Título: Brasil quer desculpas aceitáveis da Colômbia
Autor: Domingos, João
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/03/2008, Internacional, p. A13

Para Amorim, Bogotá deve dar garantia de que não voltará a invadir o Equador

O Brasil disse ontem que o governo da Colômbia deve fazer um pedido formal de desculpas ao Equador, garantindo que não voltará a invadir o território equatoriano, segundo o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim. ¿A violação do território de um outro país é muito grave e deve ser condenada. Isso traz intranqüilidade para os Estados vizinhos, principalmente para os menores e mais fracos¿, disse Amorim.

O ministro afirmou ainda que o Brasil defende a mediação do conflito pela Organização dos Estados Americanos (OEA) e não por nações de outros continentes, como as da União Européia (UE). ¿Não creio ser necessária a participação de países extra-regionais na questão¿, avaliou. O Brasil quer ainda que a OEA decida hoje criar uma comissão de investigação, destinada a verificar o que houve, de fato, durante os supostos confrontos entre as tropas do Exército da Colômbia e guerrilheiros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), quando foi morto Raúl Reyes, o número 2 do grupo.

¿A Colômbia admite a invasão do território do Equador, mas alega que foi atacada e reagiu, utilizando para isso o que hoje é conhecido por `perseguição quente¿; o Equador, por sua vez, rejeita a alegação de legítima defesa e afirma que a ação foi planejada, e a Colômbia já saberia que os alvos de seu ataque não estavam em seu território¿, resumiu o ministro. ¿Por isso, uma comissão de investigação da OEA é importante para dizer o que aconteceu.¿

Para o chanceler brasileiro, apesar de a Colômbia já ter apresentado um pedido de desculpa por ter entrado no país vizinho, é necessário outro para que a tensão com o Equador diminua. ¿Na minha opinião, um pedido de desculpas sem condicionantes vai ajudar muito o diálogo, porque a Colômbia já admitiu que efetivamente violou o território do Equador, e isso é muito grave, é gravíssimo¿, ressaltou o ministro.

Amorim disse que não participará da reunião extraordinária da OEA, hoje, em Washington. ¿Será uma reunião de embaixadores. O nosso embaixador, Osmar Vladimir Chohfi, estava de férias, mas já determinei que voltasse para Washington. Ele levará a posição brasileira para a solução do conflito¿, afirmou. O ministro disse ter informado ontem pela manhã o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre tudo o que vinha ocorrendo e sugeriu a participação da OEA para mediar o conflito. Depois de ouvir seu relato, Lula telefonou, primeiro, para o presidente do Equador, Rafael Correa, e comunicou que o Brasil desejava uma solução pacífica para o conflito, além de mencionar a necessidade de envolvimento da OEA nas negociações. Em seguida, Lula conversou com o presidente da Colômbia, Álvaro Uribe.

Segundo Amorim, até o fim da tarde de ontem a situação estava indo bem, mas por volta das 16 horas de Brasília o ministro foi informado de que o governo do Equador havia rompido as relações diplomáticas com o vizinho. ¿Isso é um problema a mais, não há dúvida. Há uma hora, o presidente Lula conversou com Rafael Correa e isso ainda não havia acontecido.¿

Apesar de admitir que a situação é ¿gravíssima¿, Amorim disse confiar que Colômbia e Equador não entrarão em guerra, ¿Acho que é possível uma solução negociada.¿ Ele entende também que não há necessidade de o Brasil reforçar suas tropas nas fronteiras com a Colômbia e Venezuela, apesar de o presidente venezuelano, Hugo Chávez, ter decidido mandar tropas a divisa colombiana.

Amorim não quis fazer comentários a respeito da intromissão de Chávez no conflito entre Colômbia e Equador, dizendo apenas que o Brasil, há meses e discretamente, tenta reduzir a tensão entre a Bogotá e Caracas. Hoje, segundo Amorim, a prioridade é ¿diminuir, mitigar e terminar o conflito entre Colômbia e Equador¿.

O ministro não quis fazer comentários sobre notícias divulgadas ontem, segundo as quais, nos documentos encontrados com os guerrilheiros mortos, há informações sobre um repasse de US$ 300 milhões da Venezuela para as Farc; nem se os problemas que surgiram nos últimos dias atrapalharão as negociações para que reféns em poder do grupo guerrilheiro sejam soltos.

REAÇÕES

Brasil: País pediu que Colômbia faça um pedido formal de desculpas ao Equador e se comprometa a não voltar a invadir o território, afirmou o chanceler Celso Amorim. Brasil também defendeu que disputa seja mediada pela Organização dos Estados Americanos. A disputa ¿ameaça a paz na região¿, afirmou o ministro

Chile: presidente Michelle Bachelet disse que a Colômbia deve uma explicação ao Equador e a toda a região. Afirmou estar à disposição para ajudar a mediar conflito

Argentina: para chanceler Jorge Taiana, ataque de Colômbia ao Equador regionalizou o conflito. Com Brasil, Chile e México, país se ofereceu para mediar questão

México: presidente Felipe Calderón disse que apoiará ¿qualquer ação que favoreça o diálogo¿

EUA: O porta-voz do Departamento de Estado, Tom Casey, afirmou que os EUA ¿apóiam o direito da Colômbia¿ de responder para defender-se das Farc e pediu um diálogo diplomático entre Bogotá e Quito. O porta-voz do Conselho Nacional de Segurança dos EUA, Gordon Johndroe, qualificou de ¿estranha¿ a reação da Venezuela ¿aos esforços da Colômbia contra as Farc¿. As Farc ¿são uma organização terrorista que continua mantendo reféns colombianos, americanos e de outros países¿

Cuba: ¿Escutam-se com força no sul de nosso continente as trombetas da guerra, como conseqüência dos planos genocidas do império ianque¿, disse o ex-presidente cubano Fidel Castro em artigo publicado ontem no diário Granma. Fidel, amigo de Hugo Chávez e de Rafael Correa, acrescentou: ¿Nada de novo. Estava previsto.¿ Ele lamentou o fato de Correa ter cancelado sua viagem a Cuba, onde participaria de um seminário sobre globalização

França: O chanceler Bernard Kouchner lamentou a morte de Raúl Reyes, afirmando que número 2 das Farc era o contato da França nas negociações para tentar obter a libertação da ex-candidata presidencial colombiana Ingrid Betancourt. ¿É uma má notícia que o homem com quem conversávamos, e tínhamos contato, tenha sido morto¿

Itália: O chanceler Massimo D¿Alema manifestou sua ¿perplexidade e preocupação¿ pela incursão armada colombiana contra as Farc no território equatoriano

Peru: Presidente Alan García afirmou que, apesar de a luta colombiana contra ações terroristas exigir decisões difíceis, a incursão colombiana ao Equador ¿violou as normas internacionais¿. Para García, Bogotá deve desculpas ao país vizinho

Uruguai: Governo afirma ter pedido à Argentina uma reunião extraordinária de chanceleres do Mercosul para discutir a disputa