Título: BCs alertam que crise está perto dos emergentes
Autor: Chade, Jamil
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/03/2008, Economia, p. B1

Bancos centrais mundiais dizem que imunidade à provável recessão nos EUA pode estar no fim

Jamil Chade

A crise no mercado de crédito dá sinais de que não vai poupar economias emergentes que até agora ficaram isentas de queda de atividades. Ontem, o Banco de Compensações Internacionais (BIS, o banco central dos bancos centrais) abriu a reunião dos maiores BCs do mundo com sério alerta: a crise nos Estados Unidos está se aprofundando e o debate agora é como colocar em prática medidas para evitar a contaminação generalizada de uma recessão. Análises da entidade apontam que, ao lado da China, o Brasil, por enquanto, tem conseguido evitar ser afetado de forma profunda pela crise. Não se sabe por quanto tempo.

Participam do encontro na Basiléia (Suíça) os principais presidentes dos BCs do mundo, entre eles o brasileiro Henrique Meirelles. Nos corredores dos luxuosos hotéis suíços, poucos se atrevem a comentar a situação. Nos bastidores, o clima é de preocupação. Hoje, a grande expectativa é em relação ao discurso que farão no BIS os representantes do Federal Reserve Bank (o banco central americano) sobre a situação nos EUA.

Participantes disseram que os dados de desemprego nos EUA assustaram e que o debate agora é o que deve ser feito para conter uma contaminação generalizada. Outra questão é saber como os americanos utilizarão os recursos distribuídos pelo Fed para garantir a liquidez. Para o dirigente de um BC latino-americano, a situação nos EUA se agravou de maneira preocupante e as previsões são piores que as feitas na última reunião do BIS, em janeiro.

Segundo avaliação do BIS, o mercado de crédito se deteriorou entre janeiro e fevereiro diante da expectativa de recessão nos EUA. O anúncio da alta do desemprego aprofundou ainda mais o temor, além de colocar dúvidas sobre a capacidade de o setor financeiro dar resposta ao ambiente de incerteza.

Para as autoridades monetárias, está cada vez mais difícil corrigir a falta de regulamentação no setor bancário que originou a crise no mercado de créditos. Meirelles, que participará do debate de hoje, conhece bem a situação, pois foi um dos primeiros nos anos 90 a usar mecanismo parecido aos subprimes quando era presidente do Bank Boston nos EUA. Na época, nem a complexidade das operações nem os riscos eram da mesma magnitude. 'Estamos todos sendo desafiados. Estamos em águas desconhecidas e o cenário internacional dos bancos está sendo colocado a teste e contestado', disse Martin Redrado, presidente do BC argentino.

Para o BIS, um fator que chama atenção é a contaminação cada vez mais clara da situação americana nos mercados emergentes, desmistificando a idéia de que, dessa vez, economias em desenvolvimento estariam isentas da crise. 'A desaceleração generalizada claramente começou a pesar em muitos mercados financeiros emergentes', informa a análise do BIS. Segundo o banco, isso pode sugerir que a tolerância para o risco estaria sendo afetada. 'Investidores aparentemente desafiaram a noção prévia de distanciamento entre a Ásia e os mercados emergentes e europeus dos problemas enfrentados nos EUA', alerta o documento.

Com relação ao Brasil, o BIS admite que ainda há sinais de que o País conseguiu se desprender das demais economias emergentes na turbulência nos mercados financeiros internacionais. A questão é saber até quando isso será possível. O motivo da diferenciação é a situação das contas externas.

Mas outros não estão em situação confortável. O BIS lembra que as exportações mexicanas sofrem com a desaceleração nos EUA e que certas economias latino-americanas (de menor peso) são prejudicadas pela queda de remessas de seus emigrantes que vivem e trabalham nos EUA. Na Ásia, os problemas são o preço das commodities e o ritmo de crescimento global. No Leste Europeu, o desafio é continuar crescendo enquanto os motores da economia da UE - França e Alemanha - dão sinais de exaustão.

MÃOS ATADAS

Uma das soluções indicadas é a revisão para baixo das taxas de juros, como forma de aquecer a economia, mas a opção é descartada por muitos países. Segundo William White, economista-chefe do BIS, há risco real de que a inflação reapareça como problema global. 'Estamos vendo isso já na alta dos preços de alimentos e energia', disse. 'A pressão (inflacionária) não irá acabar tão logo', alertou Guillermo Ortiz, do BC do México.

Para autoridades monetárias, não há dúvidas de que o dilema entre combater a inflação e evitar a recessão está mais pronunciado. Para governos como o da Europa, a sensação é de estar com mãos atadas. 'Estamos vendo um cenário de redução do ritmo de crescimento e de alta da inflação, aliado a uma crise nos créditos, dólar fraco e petróleo em alta', disse uma autoridade monetária.

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