Título: O desabafo de Gerdau
Autor: Oliveira, Ribamar
Fonte: O Estado de São Paulo, 25/02/2008, Economia, p. B2

Na semana passada, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, apresentou a um grupo de empresários as linhas gerais da proposta de reforma tributária do governo. Depois do encontro, o empresário Jorge Gerdau Johannpeter, presidente do grupo Gerdau e da Ação Empresarial, fez um desabafo. Ele disse que, pela primeira vez, a proposta do governo não foi preparada pela Receita Federal. Por isso, Gerdau deu os parabéns ao ministro.

O empresário se referia ao fato de que os argumentos do fisco sempre predominaram nas discussões anteriores sobre o tema dentro do governo, não apenas do atual, e refletiam as preocupações com o aspecto da arrecadação. Desta vez, segundo ele, é diferente. 'A proposta foi feita pelo Ministério da Fazenda e é da sociedade', disse.

Mantega ouviu as palavras do empresário e argumentou que a situação das contas públicas brasileiras, em forte desequilíbrio durante anos, foi o principal obstáculo à realização de uma reforma tributária. Não foi por outra razão, disse, que toda vez que se falou em reforma tributária no Brasil o resultado foi o aumento da carga dos impostos.

Para o ministro da Fazenda, a situação atual é propícia à realização de uma reforma tributária pois as contas públicas estão ajustadas e a economia está em crescimento. Não haveria, portanto, necessidade de elevar as alíquotas dos tributos ou ampliar as suas bases de cálculo. O diálogo entre Gerdau e Mantega ocorreu durante uma entrevista coletiva na sede da Confederação Nacional da Indústria (CNI), na última terça-feira.

É bom lembrar que o coordenador da proposta de reforma tributária é o secretário de Assuntos Econômicos do Ministério da Fazenda, Bernard Appy. Ele vem consultando os secretários estaduais de Fazenda sobre as linhas gerais da reforma. Mas ninguém conhece ainda os detalhes da proposta. E, como notou recentemente o governador de São Paulo, José Serra, em matéria tributária 'o essencial está nos detalhes'.

Embora a melhoria das contas públicas seja uma realidade, restam dúvidas sobre a disposição efetiva do governo em conter a sua ânsia por maior arrecadação, mesmo porque os gastos correntes não param de crescer, em velocidade muito superior à da economia. Não é segredo para ninguém que o governo Lula ainda não se conformou com a perda da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e que estimula, nos bastidores do Congresso Nacional, a retomada das discussões pela recriação do imposto sobre os cheques. Essa movimentação foi reforçada pela argumentação de alguns economistas de que a extinção da CPMF não teria sido repassada aos preços dos produtos, ou seja, aos consumidores.

O projeto estratégico do governo Lula parece contemplar maiores gastos com pessoal, previdência, assistência social, saúde e educação, o que só poderá ser feito com o aumento da carga tributária. Argumenta-se na área técnica oficial, no entanto, que a maior arrecadação não viria da elevação de alíquotas ou da ampliação das bases de cálculo dos tributos, mas apenas da atuação mais eficiente do fisco. Segundo esses técnicos, estaria ocorrendo uma diminuição gradativa da distância entre a carga tributária nominal (ou seja, aquela definida pela legislação) e a carga efetiva, pela redução da sonegação e da evasão fiscal. O governo conta também com os efeitos positivos da expansão econômica sobre a sua receita.

O tributo novo que está sendo previsto na proposta de reforma tributária - o Imposto sobre Valor Adicionado (IVA) federal - não deve elevar a carga tributária, pois apenas substituirá três contribuições existentes: a Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), o PIS (Contribuição para o Programa de Integração Social) e a Cide-combustíveis (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico que incide sobre os combustíveis).

A proposta de reforma do governo estabelece ainda um prazo de transição até 2016 para que todas as regras entrem em vigor. Portanto, as alterações não estão sendo feitas para este governo e nem sequer para o próximo - o que dá razão a Gerdau.

A essência da proposta de reforma tributária do governo é o fim de todas as contribuições sociais, com exceção daquela que incide sobre a folha de salários e é destinada a financiar a Previdência Social. Depois da descentralização tributária realizada pelos constituintes de 1988, o governo federal utilizou o instrumento das contribuições sociais para elevar sua receita, já que elas não são partilhadas.

O problema é que as contribuições são cumulativas e oneram a produção brasileira, que perde competitividade ante os concorrentes. A substituição das contribuições pelo novo IVA federal colocará um ponto final nesta questão da cumulatividade e nesse ciclo iniciado na década de 1990. Permitirá também que as receitas de todos os tributos federais sejam partilhadas com Estados e municípios, uma antiga reivindicação dos governadores e prefeitos.

As exportações e os investimentos também serão inteiramente desonerados. Isto significa que os créditos obtidos pelos empresários poderão ser utilizados imediatamente. Atualmente, os créditos da Cofins e do PIS só podem ser compensados em 24 meses e os do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), em 48 meses.

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