Título: O quinto em discussão
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Fonte: O Estado de São Paulo, 25/02/2008, Notas e Informações, p. A3

Com a decisão da Ordem dos Advogados do Brasil de reapresentar ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) os nomes dos seis candidatos a uma vaga que dias antes haviam sido rejeitados pela corte, permanece o impasse entre as duas instituições. Numa tentativa de acordo, o presidente do STJ, Raphael de Barros Monteiro, comprometeu-se a submeter a lista sêxtupla da OAB a uma nova votação. Contudo, dos 28 ministros da corte, 19 já teriam declarado que repetirão o voto.

A OAB, por sua vez, já anunciou que levará o caso ao Supremo Tribunal Federal, caso o STJ mantenha seu voto. Antigos presidentes da OAB acusam o STJ de promover ¿uma escalada de violência¿ contra a advocacia. Em resposta, dirigentes da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e da Associação de Juízes Federais (Ajufe) alegam que a OAB vem privilegiando apadrinhamento político, em detrimento do preparo técnico dos indicados nas listas sêxtuplas.

Independentemente de seu desfecho, o impasse entre a OAB e o STJ trouxe de volta a velha discussão entre advogados e juízes sobre a legitimidade do chamado ¿quinto constitucional¿. Atualmente, 20% dos cargos de desembargador e ministro dos tribunais estaduais e federais são preenchidos por magistrados não concursados. Pelo artigo 94 da Carta de 88, ¿um quinto dos tribunais superiores será composto de membros do Ministério Público (...) e de advogados de notório saber jurídico e de reputação ilibada (...), indicados (...) pelos órgãos de representação das respectivas classes¿. Esse dispositivo vem se repetindo nas Constituições desde 1934.

Os advogados afirmam que o ¿quinto¿ é uma forma de ¿arejar¿ e ¿democratizar¿ a magistratura, proporcionando aos tribunais superiores a pluralidade de experiências vividas por profissionais não oriundos da magistratura. Já os adversários do ¿quinto¿ afirmam que esse foi um expediente usado por Getúlio Vargas para tentar limitar a independência do Judiciário, colocando juízes da sua confiança nos escalões superiores da instituição.

Considerando-se que o ¿quinto¿ foi instituído pela Constituição de 34, antes, portanto, da instalação do Estado Novo, não parece verossímil a tese dos adversários do sistema da lista sêxtupla. Mas o que está em discussão não é a origem do ¿quinto¿, mas sim a sua ¿qualidade¿.

Selecionados por concurso público, os juízes de carreira sempre refutaram os argumentos dos advogados. Eles alegam que, pelos critérios do ¿quinto¿, a decisão final na escolha de um nome para um tribunal superior pertence ao Executivo, o que viola o princípio da tripartição dos Poderes.

As entidades de classe da magistratura, que há muito defendem a extinção do ¿quinto¿, aproveitaram o impasse entre o STJ e a OAB para propor ao Legislativo uma emenda revogando o artigo 94 da Constituição. ¿Quero que alguém me traga um exemplo de que o quinto cumpriu sua meta (de `arejar¿ a magistratura). Quero saber onde foi que ele deu mais impessoalidade ao Judiciário, onde proporcionou mais transparência do Poder, propiciou maior democratização na relação com juízes do primeiro grau, reformulou ou deu grande contribuição na renovação da jurisprudência, onde mais aproximou a Justiça da sociedade¿, diz o presidente da AMB, Mozart Valadares.

¿Não há transparência nem impessoalidade nas indicações feitas, diante da ausência de regras específicas para o processo de inscrição de candidatos ou da definição, em voto aberto e fundamentado, dos motivos que levam à seleção de um pretendente em detrimento de outros. A ascensão da magistratura de carreira ao STJ encontra-se em total desprestígio. Isso é reflexo do forte trânsito e capacidade de articulação política que caracterizam os integrantes do quinto¿, conclui o presidente da AMB, que congrega cerca de 15 mil juízes.

O argumento merece ser discutido com seriedade. Como em julho será aberta no STJ mais uma vaga na cota dos advogados, a polêmica em torno do ¿quinto¿ continuará acirrada. Resta esperar que nas discussões prevaleça o interesse público, e não os interesses meramente corporativos das partes em confronto.

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