Título: A convenção que não convence
Autor: Szajman, Abram
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/03/2008, Economia, p. B2

A o contrário de outras convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que obtiveram adesão maciça, a de nº 158, que proíbe a demissão imotivada de empregados, foi ratificada, ao longo de mais de duas décadas, por apenas 34 dos 180 países que integram a OIT.

Além do número reduzido, chama a atenção na lista o fato de ela ser constituída ou por países pouco desenvolvidos, africanos em sua maioria, como Lesoto, Namíbia e Uganda, ou por nações européias industrializadas, como a Finlândia, a Suécia e a França.

Restringir as possibilidades de dispensa às dificuldades econômicas ou às mudanças tecnológicas de uma empresa, além da motivação óbvia de eventual ineficiência do empregado, obrigando o empregador a submeter essas causas ao sindicato dos trabalhadores e ao Poder Judiciário, em um processo burocrático que demora de 6 a 12 meses nos lugares onde a Convenção 158 vigora, não é exatamente a estratégia mais indicada para um país que pretenda - e precise - atrair investimentos produtivos, crescer e gerar empregos.

Por essa razão, é significativo que os países responsáveis por 88,6% do PIB mundial tenham ficado de fora, entre eles os que possuem as mais baixas taxas de desemprego, como Estados Unidos (4,6%) e Cingapura (2,6%). O mesmo ocorre com os demais componentes da sigla Bric, à exceção do Brasil - Rússia, Índia e China -, e inúmeros outros países emergentes que disputam um lugar ao sol na economia globalizada.

Salta aos olhos, até de quem não é especialista no assunto, que competitividade e geração de empregos formais são fatores que não combinam com mercado de trabalho engessado. A garantia quase que absoluta no emprego, como almeja a Convenção 158 por meio de todos os entraves que estabelece para a empresa demitir, pode ser boa para quem já está empregado com carteira assinada. Mas é péssima para quem sofre as penúrias da informalidade ou para os jovens que buscam o tão sonhado primeiro emprego, na tentativa de escapar das teias da criminalidade que as tropas de elite não conseguem mais conter.

Aos argumentos de ordem econômica e social que desaconselham a ratificação da Convenção 158, conforme proposto pelo Poder Executivo em mensagem enviada ao Legislativo, somam-se os de caráter jurídico, já que não é a primeira vez, infelizmente, que os nossos governantes são acometidos por esse desatino.

Quando ela vigorou por breve período em 1996, por iniciativa do então presidente Fernando Henrique Cardoso - que a promulgou por um decreto no mês de abril e a revogou com outro, em dezembro -, o Supremo Tribunal Federal pronunciou-se contrariamente aos seus desígnios, sob o argumento de que um tratado não pode se sobrepor a uma lei complementar.

Isso porque o artigo 7º da Constituição Federal já assegura como direito dos trabalhadores urbanos e rurais a ¿relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória¿. Essa indenização foi estabelecida pela Lei 8.036, de 11/05/90, que em seu artigo 18 determina: ¿Na despedida sem justa causa pelo empregador, este deverá depositar na conta vinculada do trabalhador no FGTS importância igual a 40% do montante de todos os depósitos realizados na conta vinculada durante a vigência do contrato de trabalho, atualizados monetariamente e acrescidos dos respectivos juros.¿

A multa de 40%, somada ao seguro-desemprego, tem protegido o trabalhador enquanto este busca novo emprego. Não é razoável abandonar uma sistemática que funciona bem para impor uma interferência brutal (mais uma!) na administração das empresas. A mudança, além de todos os inconvenientes já citados, teria reflexos altamente negativos nas relações laborais, estimulando reclamações trabalhistas e sobrecarregando, ainda mais, a nossa já morosa e saturada Justiça do Trabalho.

Não creio sequer que os sindicalistas, que seriam contemplados com o aumento do poder de seus respectivos sindicatos, precisem de uma muleta como esta. Mais do que qualquer lei ou convenção, é a livre negociação entre patrões e empregados, respeitando as condições de cada empresa ou segmento econômico, que pode efetivamente proporcionar aos trabalhadores garantias compatíveis com a necessidade de sobrevivência das empresas.

*Abram Szajman é presidente da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio-SP) e dos Conselhos Regionais do Sesc e do Senac