Título: O novo e polêmico IVA federal
Autor: Oliveira, Ribamar
Fonte: O Estado de São Paulo, 03/03/2008, Economia, p. B2

O novo Imposto sobre Valor Adicionado federal (IVA-F), a ser criado pela reforma tributária, poderá incidir sobre a movimentação financeira? Ou seja, sobre os cheques, da mesma forma que a extinta CPMF? Poderá. Tudo vai depender da lei que o regulamentará, depois que a emenda constitucional da reforma tributária for promulgada pelo Congresso Nacional.

Não é correto dizer que é a base do IVA-F é a mesma da Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social) e do PIS (Contribuição para o Programa de Integração Social). A base dessas duas contribuições, que serão substituídas pelo novo tributo, é a receita bruta. A base do IVA-F, de acordo com a proposta de emenda constitucional, são as 'operações com bens e prestações de serviços, ainda que as operações e prestações se iniciem no exterior', o que poderá ser diferente da base da Cofins e do PIS, dependendo da regulamentação.

O conceito de 'operações' como base de incidência de imposto não está definido no Código Tributário Nacional, garantiu Everardo Maciel, em conversa com este colunista. Everardo comandou durante oito anos a Secretaria da Receita Federal. Em outras palavras, ainda não se sabe o que vem a ser uma operação com bens e serviços. 'O novo tributo vai incidir na saída da mercadoria, nas alienações, nas transferências, sobre o que exatamente?', questionou o ex-secretário da Receita.

Como o conceito de 'operações' não está definido, ele terá que ser esclarecido pela legislação infraconstitucional, caso a emenda constitucional da reforma seja aprovada. Mas, mesmo neste caso, advertiu Everardo, a definição estará sujeita a questionamentos infindáveis na Justiça. 'Daqui a 30 anos vamos saber qual é a definição mais adequada, quando o Supremo Tribunal Federal julgar a questão', afirmou.

O mesmo receio foi manifestado pelo secretário da Fazenda de São Paulo, Mauro Ricardo Costa. Em entrevista publicada na edição de hoje do Estado, Mauro Ricardo explica que, ao longo do tempo, o governo federal vem se apropriando de uma base de tributação que antes era apenas do município ou do Estado, por conta da criação das contribuições sociais. Antigamente, lembrou o secretário, a União não tributava serviços. Também não tributava circulação de mercadorias.

O secretário disse que, aos poucos, com a criação das contribuições, a União foi entrando nessa base de tributação, concorrendo com os Estados e com os municípios. Com o IVA-F a situação parece solidificar-se. 'Isso é uma preocupação muito grande', afirmou. Ele acha que o risco do assunto ir parar nos tribunais é grande. 'Na realidade, nós vamos ter a mesma base tributária com incidência de dois tributos. A base do ISS terá também a incidência do IVA federal e a base do ICMS a incidência do IVA federal.'

Em conversa com este colunista, o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, disse que o conceito do novo IVA federal 'é amplo mesmo' e que a idéia do governo foi mesmo ter 'uma base ampla'. Segundo ele, a definição sobre o que são as 'operações de bens e serviços' será feita na legislação infraconstitucional. Appy disse que o governo federal está aberto a discutir essa questão e mostrar o que pretende com o novo IVA.

Essas indefinições, que causam grande inquietação nos contribuintes e nos secretários estaduais de Fazenda e nos secretários municipais de Finanças, parecem indicar que a proposta de reforma tributária não avançará no Congresso se o governo não discutir, ao mesmo tempo, a lei que regulamentará o novo IVA federal.

Falta a parte da União

As perdas que os Estados terão com as mudanças do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) serão compensadas pelo Fundo de Equalização de Receitas (FER), segundo a proposta de emenda constitucional da reforma tributária. Este Fundo será constituído, no entanto, apenas por recursos que já são destinados pela União aos Estados e municípios.

Segundo a proposta, os recursos do Fundo IPI exportação (de acordo com a Constituição, 10% do total arrecadado pela União com o Imposto sobre Produtos Industrializados devem ser entregues aos Estados, proporcionalmente ao valor das respectivas exportações de produtos industrializados) e os recursos para o ressarcimento dos Estados por conta da chamada lei Kandir integrarão o FER.

Traduzindo: a proposta de reforma diz que os Estados usarão os recursos que já são deles para compensar as perdas que terão com as mudanças no ICMS. Não parece razoável. A emenda diz ainda que uma lei complementar definirá fonte e montante adicional de recursos a serem destinados ao Fundo de Equalização de Receitas. O texto da proposta sequer diz que a nova fonte será de tributo federal. Certamente os governadores e prefeitos não aceitarão essa proposta, pois a única variável conhecida, como bem lembrou o secretário Mauro Ricardo, é a perda dos Estados e municípios.

Como se pode observar, a dificuldade para a reforma continua sendo a mesma: como compensar as perdas com as mudanças. Quando ainda tinha os recursos da CPMF, o governo perdeu a oportunidade de resolver essa questão.

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