definir as diretrizes no âmbito das atividades de exportação e importação e dar orientação sobre normas e procedimentos, observada a reserva legal de cada órgão. Ao proceder e agir dessa forma, o governo pode e deve estabelecer medidas para racionalizar e simplificar a burocracia envolvida nas atividades de comércio exterior.
A burocracia, na sua gênese, visa a dotar o Estado - e este, por sua vez, a administração pública - de racionalidade. Nesse viés, há que se seguir alguns princípios, quais sejam, o da legalidade, o da impessoalidade, o da publicidade, o da hierarquia, o da especialização de funções e o do controle dos atos estatais, visto que não mais toleraria a sociedade, no início do século 21, a não-transparência da coisa pública.
Nos dias de hoje, ao se falar de uma máquina administrativa emperrada, a primeira crítica é que isto se deve à burocracia. Muitas outras críticas são feitas, cabendo destacar, dentre elas, a quantidade de procedimentos e de controles estatais e o desrespeito aos agentes econômicos.
Pode-se constatar na quantidade de normas específicas e/ou relacionadas ao comércio exterior, baixadas pelos Poderes Executivo e Legislativo no período 2000 a 2007: 13 leis complementares; 148 leis; 62 medidas provisórias; 52 decretos legislativos; 636 decretos; e 3.824 normas administrativas.
Em 2000, foram baixados 277 atos legais, tendo atingido a cifra recorde de 968 atos, em 2007, assim distribuídos: 2 leis complementares; 14 leis; 13 medidas provisórias; 18 decretos legislativos; 106 decretos e 815 atos administrativos.
Destaquem-se, entre as normas administrativas, portarias, instruções normativas, circulares, cartas-circulares, comunicados, convênios, decisões, ordens de serviços, protocolos, resoluções, atos interpretativos, etc., de responsabilidade dos Ministérios e de órgãos da administração pública. Em 2000, foram em número de 190; de 184, em 2003; e atingiram o ápice em 2007, com 815 normas.
Do ponto de vista quantitativo, portanto, não há como negar o crescimento dos procedimentos e controles impostos por nossas autoridades ao setor exportador e importador.
Os números mostram que os órgãos públicos, ao impor seus controles, não levam em consideração o impacto da plêiade normativa sobre as atividades econômicas, dificultando a cadência requerida pelas operações de comércio exterior.
A necessidade de os agentes econômicos acompanharem e se adequarem a essas determinações legais implica elevação dos custos de conformidade com atividades produtivas, levando a que o setor privado, em uníssono, reclame da burocracia na exportação e na importação.
Como o cerne da questão está no âmbito da indiscriminada edição de normas pelos distintos órgãos de governo, em boa hora a Camex buscará avaliar a pertinência e a conveniência das proposições, bem como uniformizar e padronizar as rotinas, os sistemas informatizados e outros procedimentos no comércio exterior. Com esta decisão do Conselho de Ministros, estaremos entrando numa efetiva época de política de desburocratização e facilitação do comércio exterior.
Resta, no entanto, dúvida sobre a eficácia da Resolução nº 70. Por exemplo, no caso da recente instituição de alíquota específica do Imposto de Importação para uma lista considerável de produtos, por meio da Medida Provisória nº 413, de 2008, aparentemente, a matéria não foi submetida à prévia aprovação da Camex, a quem, por força legal, cabe fixar as alíquotas deste imposto.
Dever-se-ão coibir práticas da espécie, para preservar a efetividade das decisões do Conselho de Ministros da Camex e, assim, manter os elevados propósitos da Resolução nº 70, de simplificar e racionalizar a burocracia no comércio exterior brasileiro.
*Benedicto Fonseca Moreira é presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB)