Título: Evitando constrangimentos
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/02/2008, Notas e Informações, p. A3
Veio a calhar para o governo Lula a iniciativa da Associação Brasileira de Concessionárias de Serviço Telefônico Fixo Comutado (Abrafix) de apresentar à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) um pedido de mudanças nas regras de operação do setor. O pedido deu início ao processo de discussão das mudanças na legislação das telecomunicações, necessárias para que se conclua a compra da Brasil Telecom (BrT) pela Oi, negócio pelo qual o governo Lula vem demonstrando interesse especial.
As mudanças precisam obedecer a um rito. O primeiro passo é apresentar à Anatel um pedido de mudança na legislação, ou seja, é preciso provocar o órgão regulador das telecomunicações. Depois, a Anatel consulta o Ministério das Comunicações para saber se há interesse em mudar as regras. Se o Ministério concordar, inicia-se a análise técnica do pedido. Depois, ele é submetido à análise jurídica para, em seguida, ser aberto à consulta pública. Por fim, será encaminhado ao presidente da República, que decidirá se fará ou não as mudanças.
Até agora, o usuário dos serviços não foi consultado. Apenas se manifestaram sobre o assunto empresas de telefonia fixa, controladores de operadoras de telefonia celular, sócios de empresas de televisão por assinatura e, claro, o governo - que, evidentemente, deseja as mudanças. Por isso, as coisas caminham com rapidez.
A Anatel encaminhou o pedido ao Ministério, que rapidamente enviou ofício ao órgão regulador pedindo-lhe que elabore uma proposta de mudança do Plano Geral de Outorgas, que atenda ao pedido da Abrafix e permita a compra da BrT pela Oi. Os argumentos apresentados pela Abrafix à Anatel - as mudanças tecnológicas ocorridas nos últimos dez anos e a transformação do mercado brasileiro de telecomunicações - dão fundamentação técnica a uma iniciativa que tem nítida motivação política. Com seu pedido, a entidade representativa das operadoras de telefonia fixa evitou que o governo Lula passasse pelo constrangimento de propor mudanças legais para facilitar um negócio privado envolvendo uma empresa, a Oi, que fez polpudo investimento na empresa Gamecorp, da qual é acionista Fábio Luiz da Silva, filho do presidente da República.
O presidente estaria preocupado com a repercussão que teria um decreto presidencial baixado só para tornar legal uma operação na qual o principal envolvido é patrocinador de seu filho. Como mostramos em editorial publicado domingo, reportagem recente da revista Piauí, sobre as atividades de José Dirceu como consultor internacional, fazia referência a uma queixa do ex-ministro da Casa Civil, ao presidente da República, sobre as atividades empresariais do seu filho. Em artigo na Folha de S.Paulo do dia 13, Dirceu negou que tenha dado essa informação à revista, mas foi desmentido no dia seguinte, no mesmo jornal, pela autora da reportagem.
O governo tem dito que seu interesse nesse negócio se deve à necessidade de constituição de uma empresa nacional com porte para enfrentar a concorrência de gigantes estrangeiras, como a espanhola Telefónica e a mexicana Telmex (controladora da Embratel e da Claro e sócia das Organizações Globo na operadora de TV a cabo Net). É curioso que empresas que sofreriam a maior concorrência, como é o caso da Telefônica, também estejam interessadas em apressar o negócio. Essas empresas são filiadas à Abrafix, que provocou o início do debate legal das mudanças nas regras do setor de telecomunicações.
O fato é que todas esperam ganhar com as mudanças. Obviamente, as primeiras interessadas são a Oi e a BrT. A Telefônica, que tem 50% do capital da Vivo, é sócia no exterior da controladora da TIM e gostaria de unificar as operações das duas empresas no Brasil, o que não é permitido pelas regras atuais. A Telmex, cujas empresas no Brasil não fazem parte da Abrafix, tem interesse na TV a cabo e gostaria de otimizar a utilização de sua infra-estrutura. Todas as operadoras querem ampliar suas áreas de atuação combinando transmissão de voz, dados e imagens.
Não está claro o interesse do governo nas mudanças, já que o aumento da concorrência - principal argumento oficial - não é certo. O que parece claro é que esse interesse é partilhado por José Dirceu.
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